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Segurança

‘Mexicanização’ do crime e avanço em fronteiras

Enquanto o poder público não agir de forma coordenada, o Brasil seguirá testemunhando a consolidação de um "Estado paralelo"

Foto: Reprodução

Um relatório recente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) expõe uma realidade alarmante: o crime organizado no Brasil não só se fortalece no Sudeste, como avança rumo a uma perigosa “mexicanização” e amplia sua influência em regiões de fronteira, inclusive no Amazonas e em áreas limítrofes com países vizinhos.

Os dados revelam uma transformação estrutural das facções, que diversificam atividades, infiltrando-se em setores formais da economia e desafiando a capacidade do Estado em conter sua expansão.

De acordo com o estudo, o crime organizado movimentou R$ 147 bilhões em 2022 com mercados ilegais de combustíveis, ouro, bebidas e cigarros — valor dez vezes superior aos R$ 15 bilhões obtidos com o tráfico de cocaína.

Golpes digitais e roubos de celulares somaram outros R$ 186 bilhões entre 2023 e 2024. O setor de combustíveis lidera (42% do total), seguido por bebidas (R$ 56,9 bi) e ouro (R$ 18,2 bi). “Há um ecossistema criminoso que vai além do narcotráfico tradicional, explorando brechas legais e lavando dinheiro em escala industrial”, alertou Renato Sérgio de Lima, presidente do FBSP.

O termo “mexicanização” refere-se ao cenário em que o crime se torna o maior empregador de uma região, como ocorre em partes do México. No Brasil, embora distante desse extremo, o risco é palpável. “Na Amazônia, isso já é uma realidade localizada”, explica Lima.

Facções como PCC e Comando Vermelho não apenas dominam territórios, mas também contaminam setores legais — do refino de combustíveis à pesca e ao mercado imobiliário —, usando-os para lavagem de recursos e influência política. A informalidade, somada à alta carga tributária, cria terreno fértil para lucros que rivalizam com os do tráfico de drogas.

Novos campos de batalha

O relatório da FBSP destaca a escalada do crime nas fronteiras do Norte, onde o Amazonas se tornou epicentro de atividades como garimpo ilegal, trânsito de drogas e contrabando.

A região sofre duplamente: além da devastação ambiental, comunidades locais são subjugadas por redes que operam em conexão com países vizinhos (Colômbia, Venezuela, Peru), dificultando o controle territorial. “Há uma internacionalização do crime, com rotas que exigem cooperação transfronteiriça”, ressaltou Renato Lima.

Além de alimentar a violência, a economia paralela representa uma sangria de recursos públicos. Estima-se que o país perca bilhões em evasão fiscal — dinheiro que poderia ser investido em saúde, educação e segurança.

O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) é apontado como peça-chave no rastreamento de capitais, mas sua atuação depende de integração entre União, estados e municípios, algo ainda frágil. “O crime é organizado, o Estado não”, critica o relatório.

Caminhos para enfrentamento

Especialistas defendem ações urgentes para combater o crime, como a integração de políticas públicas entre segurança, Justiça, Receita e meio ambiente, bem como a modernização legislativa com a finalidade de rastrear produtos (ouro, combustíveis, etc) via tecnologia, e, ainda, a cooperação internacional para ações de inteligência conjunta e operações nas fronteiras. Enfatizam também a redução da informalidade para impedir incentivos econômicos ao crime.

Enquanto o poder público não agir de forma coordenada, o Brasil seguirá testemunhando a consolidação de um “Estado paralelo”, onde o crime dita regras, corrói instituições e ameaça a democracia. De acordo com o FBSP, sem respostas à altura, a “mexicanização” deixará de ser um risco distante para se tornar uma tragédia anunciada.

Juscelino Taketomi
Juscelino Taketomi¹

¹Articulista do Portal Em Tempo, Juscelino Taketomi, é Jornalista. Há 28 anos é servidor da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam)

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