Três anos após o então recém-eleito presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciar o desejo de sediar a conferência no Brasil, a 30ª edição da COP (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática) começa nesta segunda-feira (10), em Belém (PA). O evento, que se estende por duas semanas, inicia em um cenário global de incerteza sobre compromissos climáticos.
De acordo com a plataforma Climate Watch, apenas 79 dos 195 signatários do Acordo de Paris apresentaram suas novas metas climáticas nacionais (NDCs), que representam 64% das emissões globais de gases de efeito estufa.
Entre os países que ainda não entregaram seus planos está a Índia, uma das maiores poluidoras do planeta. Já a União Europeia submeteu sua meta apenas em 5 de novembro, poucos dias antes do início da cúpula.
Falhas no cumprimento das metas climáticas
As NDCs (contribuições nacionalmente determinadas) são os documentos que orientam as políticas nacionais de combate à crise climática. Pela regra da ONU, os países devem atualizar suas metas a cada cinco anos. No entanto, a maioria dos governos não cumpriu o prazo original, fixado para fevereiro, nem a extensão até setembro.
O relatório-síntese da UNFCCC, braço da ONU responsável pelas mudanças climáticas, foi inconclusivo e não conseguiu determinar com precisão o cenário de aquecimento global futuro.
Estimativas paralelas apontam que, considerando as promessas da China e da União Europeia, as emissões globais poderiam cair cerca de 10% até 2035. Contudo, para manter o aquecimento abaixo de 1,5°C até o final do século, seria necessário reduzir 60% das emissões.
“Fechar essa vergonhosa lacuna [entre o corte de emissões necessário e o prometido] é uma condição absolutamente fundamental”, afirma Claudio Angelo, coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima.
“Para isso, não há outra opção senão lidar com o fim dos combustíveis fósseis, que é um tema do qual ninguém quer tratar. Mesmo diante dessas circunstâncias desfavoráveis, espero que a COP30 possa ser o início da resolução desse assunto.”
Países ricos resistem a discutir combustíveis fósseis
Na COP28, realizada em Dubai, foi a primeira vez que um acordo mencionou redução no uso de combustíveis fósseis, propondo uma transição energética “de forma justa, ordenada e equitativa”. Desde então, no entanto, países produtores de petróleo, gás e carvão conseguiram barrar novas discussões sobre o tema.
Crise de hospedagem marcou preparativos em Belém
Além da indefinição sobre as metas climáticas, os altos preços de hospedagem em Belém dificultaram a chegada de delegações, especialmente de nações mais pobres.
O quórum mínimo de 132 países (dois terços dos signatários) para legitimar decisões foi alcançado há menos de um mês. A crise foi amenizada por medidas do governo federal, incluindo um apelo à ONU para ampliar verbas destinadas a países em desenvolvimento e apoio de bancos de fomento e entidades filantrópicas.
Às vésperas do evento, os preços de hotéis e imóveis despencaram mais de 60%, segundo a Abih-PA, o Creci-PA e a plataforma Airbnb.
Até sexta-feira (7), 160 países já tinham acomodações confirmadas, enquanto 27 ainda buscavam hospedagem.
As últimas edições da conferência registraram participação quase total: foram 193 países na COP29 (Azerbaijão), 196 na COP28 (Emirados Árabes Unidos) e 195 na COP27 (Egito).
Adaptação climática ganha foco central
Com o número mínimo de participantes assegurado, a principal pauta da COP30 deve ser a definição de indicadores para medir o progresso de ações de adaptação climática, chamada de Meta Global de Adaptação (GGA).
Após anos de debate, o número de critérios foi reduzido de mais de 5 mil para cerca de 100, que seguirão em discussão ao longo da conferência. Entre os temas mais sensíveis estão o financiamento, a transferência de tecnologia e a capacitação de países em desenvolvimento — os chamados “meios de implementação”.
Um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), publicado em 29 de outubro, apontou que o mundo precisa ampliar entre US$ 284 bilhões (R$ 1,5 trilhão) e US$ 339 bilhões anuais (R$ 1,8 trilhão) em financiamento para adaptação nos países mais vulneráveis até 2035.
“Espero que a COP30 consiga mostrar três coisas. Primeiro, que adaptar-se não é desistir, mas insistir em bem viver”, diz Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa.
“Segundo, que a transição [energética] é resiliente e imparável — e que temos o compromisso de dar força a ela, mesmo com os ventos contrários dos populistas e protecionistas. E, por fim, a resiliência do próprio regime internacional, que neste momento precisa se provar relevante.”
Financiamento divide países ricos e emergentes
As tensões entre países desenvolvidos e emergentes voltam a dominar o debate climático. As nações ricas, historicamente responsáveis pela maior parte das emissões, são cobradas a financiar a crise climática, enquanto pressionam China e Índia a integrarem o grupo de financiadores.
Essa disputa deve dificultar as negociações em Belém.
Para contornar a falta de recursos públicos, a presidência brasileira da COP aposta em parcerias com o setor privado, por meio da Agenda de Ação, voltada a iniciativas voluntárias de empresas, filantropias e governos locais.
Embora promissora, a iniciativa não tem caráter vinculativo e não possui força de lei, diferentemente dos acordos formais da ONU.
(*) Com informações da Folha de S.Paulo
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