A morte de palestinos que buscam ajuda humanitária na Faixa de Gaza tornou-se uma ocorrência quase diária desde que a Fundação Humanitária para Gaza (GHF, na sigla em inglês) — organização apoiada por Israel e pelos Estados Unidos — assumiu a distribuição de alimentos e suprimentos essenciais na região, em 26 de maio.

Em menos de um mês, aproximadamente 440 pessoas morreram e mais de 3 mil ficaram feridas enquanto tentavam receber auxílio nos centros de distribuição. O chefe da UNRWA, a agência da ONU para os refugiados palestinos, classificou o novo sistema como “uma abominação”.

ONU: “Mecanismo de ajuda é uma armadilha mortal”

“O recém-criado e assim chamado ‘mecanismo de ajuda’ é uma abominação que humilha e degrada pessoas desesperadas”, afirmou Philippe Lazzarini, comissário-geral da UNRWA, durante entrevista coletiva em Berlim na terça-feira (24). “É uma armadilha mortal que está custando mais vidas do que salvando”, completou.

A declaração ocorreu no mesmo dia em que forças israelenses mataram ao menos 44 palestinos que aguardavam por alimentos no enclave. Segundo testemunhas e autoridades de saúde locais ouvidas pela agência Associated Press, soldados israelenses abriram fogo deliberadamente contra as multidões.

O Exército de Israel, que frequentemente nega responsabilidade pelas mortes e culpa o grupo Hamas, alegou ter feito apenas “disparos de advertência” contra pessoas que se aproximaram de suas tropas “de maneira suspeita”.

Uso de força letal vira padrão nos acessos à ajuda

Relatos e vídeos verificados pelo New York Times indicam que o Exército israelense tem utilizado força letal de forma recorrente para controlar as multidões nas imediações dos pontos de distribuição.

Em vídeos compartilhados nas redes sociais, é possível ver corpos no chão coberto de sangue. Algumas vítimas estão com ferimentos graves na cabeça e outras apresentam membros dilacerados.

“Eu podia ouvir os gritos de jovens e de outros por causa dos ferimentos”, relatou à CNN Mohammed Saqer, 43 anos, que tentava buscar comida para a família na semana passada. “Na minha frente estavam quatro jovens com ferimentos diretos na cabeça. Havia uma pessoa ao meu lado ferida com um tiro no olho. Até recuar era quase impossível. Todos estavam deitados no chão, sem conseguir levantar a cabeça, porque, se levantasse, seria baleado”, contou.

Distribuição emergencial começa após bloqueio total de Israel

O GHF assumiu a tarefa de distribuir ajuda após o governo israelense interromper totalmente o envio de mantimentos para Gaza por mais de dois meses. A medida gerou alertas de organizações internacionais sobre o risco iminente de fome em massa no território.

Tel Aviv afirma que o novo modelo busca impedir que o Hamas desvie alimentos — acusação não comprovada com evidências públicas. Agências de ajuda humanitária que atuavam no sistema anterior, sob coordenação da ONU, negam que ocorresse qualquer desvio sistemático.

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