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reflexos da seca

Estiagem afeta turismo na Amazônia e dificulta vida de empreendedores

Além dos reflexos ambientais, a seca na Amazônia tem forte impacto econômico e de subsistência na vida de famílias dependentes do turismo

Foto: Lucas Bonny

Manaus (AM) – A seca no Amazonas tem afetado todos os aspectos da vida dos amazonenses. Na última divulgação do boletim do governo estadual, 60 dos 62 municípios amazonenses estão em situação de emergência e até o momento, mais de 600 mil pessoas foram afetadas. E muitas delas dependem do turismo, como base econômica e de sobrevivência de diferentes formas.

Essa é a realidade da gestora da Pousada Vista do Rio Negro, localizado na comunidade Santa Helena do Inglês, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Rio Negro, Adriana de Siqueira. A pousada dela foi um dos muitos empreendimentos que tiveram que fechar as portas, devido à severa estiagem que atingiu o estado.

“A seca impactou muito na área do comércio, no nível do turismo, a pousada ficou muito prejudicada, tivemos que fechar e está previsto ficar fechada até novembro, mas a gente vai ver como ficará essa seca, provavelmente, se não tiver água até no meio de dezembro, vamos permanecer fechados. Não podemos abrir, pois muitas das coisas que são atrativas estão impossibilitadas, está só lama, não podemos receber turistas. Tivemos que fechar mesmo as portas e, infelizmente, várias famílias foram prejudicadas aqui na comunidade, porque era através da pousada que elas recebiam seu sustento”,

contou a empreendedora.

Adriana é uma das empreendedoras e das famílias auxiliadas pela Fundação Amazônia Sustentável (FAS), uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos que atua pelo desenvolvimento sustentável da Amazônia por meio de programas e projetos nas áreas de educação e cidadania, saúde, empoderamento, pesquisa e inovação, conservação ambiental, infraestrutura comunitária, empreendedorismo e geração de renda.

A Fundação realiza uma série de ações de capacitação e fomento, como o “Laboratório de Turismo”, em parceria com a Accor Hotels, um curso digital voltado para empreendedores, com aulas que abordam conceitos de ecoturismo, desenvolvimento de roteiros, gestão empreendedora e jornada do turista. Também foram desenvolvidas a criação de modelos de negócio e o uso de ferramentas digitais para venda e nesse momento de necessidade, articulam estratégias para ajudar a sustento de famílias amazônicas.

O gerente do Programa de Empreendedorismo e Negócios Sustentáveis na Amazônia (PENSA) da FAS, Wildney Mourão, estima que pelo menos 10% do faturamento previsto para os próximos meses das pousadas, dos 12 empreendimentos que a FAS apoia no turismo, vão ter cancelamento. Conforme o gestor, cerca de 320 turistas deixaram de frequentar as comunidades, uma perca de R$ 200 mil de faturamento bruto.

“As atividades como o turismo, sendo muito relevante na região aqui próximo de Manaus, o artesanato, a gastronomia, sendo atividades inerentes, sofrem um grande impacto. Então, a gente já pode antecipar que pelo menos 10% do faturamento previsto para os próximos meses das pousadas, dos 12 empreendimentos que a FAS apoia no turismo, já tiveram cancelamento. Estamos falando de uma perda aproximada de 320 turistas que deixarão de vir nesse mês de outubro e novembro nas comunidades. E isso vai gerar em torno de R$ 200 mil de faturamento bruto que os empreendimentos deixarão de faturar por essa não vinda mais dos turistas, pela inviabilidade logística e pela seca na Amazônia”,

afirma Wildney.

Segundo o Governo do Amazonas, o turismo injetou mais de R$ 420 milhões na economia amazonense no primeiro semestre de 2023. Ao todo, 174 mil turistas conheceram as belezas do turismo amazonense neste período.

