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X-Caboquinho

Como sobreviver à crise sem perder o humor (e a fome)

Manaus, Manaus, ex-Cidade Sorriso! Manaus, terra das lendas, dos botos cor-de-rosa e do sol que derrete até a sombra

Foto: Divulgação

Manaus, Manaus, ex-Cidade Sorriso! Manaus, terra das lendas, dos botos cor-de-rosa e do sol que derrete até a sombra. Mas eis que agora enfrentamos uma tragédia épica, digna de virar roteiro da Marvel: o popular X-Caboquinho, nosso sanduíche sagrado, tornado patrimônio cultural de natureza material e imaterial do Estado pela Assembleia Legislativa do Amazonas e pela Câmara Municipal de Manaus, está ameaçado.

Sim, a mesma iguaria que une pão francês, banana frita, queijo coalho e tucumã em uma explosão de carboidratos e identidade cultural. Enquanto o mundo se preocupa com o derretimento das calotas polares, nós, amazonenses, choramos o derretimento do nosso prato favorito. E tudo graças a uma vilã chamada “crise climática” ou, como preferem os céticos, “aquela seca que já dura três anos e ninguém fez nada”.

Vamos aos fatos, com a seriedade que o tema merece (ou não). O tucumã, fruto que antes era colhido no quintal do vizinho, agora custa R$ 200 o quilo. Por esse preço, dá pra comprar um iPhone usado – ou, se preferir, um pedaço da sua alma, já que sem tucumã não há X-Caboquinho, e sem X-Caboquinho, o que somos? Paulistas de calor?

O jaraqui, peixe que já foi símbolo de fartura, agora parece um snack de aquário: menor, mais raro e com um gosto que “lembra o Rio Negro em dia de vazante”, segundo um gourmet anônimo do Educandos. Já a castanha, outrora gigante, encolheu tanto que virou “castanheta” – perfeita para enfeitar miniaturas de tacacá.

“Apocalipse Amazônico”

Mas calma! Antes de declararmos o “Apocalipse Amazônico”, há soluções. A começar pela criatividade manauara, sempre pronta para transformar crise em meme. Que tal substituir o tucumã por… “palha de aço”? Afinal, “palha de aço” é fibrosa e dá um toque rústico ao prato. Ou então importar frutos exóticos, como “kiwi da Zona Leste” ou “abacate do Parque 10” – já que a globalização chegou até aqui, mesmo que a água potável não.

Para os puristas que rejeitam inovações gastronômicas, há alternativas: “X-Caboquinho NFT”. Uma foto do sanduíche, registrada em blockchain, para você postar no Instagram com a legenda “Saudades De 2020”. Ou então adotar um “tucumanzeiro virtual” no Metaverso – regado com bitcoins, claro.

Enquanto isso, o poder público, sempre antenado, promete um “plano emergencial”: transformar o X-Caboquinho em “patrimônio imaterial da UNESCO”. Porque nada resolve a falta de comida como um diploma emoldurado. E se a seca persistir, a partir de maio de 2025, talvez declarem o sanduíche “espécie em extinção”, com direito a casal reprodutor em cativeiro no Teatro Amazonas.

“Turismo da crise”

Já os economistas sugerem “turismo da crise”: “Venha a Manaus ver o último tucumã selvagem!”. Pacotes incluem selfie com um ouriço de castanha (tamanho PP) e almoço com jaraqui “light” – agora com 30% menos sabor e 200% mais caro.

No fim, resta a nós, cidadãos comuns, a resiliência. Se não podemos comer o X-Caboquinho, podemos ao menos “comer o pão com o que houver”. Que seja queijo coalho e lágrimas. Ou, seguindo o exemplo das comunidades tradicionais, voltar a caçar açaí no supermercado – desde que o cartão aguente.

No mais, entre soluções criativas e piadas ácidas, prosseguimos jornada. Porque, no Amazonas, até a fome tem um quê de ironia tropical. Como dizia um sábio anônimo do bar da Praça da Saudade: “Se o clima não nos quer, a gente pelo menos ri”.

P.S.: Se o X-Caboquinho sumir de vez, sugiro à Câmara Municipal de Manaus trocar o patrimônio cultural por um memorial de fotos no Largo de São Sebastião. Com direito a vela, plaquinha e tudo. Um show para a indústria do turismo aplaudir.

Também, se um dia a crise do X-Caboquinho virar uma telenovela, alguém me avise que eu, com todo o prazer, em nome da “bandeira da regionalidade”, escreverei o capítulo em que o tucumã é resgatado por um herói de moto-taxi usando uma capa feita de folhas de bananeira. Juro que o capítulo ficará uma delícia bem amazônica.

Foto: Juscelino Taketomi

¹Articulista do Portal Em Tempo, Juscelino Taketomi, é Jornalista. Há 28 anos é servidor da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam)

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