Aniversário de São Jorge
Bairro São Jorge: moradores reclamam de tráfico e saneamento
A comemoração dessa segunda é marcada pela celebração religiosa que
Manaus – Quem mora no São Jorge lembra, com saudosismo, dos bons tempos do bairro. As brincadeiras até altas horas, os banhos longos e demorados no Igarapé da Cachoeira (trecho do Igarapé do Mindu) e as tardes refrescantes na famosa ‘Bacia de Prata’ ficaram apenas na lembrança. Nesta segunda-feira (23), dia em que se comemora 71 anos de existência do bairro, os moradores relatam um pouco da história da localidade, situada na zona Oeste de Manaus, e apontam problemas que impedem que o local seja um lugar melhor para se viver.

Criado na década de 40, a região passou por muitas transformações, a principal foi o desmatamento da imensa área verde para a construção de casas e abertura de ruas. A família da comerciante Socorro Batista, de 54 anos, mora no bairro há aproximadamente 60 anos Ela relembra a adolescência, momentos com amigos e parentes, pelas ruas do bairro, que ficaram gravados na memória.
“Era bom demais. Nós tínhamos muitas coisas que esses jovens de hoje em dia não têm. Existia proximidade entre as pessoas e nos sentíamos seguros”, conta.
O desenvolvimento chegou e com ele vieram as mazelas sociais. A assistente social Bruna Garcia, de 32 anos, que mora há 2 anos na localidade, reclama da quantidade de buracos nas vias que cortam o bairro. "É inadmissível que um bairro localizado em uma área pontual, rota para as principais vias da cidade, esteja nas condições que está. Há muitos buracos, quase não consigo trafegar em algumas ruas. É necessário 'rasgar' as ruas e fazer o recapeamento completo do local. Já cansei de consertar o carro por causa desse problema".
A reportagem entrou em contato com a Secretaria Municipal de Infraestrutura, mas o órgão deve passar informações sobre recapeamento das vias do bairro na manhã desta terça-feira (24). A solicitação foi feita após o horário de funcionamento da Seminf.
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Insegurança
Com o crescimento, o bairro sofreu quatro divisões, que se tornaram comunidades, são elas: Vitória Régia, Jardim dos Barés, parte baixa do São Jorge e Comunidade dos Buritis (localizada por trás do Porão do Alemão). Não diferente de outras regiões da capital amazonense, o São Jorge também está tomado pela criminalidade. Em determinadas áreas da comunidade, é possível observar a presença de pessoas suspeitas. A equipe de reportagem chegou a ser seguida por elas, enquanto buscava histórias com os moradores.
Uma moradora, que não quis ser identificada, apontou os rapazes como traficantes. A chegada de um prédio da 21ª Companhia Interativa Comunitária (Cicom) e do 21º Distrito Integrado de Polícia no bairro, segundo ela, diminuiu a insegurança dos moradores, porém não afugenta os criminosos que continuam atuando na área.
Poluição ambiental
O principal problema apontado por moradores do bairro é sobre a poluição no Igarapé da Cachoeira, que durante muito tempo foi point de diversão. A autônoma Fátima Marciléia Monteiro, de 59 anos, disse que, há cinco décadas, era comum ver mulheres lavando roupas na beira do rio, enquanto as crianças pulavam na água.

“Minha mãe e minha avó eram lavadeiras e ficavam ali na beira do igarapé, enquanto eu e meus amigos brincávamos no rio”, conta. Ela relata ainda que onde hoje existe poluição, árvores frutíferas serviam como alimento para as famílias que viviam no São Jorge naquela época.
No igarapé também era possível pescar várias espécies de peixes, como tucunarés e sardinhas. O pescado servia como fonte de renda e banquete das centenas de famílias que habitavam o local. O número elevado de palafitas ao redor do igarapé impede a vista das ruínas da Represa da Cachoeira Grande. Para visitar o local, é necessário passar por um labirinto de becos e ainda passar por baixo das inúmeras "pernas de madeira" das casas fixadas no local.
O progresso desenfreado e a insensibilidade das pessoas acabaram com a natureza e até com o imponente prédio em estilo medieval. Toda a estrutura está se deteriorando, um sinal de que a história de um dos principais pontos turísticos do bairro está sendo apagada. O igarapé virou um esgoto a céu aberto e toma conta do que restou da represa: as ruínas.

