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Semipresidencialismo

Semipresidencialismo: solução para os problemas políticos do Brasil?

Especialistas e políticos ouvidos pelo Em Tempo pedem cautela sobre o tema, e afirmam que o modelo não é a chave para solucionar a crise política no país

Foto: Divulgação

Manaus (AM) – O sistema político adotado no Brasil é o presidencialismo. Nele, a figura do presidente carrega funções de chefe do Estado e chefe do Governo. Porém, desde o ano passado, deputados da Câmara Federal tem levantado a discussão de mudanças para outra forma de governo com o objetivo de alterar as relações entre os poderes Executivo e Legislativo. Essa alternativa é, historicamente adotada por outros países, no entanto, especialistas e políticos ouvidos pelo Em Tempo pedem cautela sobre o tema, e afirmam que o modelo não é a chave para solucionar a crise política no país.

A pauta sobre o sistema semipresidencialista se destacou novamente, após o ex-presidente Michel Temer (MDB) afirmar, no dia 3 de fevereiro, durante um evento em Lisboa, que o Brasil deveria considerar o modelo híbrido entre o presidencialismo e o parlamentarismo.  

“É importante falar sobre a importância do semipresidencialismo, que existe aqui em Portugal. É isso que precisamos no Brasil. O Gilmar é um grande fã dessa ideia. É importante, então, falar sobre a importância de uma reforma política no Brasil”,

disse o ex-presidente.

Temer também defendeu que o semipredencialimo poderia ser um caminho para solucionar os problemas de âmbito político no Brasil: “Impedimento virou moda, é sempre um trauma institucional. Passei por isso, vocês sabem”, disse o ex-presidente ao relembrar os dois pedidos de processo de impeachment contra ele.

Desde a redemocratização, o país já passou por dois processos de impeachments de Chefes do Executivo: em 1992, com o afastamento e renúncia de Fernando Collor, e em 2014 com o impedimento do segundo mandato de Dilma Rousseff. No total, desde o governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), já houve cerca de 318 pedidos de impeachments, sendo 158 apenas na gestão Bolsonaro.

Nesse sentido, foi instalado, em março de 2022, na Câmara Federal um Grupo de Trabalho (GT) com o objetivo de discutir a implantação do semipresidencialismo no país. Parlamentares defensores do sistema alegam que seria uma alternativa para diminuir as tensões entre os poderes.

Na época, no dia 3 de maio de 2022, ainda candidato à reeleição, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou a tentativa de impulsionar a pauta encabeçada pelo presidente da Câmara Arthur Lira (PP). Conforme Lula, a proposta seria uma manobra para diminuir o poder do Presidente da República.

“Ele já quer tirar o poder do presidente para que o poder fique na Câmara dos Deputados e ele aja como se fosse o imperador do Japão”, disse Lula.

Sistema semipresidencialista

O sistema semipresidencialista foi adotado por países como Portugal, Palestina, Rússia e Moçambique. De um modo geral, funciona com a fusão do modelo parlamentarista e presidencialista (sistema atual no Brasil).

Ou seja, assim como no parlamentarismo, há no governo semipresidencialista duas figuras: o presidente (chefe de Estado), e o primeiro-ministro (chefe de governo). Essa forma de governo também se assemelha ao presidencialismo, pois diferente do parlamentarismo, o presidente não possui apenas funções decorativas, mas complementares com o primeiro-ministro. Além disso, o presidente é escolhido por voto popular. 

Conforme o cientista político Carlos Santiago, a discussão sobre a implantação do semipresidencialismo no Brasil reacendida pelo ex-presidente Michel Temer é desnecessária, e serve apenas para criar ainda mais conflito político.

Isso porque o país já atravessa um período conturbado, o qual chegou em seu ápice com o episódio golpista no dia 8 de janeiro, quando apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) invadiram as sedes dos Três Poderes em Brasília. Além disso, também enfrenta crise econômica com baixo crescimento e geração de empregos.

