×

Sexta-Feira Santa: origem, tradição e significado no Brasil

Data que integra o Tríduo Pascal marca a morte de Jesus Cristo e reúne tradições católicas, judaicas e afro-brasileiras em rituais simbólicos

Foto: Marcello Casal jr/Agência Brasil

A Sexta-Feira Santa faz parte do Tríduo Pascal, celebração central da Igreja Católica que relembra a paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. A data é móvel e varia a cada ano, pois está relacionada à Festa de Pessach (Páscoa judaica), citada nos evangelhos cristãos.

Segundo a teóloga Ana Beatriz Dias Pinto, doutora em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, a preparação para a Páscoa remonta a tradições anteriores ao cristianismo, praticadas no judaísmo.

“Quando a gente vislumbra o período de preparação para a Páscoa, isso vai acontecer por uma tradição que vem desde antes do período cristão, e já era praticada pelo judaísmo”, explica Ana Beatriz.

Ela ressalta que os textos judaicos relatam a realização da Pessach no sábado e domingo de lua cheia após o início da primavera no hemisfério norte (outono no sul). Nesse contexto, a morte de Jesus teria sido antecipada para uma sexta-feira para não coincidir com os rituais da festividade judaica.

“Quando Jesus foi sentenciado à morte, eles precisaram antecipar o momento de crucificação dele […] para que não atrapalhasse as festividades dos judeus. Então, acabou sendo numa sexta-feira”, diz.

O simbolismo do sacrifício

Na tradição judaica, o sacrifício de um cordeiro marcava a proteção das casas durante a décima praga do Egito, quando os primogênitos seriam mortos. O cristianismo reinterpretou esse sacrifício à luz da crucificação de Jesus Cristo.

“A interpretação teológica desse evento é fundamentada nos evangelhos, principalmente o Evangelho de João e também nas Cartas de São Paulo, quando ele vai falar que Cristo era a verdadeira Páscoa e que foi imolado [morto em sacrifício]”, explica Ana Beatriz.

A morte que impulsionou uma nova fé

Segundo a teóloga, a morte de Jesus gerou uma ruptura histórica e cultural, abrindo caminho para o nascimento do cristianismo.

“Um homem de carne e osso, que acaba sendo morto e, pela espiritualidade, se compreende que ele veio para cumprir as escrituras […] havia a necessidade desse povo sair do contexto de pecado para um contexto de amor”, reforça Ana Beatriz.

Liturgia marcada pelo luto

Na liturgia católica, a Sexta-Feira Santa relembra os últimos passos de Jesus até sua morte. Não há celebração eucarística neste dia, como sinal de luto.

“Dentro dessa dinâmica do simbolismo, a ausência da celebração eucarística está ligada a um caráter de luto. Os católicos entram em luto na quinta-feira à noite”, frisa a especialista.

Durante a celebração, há um momento dedicado à adoração da cruz, simbolizando o sacrifício de Cristo. A forma como esse ritual é vivenciado varia conforme a cultura de cada país.

“Aqui no Brasil, por termos uma tradição latina, a gente é muito passional. Muita gente beija a cruz, se ajoelha diante dela. […] Cada povo vai ter um costume”, afirma.

Encenações e austeridade

A tradição da Via Sacra também é comum em várias cidades brasileiras. Fiéis encenam os momentos finais de Jesus, promovendo reflexão sobre a Paixão de Cristo.

“O tom que pela tradição da igreja se pede é de austeridade, silêncio, contemplação e luto. É realmente um momento de se lembrar que uma pessoa morreu, que é o líder máximo do cristianismo”, enfatiza Ana Beatriz.

Feriado nacional com raízes culturais

No Brasil, a Sexta-Feira Santa é feriado oficial, conforme a Lei 9.093/1995. A prática tem origem no período colonial, quando o cristianismo era a religião oficial do Império.

“Apesar do Brasil ser um estado laico, acabou sendo convencionado que se manteria esse calendário como feriado, porque se faz parte da cultura do povo, da tradição e dos costumes”, explica a teóloga.

Sincretismo com religiões de matriz africana

A influência do catolicismo também se reflete em outras religiões presentes no Brasil. Na umbanda, candomblé, quimbanda e batuque, a Páscoa é vista como um momento de renascimento espiritual.

“Vão fazer festas para Oxalá, que seria o orixá associado à figura de Jesus Cristo, porque a gente tem um sincretismo muito grande entre as matrizes africanas e o catolicismo”, aponta Ana Beatriz.

Diferentes interpretações cristãs

Outras doutrinas cristãs interpretam a morte e ressurreição de Jesus de formas diversas. O espiritismo, por exemplo, vê a ressurreição como evolução espiritual.

“Eles não vão ter rituais, mas eles respeitam como um símbolo de renovação interior […] têm também a figura de Jesus Cristo como um profeta, como alguém muito evoluído”, afirma a especialista.

Tempo de reflexão e transformação

A Semana Santa, independentemente da fé, pode servir como convite à introspecção e à busca por mudanças individuais e sociais.

“Hoje, a gente pode reinterpretar também o sentido da Páscoa como uma oportunidade de a gente olhar para nós mesmos […] o que a gente quer para a nossa sociedade?”, conclui Ana Beatriz.

Leia mais: Feirão do Pescado vende 12 toneladas de peixes e fatura mais de R$ 380 mil em dois dias

Para ficar por dentro de outras notícias e receber conteúdo exclusivo do portal EM TEMPO, acesse nosso canal no WhatsAppClique aqui e junte-se a nós! 🚀📱

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *