O Brasil tem um compromisso decisivo para a próxima década, que é o de universalizar os serviços de saneamento básico, até 2033. Trata-se de uma meta ambiciosa — e urgente — que pode redefinir a qualidade de vida de milhões de brasileiros e determinar a sustentabilidade ambiental e econômica do país a médio e longo prazos.
O avanço rumo à universalização, entretanto, envolve desafios históricos. Depende de infraestrutura, exige governança e requer participação conjunta de governos, setor privado e sociedade. À medida que o prazo se aproxima, torna-se essencial entender o que está em jogo para o futuro, quais os obstáculos a serem ultrapassados e onde surgem oportunidades capazes de acelerar o processo.
Os primeiros desafios são o prazo curto para o atingimento das metas e o ritmo desigual entre as regiões. Milhões de pessoas ainda carecem de acesso à água tratada e, sobretudo, ao esgotamento sanitário no Brasil.
De acordo com o mais recente levantamento realizado pelo Instituto Trata Brasil, referente a 2023, o abastecimento de água tratada alcançava, no período, cerca de 83,1% da população brasileira. Ou seja, cerca de 34 milhões de pessoas ainda não contempladas.
No mesmo ano, a cobertura de rede de coleta de esgoto atingiu 55,2% da população, mostrando mais de 90 milhões de brasileiros (44,8%) sem acesso. Em média nacional, cerca de 51,2% dos esgotos gerados são efetivamente tratados.
Os dados regionais evidenciam disparidades substanciais entre as regiões. No Norte 58,9% da população tem acesso a água potável por rede. O Nordeste chega a 74,9%, o Centro-Oeste a 90,9%, o Sul a 91,0% e o Sudeste a 91,3%.
As diferenças são ainda maiores quando se fala em rede de cobertura e tratamento de esgoto. No Norte, a cobertura de esgoto é muito baixa — atende apenas cerca de 13,1 % da população. No Nordeste, chega a 30,3 %. O Sul registra aproximadamente 47,4 %. O Centro-Oeste apresenta cobertura de 59,5 % e o Sudeste atende 80,5 % da população.
Em termos de volume de esgoto efetivamente tratado, os números são bem preocupantes também. No Norte, apenas cerca de 21,4 % do esgoto gerado é tratado. No Nordeste, esse percentual sobe para cerca de 34,1 %. No Sul, alcança 46,7%, no Centro-Oeste chega a 58,5% e no Sudeste o índice é de 58,6%.
Esses dados deixam claro que há uma desigualdade marcada entre regiões. No Norte, os problemas decorrem do déficit histórico acumulado em anos de descaso nessa área. O que tem sido feito, especialmente no Amazonas, é correr uma verdadeira maratona por dia para suprir essa lacuna e contribuir com os municípios de forma efetiva para que possam alcançar a universalização dos serviços.
Sabemos que as prefeituras sozinhas não conseguirão fechar essa conta. E, sem planejamento e engenharia qualificada, os projetos travam, ficam mais caros ou não se sustentam ao longo do tempo. Isso vale tanto para municípios pequenos quanto para grandes capitais.
Outro grande problema no horizonte é a crise climática. Os eventos extremos — estiagens prolongadas e cheias intensas como ocorrem no Amazonas — pressionam os sistemas de abastecimento. Sem adaptação climática, o crescimento da rede pode ser comprometido justamente onde é mais necessário.
É preciso que se tenha em mente, no Brasil, que a universalização só será real se chegar também às periferias, áreas rurais, comunidades ribeirinhas e regiões isoladas. Sem equidade, atingir números globais não significa garantir dignidade a todos. E é isso que devemos perseguir.
No caso do Amazonas, o governador Wilson Lima fez um movimento diferenciado ao entender que era preciso apoiar os municípios nesse processo. Pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano (Sedurb), mobilizamos as prefeituras e todos os órgãos necessários, formando um colchão de suporte.
Com base em estudos e análises, chegamos à conclusão que o sistema regionalizado de saneamento é o formato estratégico ideal para superar os desafios no estado. Criamos assim, em 2025, a Microrregião do Saneamento Básico (MRSB), autarquia formada pelo governo estadual e os 61 municípios do interior, com atribuições compartilhadas de planejamento, regulação, fiscalização e prestação dos serviços — direta ou contratada.
Com a MRSB, os municípios, que antes atuavam isoladamente, muitas vezes com incapacidade financeira ou técnica, passam a ter um instrumento institucional para acessar recursos federais e estaduais, melhorar a gestão e expandir a infraestrutura de forma conjunta.
Ao concentrar esforços e recursos, a MRSB permite estender o saneamento a municípios pequenos, isolados ou com difícil acesso, de forma mais eficiente do que se cada município agir isoladamente. A padronização e regulação conjunta também favorecem à maior qualidade técnica nas obras e nas operações e facilita o acesso a financiamento (federal, estadual, bancos de desenvolvimento) justamente para quem geralmente encontra mais dificuldades, democratizando o investimento.
O que temos enfatizado sempre é que as cidades que incorporam saneamento em políticas de habitação, drenagem e crescimento urbano, têm mais chance de alcançar a universalização, com menor custo e maior eficiência.
A meta de 2033 é civilizatória. A universalização do saneamento básico significa saúde, com a queda de doenças de veiculação hídrica (diarréias, parasitoses, contaminações), desenvolvimento urbano, meio ambiente preservado e redução das desigualdades. Saneamento básico representa qualidade de vida e um futuro mais sustentável.

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