Manaus (AM) — As candidaturas coletivas voltaram ao foco de discussões parlamentares com o projeto da minirreforma eleitoral discutida na Câmara dos Deputados. Na última semana, o Plenário aprovou uma emenda à PL 4438/23 que proíbe o modelo de candidatura. Ao Em Tempo, participantes de candidaturas coletivas no Amazonas evidenciam suas insatisfações com possível proibição – PL ainda passará pelo Senado.
“Tudo evolui e se aprimora com o tempo. Proibir candidaturas coletivas é prejudicial à democracia, pois afasta a política institucional do povo. Essa não é uma demanda que vem de dentro da política, mas sim uma necessidade que surge da sociedade, demonstrando que é possível transcender a personificação do poder e torná-lo mais coletivo e participativo. Além disso, as candidaturas coletivas costumam trazer pautas importantes que muitas vezes não encontram espaço nos parlamentos para serem debatidas”
, declarou a produtora cultural Michelle Andrews.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), encaminhou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) o projeto da minirreforma eleitoral aprovada pela Câmara dos Deputados na semana passada. Dessa forma, a expectativa é de que o texto tramite de forma independente ao projeto que atualiza o Código Eleitoral e está parado na Casa desde 2021. As novas regras têm de virar Lei até o dia 6 de outubro deste ano para valer nas eleições municipais de 2024.
A produtora cultural Michelle Andrews faz parte da Bancada das Manas (PCdoB) pioneira nas candidaturas coletivas no Amazonas. Em 2020, se lançaram na disputa para um cargo na Câmara Municipal de Manaus (CMM), sendo a quinta mais votada, com quase 8 mil votos. No entanto, o grupo não foi eleito por não atingir coeficiente eleitoral mínimo.
“Minha motivação para aderir a esse modelo de candidatura foi impulsionada pela busca de inovação na política e pela crença de que mais pessoas devem se envolver na arena política. Além disso, desejei sair do formato tradicional de mandato para explorar novas maneiras de representar a vontade popular.
, afirmou.
Além disso, podemos observar que candidaturas coletivas também são preferência de segmentos com menor representação parlamentar, como mulheres, pessoas negras, pessoas LGBT+, e acaba sendo uma estratégia desses segmentos para chegar em ambientes tão hostis como os da política institucional.”
São integrantes da bancada a advogada Alessandrine Silva, a administradora Val Fontes, a assistente social Marklize Siqueira, e a líder comunitária Patrícia Andrade, mas quem representaria oficialmente no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) seria Michelle Andrews.
As pautas levantadas pela Bancada das Manas perpassam diversos grupos da sociedade amazonense, seja na capital ou nas calhas dos rios do Estado, como a defesa das mulheres, dos direitos humanos, sustentabilidade, das comunidades dos povos e dos rios, e a promoção da educação e cultura. Também destacam a luta por questões de gênero e contra o racismo.
A proposta aprovada referente a minirreforma pela Câmara esvazia a Lei da Ficha Limpa, abre brechas para reduzir os repasses às candidaturas femininas e atenua as regras relacionadas às prestações de contas eleitorais. O projeto também estabelece transporte público gratuito obrigatório no dia das eleições, com linhas especiais para regiões mais distantes; legaliza as candidaturas coletivas nas eleições para deputado e vereador e permite que a pena de cassação do candidato que usar recursos ilegais seja substituída por pagamento de multa de até R$ 150 mil.
Uma candidatura coletiva é quando um grupo de pessoas se junta numa chapa para concorrer as eleições. Devido à legislação, um nome aparece nas urnas, nesse caso é o da Christopher Rocha, responsável legal pelo mandato. É ele quem tomaria a posse, da Chapa Coletiva da Juventude (PCdoB) formada por seis jovens amazonenses que buscaram atuar politicamente no Amazonas.
“Consigamos democratizar mais a participação popular nas casas legislativas, a gente precisa continuar com esse formato de candidaturas coletivas, que a legislação possa prever e assegurar que esses co-candidatos e que possam ser garantidos no registro, ser regulamentados e não marginalizados e criminalizados como vem tentando essa minirreforma eleitoral”,
declarou Christopher Rocha.
Ao Em Tempo, Christopher afirmou que a ideia de montar uma candidatura coletiva com outros jovens ativistas surgiu por entender que a política brasileira é conservadora e existe uma dificuldade em acessar esses espaços.
“O que me motivou a me inserir nesse modelo de candidatura foi justamente entender que a política, como ela é feita hoje, não é feita para ocuparmos esse espaço, é uma política conservadora, é uma política branca, uma política elitista das pessoas que detém um poder e o econômico. Não há muitos espaços para que novos sujeitos entrem em cena e quando conseguem são muitas das vezes estigmatizados, hostilizados, estereotipados. Entendi que não podia naquele momento estar sozinho nesse da política porque é um espaço hostil para pessoas como nós, jovens, LGBTs, negros, periféricos.”
, declarou Christopher Rocha.
Em um perfil traçado Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com dados da eleição 2022, caso a Câmara fosse uma pessoa, ele seria um homem branco, acima de 50 anos, com ensino superior completo e um patrimônio acima de R$ 2 milhões.
“Para as mulheres e negros, coletivo é, na maioria das vezes, a única forma que conhecemos e que queremos fazer política. Ter uma organização e uma rede de apoio para a formulação, para o acolhimento e para dividir as minhas inseguranças e até o cuidado do meu filho foi essencial para que eu tivesse coragem de concorrer a uma eleição”,
aponta Mônica Seixas. Ela faz parte do Movimento Pretas (PSOL), que ocupa uma das cadeiras da Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP).
A Frente Nacional das Mandatas e Mandatos Coletivos lançou um abaixo assinado e tem se articulado para pressionar Brasília. Caso passe pelo Senado, a proibição às candidaturas coletivas ainda poderá ser vetada pelo Presidente Lula.
Contra as candidaturas coletivas
Inicialmente, o texto-base da minirreforma buscava regulamentar as candidaturas coletivas. Entretanto, uma emenda do deputado federal gaúcho Bibo Nunes (PL) contra essa regulamentação foi aprovada. Bibo declaro que as candidaturas coletivas podem levar ao estelionato. “Como um candidato recebe votos de quem votou em outro? É uma enganação”, disse na defesa da emenda.
O relator da proposta, deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), lembrou que as candidaturas coletivas já têm o aval do Tribunal Superior Eleitoral. “Na candidatura coletiva, há apenas um candidato, os outros são apoiadores”, afirmou.
O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) avaliou que a proibição das candidaturas coletivas é um recado do Parlamento contra o Judiciário. “É dizer ao Tribunal Superior Eleitoral: chega de se intrometer no que não é o seu dever, o dever de legislar é da Câmara dos Deputados”, declarou.
Minirreforma eleitoral
Entre as flexibilizações propostas pela minirreforma, estão a isenção de sanções aos partidos que não cumprirem a cota mínima de 30% de candidaturas femininas, que poderá ser contabilizada por federação, e a autonomia aos partidos na distribuição dos 30% de recursos públicos destinados à campanha eleitoral das candidaturas femininas. A regra atual determina que o percentual deve ser dividido entre todas as candidaturas femininas do partido, mas a mudança permitirá que todo o valor seja destinado a apenas uma candidata, por exemplo.
Outros pontos principais da minirreforma são a legalização das candidaturas coletivas para deputados e vereadores e transporte público gratuito obrigatório no dia das eleições. Entre os pontos que foram retomados, está o prazo de inelegibilidade de políticos que perderem o mandato.
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