Em um mundo marcado pelo enfraquecimento de instituições tradicionais, tais como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a Organização das Nações Unidas (ONU), o BRICS surge como uma alternativa estratégica para o fortalecimento do multilateralismo. Originalmente formado em 2009 por Brasil, Rússia, Índia e China e, um ano depois pela África do Sul, o bloco reúne grandes economias emergentes que representam não apenas uma parcela significativa do PIB mundial, mas também uma diversidade cultural, política e geográfica que desafia a hegemonia ocidental tradicional.

Juntos, os países do BRICS respondem por cerca de 32% do PIB global em paridade de poder de compra (PPC), segundo dados do FMI de 2024. Esse número ultrapassa a participação do G7, o grupo das maiores economias desenvolvidas, o que evidencia o peso crescente dessas nações na economia global. Em termos populacionais, o BRICS representa mais de 40% da população mundial, o que amplia ainda mais sua relevância nos debates sobre desenvolvimento, comércio, segurança e meio ambiente.

Desde sua formalização como bloco em 2009, o BRICS passou por um processo de amadurecimento institucional. Um dos marcos mais importantes dessa trajetória foi a criação do Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), em 2014, com sede em Xangai. O NDB tem como objetivo financiar projetos de infraestrutura e desenvolvimento sustentável nos países membros e em outras economias emergentes, oferecendo uma alternativa ao Banco Mundial e ao FMI, frequentemente criticados por suas condicionalidades políticas e assimetrias de poder.

A entrada de novos países ao bloco, como Egito, Etiópia, Irã, Indonésia, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, sinaliza um novo momento de expansão e consolidação do BRICS como uma plataforma global de cooperação Sul-Sul. Essa ampliação não apenas aumenta a representatividade do bloco, como também diversifica sua base de recursos energéticos, minerais e tecnológicos, criando uma rede mais resiliente e multifacetada de interesses comuns.

O fortalecimento do BRICS coincide com um cenário internacional marcado por tensões geopolíticas, como a guerra na Ucrânia, a rivalidade sino-americana e a fragmentação de cadeias globais de valor. Nesse contexto, o bloco se apresenta como uma proposta alternativa que prioriza o a busca por um sistema internacional mais equilibrado.

Do ponto de vista econômico, o BRICS oferece aos seus membros a oportunidade de diversificar mercados, atrair investimentos e reduzir a dependência de instituições financeiras dominadas por países do Norte Global. A intensificação das trocas comerciais e dos fluxos de capital dentro do bloco tem potencial para fortalecer economias nacionais e promover padrões de crescimento menos vulneráveis às flutuações das economias centrais.

No caso do Brasil, a participação no BRICS tem importância estratégica tanto para sua inserção internacional quanto para o fortalecimento de sua economia. Como um dos fundadores do grupo, o Brasil desempenha um papel relevante na formulação de pautas e na construção de consensos, especialmente nas áreas de desenvolvimento sustentável, agricultura, tecnologia e reforma das instituições multilaterais.

A economia brasileira também se beneficia da cooperação intra-BRICS por meio do acesso a novos mercados consumidores, parcerias em infraestrutura e ciência, e possibilidades de financiamento com menos exigências políticas. Além disso, o Brasil pode explorar complementariedades produtivas com países como China e Índia, tanto no agronegócio quanto na indústria de base e na transição energética.

Em termos geopolíticos, o BRICS reforça a posição do Brasil como uma liderança regional e um ator relevante no tabuleiro global. A atuação ativa no grupo fortalece a diplomacia brasileira de não alinhamento automático, ao mesmo tempo em que amplia sua margem de manobra frente às grandes potências. O país pode exercer o papel de mediador em disputas globais e contribuir com propostas para a governança internacional.

Culturalmente, o BRICS também oferece um espaço para a valorização da diversidade e do diálogo intercultural. A criação de fóruns de cooperação acadêmica, científica e cultural permite o intercâmbio de conhecimentos e experiências, contribuindo para a construção de uma ordem mundial mais plural e aberta. Essa dimensão, embora menos visível, tem efeitos significativos sobre a percepção e a influência dos países do bloco.

Ao desafiar o monopólio ocidental sobre normas e instituições internacionais, o BRICS pressiona por uma reforma das instâncias de decisão global, como o Conselho de Segurança da ONU, onde o Brasil busca uma cadeira permanente. O bloco defende maior representatividade dos países em desenvolvimento nessas estruturas, condizente com o peso econômico e populacional que passaram a ter no século XXI. Mais do que uma aliança circunstancial, o bloco se projeta como um agente transformador das regras do jogo internacional, especialmente se conseguir conciliar crescimento econômico com inclusão social e sustentabilidade.

A perspectiva de desdolarização das transações internacionais dentro do BRICS também representa uma inovação relevante. Embora ainda embrionária, essa discussão visa reduzir a vulnerabilidade cambial dos países membros e fortalecer moedas locais, promovendo maior autonomia monetária. Tal movimento pode reconfigurar as bases do comércio global e desafiar a hegemonia do dólar como moeda de reserva internacional.

O BRICS representa uma resposta concreta à crise do multilateralismo tradicional pós 1945, oferecendo um modelo de cooperação baseado na cooperação entre países em desenvolvimento e na promoção de um sistema internacional mais representativo. Para o Brasil, trata-se de uma oportunidade de reposicionar-se no cenário global, diversificar parcerias e ampliar sua influência diplomática, econômica e cultural no século XXI.

Farid Mendonça Júnior

(*) Farid Mendonça Júnior é economista, advogado, administrador e Assessor Parlamentar no Senado Federal

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