“Na sociedade globalizada, existe um estilo elegante de olhar para o outro lado, que se pratica de maneira recorrente: sob as aparências do politicamente correto ou das modas ideológicas, olhamos para aquele que sofre, mas não o tocamos, transmitimo-lo ao vivo e até proferimos um discurso aparentemente tolerante e cheio de eufemismos” (Papa Francisco).

Ao vermos como o Congresso nacional se movimenta, vamos percebendo o jogo de interesses que não são em favor da sociedade brasileira, e menos ainda em favor dos pobres, dos povos originários. Não vê os povos originários como sujeitos de direito. Lei 14.701/outubro de 2023, vai contra a decisão da Suprema Corte que regulamenta o reconhecimento, a demarcação e a gestão de terras indígenas, agredindo o usufruto exclusivo das terras indígenas, com base no artigo 231 da Constituição. Reintroduziu o chamado “marco temporal”, que condiciona a demarcação de terras tradicionalmente ocupadas à data da promulgação da Constituição de 1988. Os indígenas, primeiros habitantes das terras, são cada vez mais excluídos, para não dizer descartados.

Outra votação do Congresso Nacional que vê, mas não vê, é a Lei Geral do Licenciamento Ambiental (LGLA), denominado o “PL da Devastação”. A Lei altera o processo de licenciamento ambiental no país, permitindo que empreendimentos obtenham licenças de forma automática, apenas com base na autodeclaração do empreendedor, sem necessidade de análises técnicas prévias. O PL compromete a prevenção de danos ambientais, enfraquece a fiscalização necessária dos órgãos competentes, colocando em risco o meio ambiente. O PL é retrocesso ambiental com consequências mortais. É uma violência contra os povos e comunidades tradicionais. Não vê o todo, vê possibilidades financeiras de grupos.

A PEC das Prerrogativas, conhecida como PEC da Blindagem, PEC da Imunidade, foi aprovada pela Câmara Federal, como emenda constitucional, afirmando a necessidade de autorização prévia do Congresso para atos judiciais em relação aos seus membros. E isso, mesmo se o suposto crime não estiver relacionado ao mandato e for, por exemplo, na área civil. A redação da PEC aprovada na Câmara, reza que os parlamentares “a qualquer tempo, somente serão alvos de medidas cautelares de natureza pessoal ou real dele provenientes”. Os deputados retomaram a exigência de que o Congresso precise dar sinal verde para que parlamentares respondam a processos criminais no Supremo Tribunal Federal. Graças à mobilização da sociedade, às manifestas de rua, e à percepção ética de senadores, essa PEC foi rejeitada e arquivada.

Ainda em andamento na Câmara Federal, com diversas tentativas, deseja-se alterar o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias para conceder anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 e restaurar os direitos políticos dos cidadãos declarados inelegíveis ante os atos relacionados às eleições de 2022. Permite que políticos que perderam seus mandatos, por esses motivos, reassumam seus cargos. O horizonte da democracia desaparece.

Esse movimento da maioria dos membros do Congresso Nacional, não vê o bem do Brasil e o cultivo da democracia. Um movimento que beneficia a grupos do próprio Congresso Nacional, ignorando a responsabilidade do mandato que deveria ser o exercício da democracia e o cuidado do bem comum. As manifestações nas ruas, serve de sinal: a sociedade está atenta, vê, e não está mais disposta suportar o movimento antiético.

Cardeal Leonardo Ulrich Steiner, Arcebispo de Manaus

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