Móveis
Polo moveleiro no Amazonas enfrenta dificuldades para desenvolvimento
Logística, falta de fomentos e concorrência são desafios citados por produtores do ramo
Manaus - Apesar de ser uma importante atividade econômica no Brasil, com um movimento anual estimado em R$ 67,4
bilhões, a produção de móveis no Amazonas ainda enfrenta barreiras para se
desenvolver. Afastado das regiões de maior concentração populacional e maior
peso na economia brasileira, o estado enfrenta desvantagens em relação aos
representantes do Sudeste e Sul, principalmente no que diz respeito ao
transporte e logística. As informações são do relatório da Associação Brasileira das
Indústrias do Mobiliário (Abimóvel).
Um dos fatores
apontados por representantes do setor no Amazonas para a dificuldade de se criar um Polo Moveleiro no Amazonas está na concorrência com os polos do Rio Grande do Sul e Santa Catarina. O Estado importa a maior parte do mobiliário vendido no comércio, desses locais. O empresário Ivair Souto, da UG Estofados
da Amazônia, por exemplo, importa madeira de reflorestamento de Santa Catarina
e Paraná.
“Gostaria muito que fosse daqui, mas você não consegue madeira nem fornecedores de qualidade. O tipo de produto que fabricamos pede uma madeira que não seja muito dura, pois trabalhamos com grampeadores pneumáticos para dar velocidade no processo produtivo”, explica Ivair, completando que a logística falha também joga contra a produção de móveis no Estado. “As condições geográficas e econômicas dificultam a atuação do setor na Região Norte”, diz o empresário, que acaba comprando a madeira dos estados sulistas. A mercadoria chega em contêineres por via marítima.
A UG fornece
mobiliário para grandes lojas do segmento no Estado, como Bemol e TV Lar. Na
avaliação de Ivair, o mercado de móveis da região melhorou, mas ainda faltam
incentivos fiscais, matéria prima sustentável e mão de obra qualificada. Na
empresa de Ivair, estão empregados 250 funcionários.
Iniciativas
A falta de
investimentos do governo no polo moveleiro da região é outra inconveniência
observada por produtores do ramo. Em 2009, por exemplo, foi anunciado que o
município de Tabatinga (distante 1.106 quilômetros de Manaus) receberia
aplicações para o desenvolvimento do setor na cidade, em uma obra orçada em
mais de R$ 597 mil, numa estrutura de 46 mil m² que produziria móveis de
madeira manejada oriunda de Benjamin Constant e Atalaia do Norte. O projeto não
saiu do papel.
Em nota, a Secretaria de Produção Rural (Sepror) explicou que os planos para Tabatinga foram “promessas de governos passados que geraram expectativas e não foram cumpridas”.
Promove
Atualmente, o principal incentivo do governo à atividade moveleira
pertence à Agência de Desenvolvimento Sustentável (ADS). O Programa de
Regionalização do Mobiliário Escolar (Promove) fornece móveis para escolas
públicas por meio de parceria com 42 movelarias amazonenses. Das oficinas de 18
municípios do Estado, saem carteiras, quadros brancos, mesas, bancos, armários
e outras peças. Em 2019, o programa movimentou R$ 6 milhões.
O presidente da
ADS, Flávio Antony Filho, destaca que o programa tem gerado emprego e renda no
interior, além de impulsionar fortemente o setor madeireiro no Amazonas. “Quem
produz tem destino certo para os seus produtos por meio do Promove. São mais de
500 mil alunos da rede pública beneficiados com móveis de qualidade e
produzidos no próprio estado”, comentou.
Para participar
do Promove, o moveleiro deve ter regularidade fiscal, qualificação técnica,
comprovação de que a madeira utilizada na fabricação e produção dos mobiliários
é oriunda de atividade sustentável, legalmente licenciada e autorizada pelos
órgãos responsáveis.
No interior
Um dos
moveleiros cadastrados no Promove é Carlos Santana, 63 anos, de Itacoatiara
(distante 176 quilômetros de Manaus). O produtor está há 40 anos trabalhando
com mobiliário, e há 10 anos fornece para a ADS. Carlos reconhece a importância
do programa para quem sobrevive da movelaria, mas critica o processo de
credenciamento anual e a diminuição do programa nos últimos anos.
“Todo ano,
quando termina o ano letivo, sofremos a duras penas para fazer o
credenciamento, é uma tortura. Não priorizam o programa, acham que o interior
não precisa dessas coisas, sendo que alguns municípios vivem em função desse
projeto. Hoje são 18 municípios beneficiados. Antes, eram 28”, afirma.
“Ano passado,
por exemplo, fomos iniciar a produção no mês de junho. Aqueles que dependem
unicamente do programa ficam até 5 meses sem serviço. Ou seja, trabalhamos só
de 7 a 8 meses por ano”, diz Carlos, que estima que 60% dos móveis que produz
vai para a ADS. O produtor estima um faturamento de R$350 mil por ano.
Qualidade e questão ambiental

A qualidade da produção de
móveis em madeira do interior também é alvo de dúvidas, mas Carlos garante que
os produtos são de excelência sobre a qualidade. “Alegam que nosso móvel não
tem qualidade, mas temos tanta qualidade que foi conosco que o governo
conseguiu superar o déficit de produção de mobiliário para o Estado”,
declara.
Os móveis fornecidos pelo
Promove, por exemplo, utilizam madeira de lei e MDF. Para o moveleiro, falta o
governo construir a ponte e fomentar as relações comerciais entre os produtores
do interior com a capital.
“As secretarias precisam colocar esse produtor direto com os lojistas em Manaus. Os grandões querem engolir tudo. Se fomentarem o comércio e a produção industrial de mobiliário no interior, o estado vai se fortalecer na economia, trará renda para as pessoas e municípios”, avalia.

A burocracia para trabalhar com madeira nativa também é outra dificuldade enfrentada pelos pequenos produtores, já há pouca madeira certificada no mercado. “Hoje adotamos o MDF por conta das pressões ambientais, mas nós que produzimos, não depredamos, sabemos da importância de proteção ao meio ambiente, além disso, nosso potencial é pequeno. Quem depreda e acaba com a floresta são os grandes. O pequeno empresário apenas tira o necessário para a sobrevivência do negócio", esclarece.

No Amazonas, as madeireiras são fiscalizadas pelo Instituto de Proteção Ambiental do Estado (Ipaam) a partir de denúncias e informações do serviço de inteligência do órgão. Segundo o Ipaam, a fiscalização é intensificada no segundo semestre do ano, quando a exploração madeireira cresce.
O desafio no Amazonas é a consolidação de um polo apenas com madeiras certificadas, plantadas em um ambiente de produção sustentável, que não agrida ao meio ambiente amazônico. A consolidação de uma política para o setor de forma responsável é aguardada pelos empresários da área. "Não queremos destruir a floresta, queremos ter condições de trabalhar com madeira legalizada. Há muita área desmatada que pode ser aproveitada para isso, de forma sustentável. Há uma grande potencial na região, mas os entraves são enormes disse José Antônio Brasil, proprietário de uma pequena fábrica de móveis em Manaus.