Recentemente, as redes sociais foram tomadas por discussões sobre o caso da influencer mirim Kamylinha, que reacendeu um debate urgente: o que acontece quando uma criança é exposta a situações, estímulos e responsabilidades típicos da vida adulta antes da hora?

Não falo apenas do impacto psicológico — que já é enorme —, mas também das mudanças físicas e metabólicas que essa “corrida” imposta ao corpo pode causar. E, antes que você diga: “Ah, mas isso só acontece na internet”, já olhou as roupas que você compra para sua criança? Há excesso de maquiagem por aí logo cedo? Ou é do tipo que acha lindo um menino de 7 anos ser o “garanhão”? A adultização precoce muitas vezes está de forma discreta em nossa rotina e nem nos damos conta dos riscos de algo que pode parecer trivial. No texto dessa semana, vamos entender o que acontece com o metabolismo de uma criança quando pulamos etapas, além de discutir o que podemos fazer para evitar.

Quando a puberdade chega cedo demais

A adultização precoce pode estimular a puberdade precoce, que ocorre quando o corpo começa a produzir hormônios sexuais muito antes do tempo esperado. Isso ativa o eixo hormonal hipotálamo–hipófise–gonadal e provoca uma série de transformações:

  • Crescimento acelerado: O famoso “estirão” vem mais cedo, mas as placas de crescimento dos ossos fecham rapidamente, resultando em uma estatura final menor (a criança não cresce tudo o que poderia crescer).
  • Alterações no metabolismo: Mudanças no uso de carboidratos e gorduras aumentam o risco de resistência à insulina, obesidade e síndrome metabólica. (O metabolismo de crianças e adultos é diferente; essa alteração na hora errada prejudica muito a longo prazo.)
  • Modificação da composição Corporal: Meninas acumulam mais gordura nos quadris e mamas antes do tempo; meninos aumentam a massa muscular cedo demais, o que exige maior energia — e aumenta o risco de obesidade depois.
  • Impactos ósseos: Alcança-se o pico de massa óssea cedo, mas nem sempre no nível ideal; isso abre portas para osteopenia e osteoporose precoce (traduzindo: ossos fracos e problemas mais cedo na vida adulta).

Corpo pronto, mente em construção

A grande questão é que o corpo pode até parecer mais maduro, mas o cérebro — especialmente o córtex pré-frontal, responsável por decisões e autocontrole — ainda está em plena obra. Ou seja, temos um organismo com aparência e metabolismo de adulto, mas com processamento emocional e cognitivo de criança. Uma mistura que não combina com a exposição a pressões sociais, cobrança estética e sexualização.

O risco da exposição social precoce

Casos como o de Kamylinha ilustram como a internet pode acelerar não apenas a puberdade física, mas também a social. Quando o algoritmo recompensa comportamentos adultos em corpos infantis, cria-se um ciclo perigoso: mais estímulo → mais engajamento → mais pressão para manter o personagem “adulto”. O problema? Isso cobra um preço alto na autoestima, no desenvolvimento emocional e na saúde física.

O que os pais e cuidadores podem fazer?

  • Atenção aos sinais físicos precoces: crescimento rápido, desenvolvimento de mamas ou pelos antes dos 8 anos (meninas) ou 9 anos (meninos).
  • Cuidados com a alimentação e rotina: O excesso de alimentos ultraprocessados e o sedentarismo potencializam os riscos metabólicos.
  • Supervisão digital: O feed não deve ser a babá, muito menos a professora.
  • Apoio emocional: Conversas francas e acompanhamento psicológico, quando necessário.

Seja no corpo que cresce no modo “turbo prematuro”, seja na timeline que cresce no modo “conteúdo sugestivo prematuro”, é hora de apertar o freio. A proteção infantil deve vir antes de likes e views — e sim, o metabolismo pode até ficar mais rápido, mas a infância só deveria ter um ritmo: livre e com limites (preferencialmente impostos por pais e não por algoritmos).

E você, pai ou mãe, está tratando sua criança como criança?

Natasha Mayer

(*) Natasha Mayer é Farmacêutica, formada pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM), pós-graduada em Cosmetologia pela Faculdade Oswaldo Cruz – SP, em Saúde Estética pela Biocursos e em Gestão de Empresas pela Fundação Dom Cabral. Mestre em Engenharia de Produção pela UFAM, CEO da Pharmapele Manaus e presidente da Associação dos Jovens Empresários e Empreendedores do Amazonas (AJE-AM).

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