O presidente da CS Rio Negro, que representa as 19 comunidades da reserva Rio Negro, residente da comunidade Saracá, o pescador Sebastião Brito, relata que os diversos problemas ambientais torna a estiagem de 2023, pior que a histórica de 2010.

“A seca de 2010 foi muito parecida com a 2023, mas está tem tudo para ultrapassar está seca histórica. Hoje, o nosso Rio Negro tem muitos bancos de areia e lama, diferente de 2010, vejo que a natureza traz esse monte de areia. Também tem a questão das queimadas, as quais são muito preocupantes e atingem todo o estado do Amazonas e nossas comunidades”,

declara o líder das comunidades.

No período de janeiro deste ano a 24 de outubro foram registrados 18 mil focos de calor no Estado, dos quais 2,5 mil na região metropolitana de Manaus. Somente em outubro, até o momento, foram 3.288 focos, mais do que o dobro do mesmo período do ano passado, quando foram notificados 1.335 focos de calor.

Para o geógrafo Marcos Freitas, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), só o El Niño não explica a situação do Rio Negro. Para ele, há indícios de que a estiagem no Amazonas está relacionada com o aquecimento global do planeta. Isso porque as chuvas na região do Rio Negro são formadas sobretudo pelos deslocamentos de massas de ar provenientes não do Oceano Pacífico, mas do Atlântico.

Por conta dos prejuízos ambientais, a FAS tem realizado ações estratégicas para ajudar famílias. “Nesse primeiro momento, nossa atuação é na contenção dos danos. Está muito na ajuda humanitária, pelo isolamento das comunidades. Foi criada a ‘Aliança Amazônia Clima’ em parceria com outras organizações da sociedade civil. A ideia é receber, nesse primeiro momento, doações de mantimentos, de alimentos, e de outros itens de primeira necessidade para primeiro fazer a contenção. E, após o retorno das chuvas, que acreditamos que deva acontecer agora em dezembro, temos um plano para conseguir retomar as atividades. Estamos apurando agora os impactos de perdas dos empreendimentos de turismo para entendermos como ajudá-los a organizar uma agenda positiva para remanejar as datas com os turistas que já haviam feito agendamentos prévios”, declarou Wildney Mourão ao Em Tempo.

A “Aliança Amazônia Clima” é um movimento cidadão e coletivo de combate aos efeitos da crise climática na região amazônica. A iniciativa está mobilizando doações de itens de primeira necessidade para as pessoas mais afetadas pela seca. Criada no último dia 3 de outubro, a aliança é uma idealização FAS, que já conta com o apoio de 65 organizações socioambientais e representantes de centros de pesquisa na região amazônica.

A iniciativa está mapeando as áreas mais atingidas pela seca na Amazônia para mobilizar recursos para prover alimentos, água potável, remédios, e outros itens de primeira necessidade para as comunidades indígenas e tradicionais. A Aliança Clima Amazônia já atendeu 119 famílias (595 pessoas) em situação de vulnerabilidade no estado do Amazonas.

Uma das estratégias da FAS aos empreendedores como a Adriana de Siqueira é o adiamento de agendamento com turistas, para amenizar o prejuízo inerente deste período.

“Estamos orientando que eles não façam o cancelamento, mas que negociem com os turistas o adiamento dessa data. Fazer um acordo. Aqueles que têm contrato, fazer um acordo de extensão de prazo e aqueles que têm um acordo verbal, com a antecipação do pagamento, orientamos que eles entrem em acordo para realizar a viagem em uma data que mais confortável para o turista e para os empreendedores, para que não se tenha nenhuma perda maior para os empreendedores que trabalham com o turismo, especialmente”,

explicou Mourão.

O turismo sustentável desenvolvido nas comunidades, rios e florestas do entorno não é lucrativo apenas para aqueles que trabalham diretamente no setor. Uma cadeia de atividades auxiliares, do transporte ao artesanato e alimentação, é movimentada, fortalecendo a economia local.  

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