Brasília (DF) – Apresentado nesta terça-feira (12), pela deputada Dani Cunha (União Brasil-RJ), o projeto da chamada minirreforma eleitoral abranda punições impostas a políticos e a partidos que cometerem irregularidades, flexibiliza regras de transparência e prevê brechas para que as legendas descumpram as cotas definidas para candidaturas de mulheres e de pessoas negras.
A proposta, fatiada em dois projetos de lei, deve ser votada no plenário pelos deputados nesta quarta-feira (13). A minirreforma avançou na Câmara em poucos meses porque o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), deseja que as novas regras sejam aplicadas para as eleições municipais do ano que vem. Para isso, o texto precisa ser sancionado até o dia 6 de outubro deste ano. Caso passe na Câmara, o projeto seguirá para o Senado.
Mesmo diante de questionamentos e protestos de partidos e de organizações de transparência eleitoral, o grupo de trabalho que elaborou o texto final da minirreforma – o colegiado é comandado por Dani Cunha e tem como relator o deputado Rubens Pereira Junior (PT-MA) – manteve trechos controversos.
Um deles abre a possibilidade para que candidatos que praticarem compra de votos ou que realizarem gastos ilícitos durante a campanha se livrem da cassação e preservem o mandato. Nesses casos, o texto prevê uma opção de punição mais branda: o pagamento de multa que pode variar de R$ 10 mil a R$ 150 mil.
No trecho que trata da compra de votos, a mudança proposta é sutil. Atualmente, a lei impõe como punições cassação do diploma e multa. No texto apresentado ontem, a conjunção “e” foi substituída pela “ou”. Assim, o candidato condenado pela prática de compra de votos passaria a ser punido com apenas uma das sanções, conforme entendimento da Justiça Eleitoral.
Críticas
Entidades da sociedade civil que atuam nos campos do combate à corrupção eleitoral e da transparência afirmam que o debate sobre a minirreforma com mudanças para o pleito do ano que vem exige mais tempo, além de uma maior participação de especialistas e da população. A proposta atenua, ainda, punição em casos de falta de prestação de contas e de candidatos considerados fichas-sujas.
O Pacto Pela Democracia e o Movimento Contra a Corrupção Eleitoral criticaram a proposta. “Iremos tomar as medidas cabíveis para que esse tipo de passo para trás, esse retrocesso na transparência, não seja aplicado nas eleições”, afirmou o coordenador de Advocacy do Pacto Pela Democracia, Arthur Mello. Ele vê no projeto risco de danos “à integridade eleitoral, à participação eleitoral e à democracia”.
‘Panfleteiros’
Outro ponto polêmico da minirreforma eleitoral estabelece que candidatos não precisarão informar dados sobre pessoas subcontratadas por empresa terceirizada que prestar serviços à campanha. Dessa forma, não seria possível identificar quem foi contratado, a função que esses funcionários desempenharam e que valores foram repassados. Na prática, o dispositivo afrouxa o controle da Justiça Eleitoral e de outros órgãos de fiscalização sobre a distribuição de recursos recebidos pelos partidos políticos.
“É a farra dos panfleteiros”, criticou Arthur Mello, do Pacto Pela Democracia. “Isso pode facilitar a compra de votos, uma vez que não vai haver a documentação de quem foram os subcontratados para desempenhar o serviço.”
Destinado às legendas em anos eleitorais para bancar as campanhas de seus candidatos, como viagens, cabos eleitorais e material de divulgação, o fundo eleitoral em 2022 foi de R$ 4,9 bilhões, um recorde. Para 2024, os parlamentares articulam furar esse teto.
Cotas
A minirreforma eleitoral em curso no Legislativo também é alvo de contestações por afetar candidaturas femininas e negras, abrindo margem para que os partidos possam manejar os recursos destinados para esses grupos como quiserem. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) define que o repasse para essas candidaturas tem de ser proporcional. Isto é, se há 40% de candidaturas negras, 40% da verba deve ser destinada ao grupo. Nesta minirreforma, não há referência sobre o valor a ser destinado a cotas raciais.
Na reunião dos integrantes do grupo de trabalho da minirreforma realizada anteontem, o PSOL protestou, pedindo a alteração do texto. No entanto, não houve mudanças significativas na versão final.
No caso de candidaturas de mulheres, o porcentual mínimo de 30% deverá, pelo novo texto, ser analisado por federação, e não mais por partido. Assim, seria possível cumprir a cota determinada pela Justiça Eleitoral se houver 30% de mulheres no somatório geral das candidaturas apresentadas pelas legendas que integram a federação partidária.
“Dirigentes partidários alegam que, na lei, os partidos detêm autonomia para realizar suas ações. A questão de cotas não é uma prerrogativa de partido”, afirmou o presidente do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, Luciano Santos. “A questão de cotas é uma política pública de inclusão, acima dos partidos. É a Lei Eleitoral. Não dá para alegar autonomia dos partidos e deixar por conta deles como se aplica e qual o porcentual.”
‘Boca de urna’
O texto elaborado pelo grupo de trabalho permite, ainda, a propaganda eleitoral nas redes sociais no dia da eleição, mas veda o impulsionamento pago dos anúncios para alcançar mais público. Especialista em Direito Eleitoral, Alberto Rollo disse considerar a prática “boca de urna” em ambiente digital. “Fazer propaganda na internet no dia da eleição não deixa de ser boca de urna na internet. O eleitor abre as redes e vê propaganda eleitoral, é uma boca de urna diferente, mas é uma boca de urna”, afirmou.*
*Com informações do jornal O Estado de S. Paulo.
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