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Opinião

A educação da sensibilidade

Parece que a sociedade não fica, mas chocada com cenas violentas, aparentando indiferença. Será que as pessoas estão insensíveis ou o mundo estão tornando-as assim? Em que direção devemos olhar?

Reprodução Redes Sociais

Parece que foi ontem que assistimos algumas revoltas populares no Oriente Médio e parte da África. As revoltas começaram na Tunísia e se espalharam pela região, assistimos com perplexidade a tentativa de milhares de refugiados tentando cruzar o mediterrâneo em barcos e boiais improvisadas. Um horror!

Nova onda de guerras se espalha rapidamente e parecem retornar com força total neste biênio 20022/23: Rússia invade a Ucrânia; terroristas do Hamas adentraram em Israel, mataram inocentes, e fizeram vários reféns. Nova crise humanitária sem precedentes, nesta região. Por estas bandas, o ditador venezuelano anexou a província de Essequibo, da Guiana, em referendo fajuto e ilegal. Gerando tensão em nossas fronteiras!

Parece que a sociedade não fica, mas chocada com cenas violentas, aparentando indiferença. Será que as pessoas estão insensíveis ou o mundo estão tornando-as assim? Em que direção devemos olhar?

Difícil visualizar um norte! Mas ao folhear um dos livros de cabeceira, achei diálogo interessante de dois mestres apaixonados pela educação e que indica um caminho. Lhes apresento uma porção deste papo, entre Celso Antunes e Rubem Alves – Uma conversa sobre educação. “A educação da sensibilidade”.

Rubem – O relatório para os quatros pilares para a educação do século XXI, é apresentado pela UNESCO: Aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. Para mim, na questão do conviver, do “viver com” é que está o início do sentimento de ética, porque a ética surge quando sou capaz de pensar o sentimento do outro.

Um dia, lá em casa, minha neta de 11 anos estava à mesa, almoçando. Repentinamente, ela se levantou, foi para a sala e começou a chorar; aliás, já tinha saído da mesa chorando. Aí eu me levantei e fui conversar com ela. Perguntei-lhe o que estava acontecendo. Ela respondeu: “vô, não posso ver uma pessoa sofrendo sem que meu coração fique junto com ela”.

Fiquei assombrado com a capacidade que ela tinha de perceber, de se colocar no lugar do outro, pois é a base de tudo: a base da civilização, da sociedade, a base da ética, da bondade. Essa é uma questão que não é bem tratada nas nossas escolas. Elas não trabalham a sensibilidade em relação ao outro.

Ao voltar para casa em noite chuvosa, fazia frio. Na esquina vazia havia duas crianças, um menino e uma menina, pedindo coisas. Olhei para as duas crianças, e o meu coração ficou junto do coração delas. Eu deveria ter pegado as duas e levado para minha casa, mas não fiz isso! … Fui para casa com aquela dor!
Não sei, honestamente, se as escolas têm pensado sobre essa questão, se têm se dedicado a ela ou com esse imperativo de sofrer ao pensar no sofrimento da outra pessoa.

Celso – concordo inteiramente, nem poderia ser diferente. E parto de um principio muito simples: o sentimento de amizade em relação aos colegas da classe é inato? Não, não é.

Ninguém nasce pré-disposto a fazer amizade com esta ou aquela pessoa. Se não é inato, é aprendido. Se é aprendido, deveria ser aprendido na família e na escola. Infelizmente, o papel da família hoje está se transfigurando muito… (Fim)

– A passagem encontrada neste livreto, me remete a algo que aconteceu comigo. Permissão aos mestres Rubens e Celso, para entrar na prosa e contar-lhes:

Estava em um shopping center almoçando, e avistei uma criança vendendo bala na praça de alimentação. Percebi que vinha em minha direção, automaticamente retirei alguns trocados da carteira e dei a ela. Sequer permiti maior aproximação, fui indiferente.

Meu olhar não saiu daquela criança. Ao abordar outro cliente que estava almoçando, observei qual seria sua reação. Ele fez uma pausa em sua refeição, cobrindo-a com vários guardanapos de papel, levantou-se e conduziu a criança pelos ombros, foram até o balcão do restaurante e ofereceu-lhe o cardápio. Após receber seu alimento, sentaram frente a frente e juntos almoçaram. Fiquei maravilhado com a solidariedade, afeto e sensibilidade deste sujeito!

Professor Rubens, confesso que também fui para casa com esse sentimento, com aquela dor…

Não podemos fugir dos fatos em nosso cotidiano. Inúmeras pessoas aproximam-se pedindo ajuda nos sinais, nas portas dos supermercados, nas feiras e etc. Ao sermos abordados tenhamos cuidado com a indiferença, desprezo e frieza, afinal são nossos irmãos e não gostariam de estar ali. Quem gostaria?
Precisamos tomar um choque de alteridade com urgência!

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