Apesar das ações ambientais realizadas pela Prefeitura, como limpeza do igarapé - feita por equipes da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (Semulsp) - e ações de arborização, realizadas pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas), o nível de poluição ainda é muito alto naquele trecho do rio, que fica próximo ao Igarapé da Cachoeira.
Fé e devoção
Não muito longe da casa de Socorro Batista está localizado o Ginásio Ninimberg Guerra. A comerciante narra que, há 40 anos, o ginásio funcionava apenas como quadra de esportes e ficava ao lado de uma pequena igreja, onde eram celebradas as missas paroquiais.
“Tínhamos grupos de jovens e a quadra era usada para encenar peças e fazer reuniões com música e dança”, lembra.

A igreja mudou de lugar, foi reconstruída na rua Emílio Ruas, em um terreno em frente ao ginásio. O local recebe todos os dias fiéis e devotos de São Jorge, vindos de toda a cidade. O fluxo de pessoas aumenta durante os festejos do aniversário do bairro, que também coincide com a data em que se celebra o dia de São Jorge.
Programação
Desde o último domingo (22), a igreja tem preparado uma programação especial para os que visitam a paróquia de São Jorge. O tema do festejo deste ano é “São Jorge: guerreiro da paz ajuda-nos a superar a violência”. Além da celebração de missas, que é normal aos domingos, a igreja teve o Festival do Peixe Frito, com a venda de pratos da culinária regional e brincadeiras para as crianças.

Nesta segunda, foi realizada ainda uma procissão, que saiu às 18h da paróquia e seguiu um percurso dentro do bairro. Uma missa paroquial reuniu os devotos que se emocionaram com os cânticos e o ato de fé. Eles agradeceram pelas graças alcançadas em 2018 e aproveitaram para pagar promessas. Em seguida, o tradicional arraial foi realizado na igreja. Aproximadamente cinco mil pessoas participaram das festividades.
De acordo com o pároco da igreja, frei Agostinho Odorizzi, é uma felicidade poder comemorar mais um ano de São Jorge junto aos fiéis. "O santo intercede por muita gente. Os moradores do bairro chegam em peso na igreja para sair na procissão e praticar esse ato de fé", disse o frei.

O frei ainda lembrou de uma criança que foi curada pelo santo na paróquia após ser desenganada pelos médicos.
"A família veio à igreja pedir ajuda ao santo. Os pais eram devotos de São Jorge, e, durante uma missa de domingo, convidamos a todos a ficarem de pé e pedir pela saúde da criança. Algumas horas depois, ele estava respondendo ao tratamento. Alguns dias depois, a criança já estava com a saúde recuperada. Foi um milagre!".
Para a devota de São Jorge, Débora Silva, a família inteira participa da procissão desde que ela era criança. "Meus pais sempre me trouxeram para a paróquia e nunca deixamos de participar dos eventos da igreja. Hoje não moro mais com meus pais, mas continuo vindo pra cá", explicou Débora.

Devotos
Para quem é fiel devoto de São Jorge, assim como a paroquiana Edmilza Souza, de 45 anos, a procissão é o ponto principal de toda a celebração religiosa. “Mesmo que estejamos cansados e com as pernas doendo, sentimos um amor tão grande por aquele que é nosso santo”, diz.
Um grupo de jovens músicos da igreja participa dos dois dias de celebrações e faz shows ao vivo na área externa da igreja.

O Ginásio Ninimberg também foi utilizado, durante os dias 20, 21 e 22, como local para comemorar o aniversário do bairro. A celebração contou com shows de cantores regionais, além de mutirões de limpeza, competições de esporte e atividades para as crianças.
Apesar dos problemas enfrentados no local, os moradores dizem não haver lugar melhor para se morar. “Eu não sairia daqui por nada, esse é meu pedacinho de terra, de onde tenho muito orgulho e onde fiz minha vida”, conta com emoção a autônoma Marciléia, uma eterna admiradora do bairro São Jorge.
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