Com a implementação do semipresidencialismo no país, Carlos Santiago avalia que causaria, por consequência, o enfraquecimento do presidente da República e fortalecimento do parlamento.

“O semipresidencialismo retiraria o poder do presidente da República de conduzir e de planejar as políticas públicas, colocando a execução e a formulação de políticas públicas no parlamento”,

disse.

Ao Em Tempo, Carlos Santiago pontuou que o problema político do Brasil não tem relação com a figura do presidente, mas com a falta de transparência, e com falta de ética do parlamento brasileiro.

“Entregar o parlamento brasileiro à condução de políticas públicas do país e dar força demais ao parlamento brasileiro parece um tanto absurdo e muito desnecessário neste momento em que o país precisa se unir e de um presidente que conduza as políticas públicas. O Brasil precisa de mais harmonia e menos conflito. Um debate sobre sem presença ali nesse não contribui em nada”,

explicou.

Para o deputado federal Amom Mandel (Cidadania), o sistema semipresidencialista não é o melhor caminho para solucionar os problemas do Brasil, e salientou que as dificuldades do país se encontram na execução efetiva do atual sistema político.

“O semipresidencialismo é o sistema adotado na Rússia. Não é preciso fazer um esforço muito grande para perceber que, ao menos por lá, não tem sido muito saudável para a democracia. O mesmo ocorre em outros países que seguem o modelo na África. Não concordo que essa seja a solução para os problemas do Brasil e penso que o atual sistema político do Brasil foi excepcionalmente bem desenhado. O problema, de fato, é que ele não é seguido à risca”,

destacou Amom Mandel ao Em Tempo.

Para o senador Plínio Valério, a discussão tem que ir além do semipresidencialismo e deve perpassar pelo parlamentarismo. Nesse sistema, o presidente é o chefe de Estado escolhido pelo parlamento, e tem funções mais cerimonialistas. Também governa o primeiro-ministro, o qual possui o papel de executar de fato as políticas públicas.

“Eu me lembro que alguns anos atrás na época do plebiscito eu fui a favor do presidencialismo. Hoje, eu já estou mudando de ideia. Claro que a gente precisa amadurecer, mas é nessa discussão que a gente amadureceria. Chegou a hora de discutir isso”, ressaltou.

Semipresidencialismo no Brasil?

A redução de poder do presidente da República tem acontecido em diversos países democráticos desde o século XIX. Conforme o cientista político Helso Ribeiro, cada vez mais o parlamento foi ganhando espaço. Já no Brasil, ainda há uma centralização na figura do presidente por parte da população.

“Se você perguntar quem é o presidente da República, todo mundo vai dizer que é o Lula. Mas, se você perguntar que é o presidente do Senado, eu não sei se eles vão acertar que é o Rodrigo Pacheco. Cada vez mais, haverá essa tentativa de enxugar e diminuir os poderes do presidente da República que são muitos. Esse poder vai ser dividido, e grande parte vai para o poder Legislativo”,

afirmou.

No mundo, cerca de 50 países adotaram o sistema presidencialista, de acordo com o monitoramento da Universidade de Oxford. Ao se projetar esse sistema no Brasil, o artigo “Semipresidencialismo: uma proposta séria”, de José Eduardo Faria, pontua quais característica sustentam o modelo nos países que o adotaram.

Um desses aspectos é o fomento de máquina administrativa “contra o aparelhamento político”. Nesse sentido, conforme o autor, o Brasil ainda enfrenta “dificuldades para se sobrepor às diferentes formas de clientelismo, populismo e cartorialismo”.

“Por isso, se a proposta do semipresidencialismo for levada a sério, seus proponentes têm de ir além da análise da experiência francesa e portuguesa. Nos países europeus com sistema parlamentarista ou semipresidencialista, o que os sustenta é a eficiência de uma máquina administrativa conduzida por uma burocracia profissional qualificada e protegida contra o aparelhamento político”, afirmou.

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