O processo de adesão de motoristas de automóveis no setor de passageiros ao trabalho mediado por aplicativos resultou em jornadas de trabalho mais longas, menor contribuição previdenciária e forte queda da renda média destes trabalhadores. Entre 2012 e 2015, enquanto o total de motoristas autônomos no setor de transporte de passageiros (não incluídos os mototaxistas) era cerca de 400 mil, o rendimento médio flutuava em torno de R$ 3.100. Em 2022, quando o total de ocupados se aproximava de 1 milhão, o rendimento médio era inferior a R$ 2.400.
Nessa mesma categoria, a proporção de trabalhadores com jornadas entre 49 e 60 horas semanais passou de 21,8% em 2012 para 27,3% em 2022. Esse aumento não se repetiu entre os trabalhadores autônomos de modo geral, no mesmo período. Outro aspecto que revela a precarização desse tipo de ocupação é a cobertura previdenciária: em 2015, pouco menos da metade dos motoristas de passageiros (47,8%) contribuía, percentual que despencou para somente 24,8% em 2022.
Os dados estão no estudo “Plataformização e Precarização do Trabalho de Motoristas e Entregadores no Brasil”, que compõe a 77ª edição do Boletim Mercado de Trabalho, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), lançado na terça-feira (21), em Brasília. O texto também analisa a situação dos entregadores plataformizáveis (motociclistas, entregadores e condutores de bicicletas). Em 2015, quando havia apenas 56 mil trabalhadores desse tipo no país, a renda média era de R$ 2.250. Já em 2021, eram 366 mil entregadores plataformizáveis e uma renda média de R$ 1.650.
Para o diretor de estudos e políticas sociais do Ipea, Carlos Henrique Corseuil, a importância desse debate está, primeiramente, no fato de ser um tema em pauta.
“Houve uma tentativa de fazer um acordo de legislação para regulamentar esse tipo de trabalho, que não foi alcançado no âmbito do grupo específico com essa finalidade, mas que já foi levado pelo Executivo ao Legislativo. Subsidiar a construção dessa política e informar a sociedade como um todo são as principais importâncias, pois muitas vezes as pessoas não sabem onde buscar informação qualificada. Estamos apresentando o estado da arte do pensamento, com contribuições de pessoas envolvidas no tema, que possuem experiência e expertise no assunto. Acreditamos que essas informações são extremamente valiosas para a sociedade”,
disse.
Principalmente após 2018 — quando o crescimento desses entregadores intensificou-se de maneira mais expressiva —, houve retração da proporção de trabalhadores com jornadas entre 40 e 44 horas e aumento da quantidade dos atuavam por mais de 49 horas semanais. A contribuição previdenciária dos entregadores plataformizáveis não formais também caiu: entre 2012 e 2018, 31,1% deles contribuíam, enquanto de 2019 a 2022 essa média se reduziu para 23,1%.
O estudo conclui que “o modelo de trabalho plataformizado se baseia em um vetor de precarização, representando, por um lado, menores patamares de renda, formalização e contribuição previdenciária, e, por outro lado, maiores jornadas semanais de trabalho”. Segundo os autores, os técnicos de planejamento e pesquisa do Ipea Sandro Sacchet e Mauro Oddo, apesar de os dados demonstrarem essa precarização, muitos trabalhadores “reproduzem a narrativa (ou ideologia)” de que são “empreendedores de si mesmos”.
“Esse é um produto de grande importância que o Ipea oferece, tanto para pesquisadores quanto para quem trabalha na regulação e gestão de políticas públicas. O tema é especialmente relevante, pois as recentes transformações no mundo do trabalho trazem muitas incertezas e inseguranças sobre o futuro do trabalho e suas implicações. Compreender o impacto das novas tecnologias que surgem e se desenvolvem rapidamente, e como elas afetam o mercado de trabalho, é fundamental. Considerando as características do mercado de trabalho brasileiro, marcado por grande heterogeneidade estrutural e regional, e por grandes diferenças de gênero, raça, qualificação e escolaridade, é essencial entender como essas inovações afetam essas dinâmicas e, por sua vez, interferem na política social como um todo”, comentou Sandro Pereira Silva, diretor do Departamento de Gestão de Fundos no Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
*Com informações da assessoria
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