Manaus (AM) – O aumento no preço dos combustíveis já virou parte da rotina dos brasileiros nos últimos meses. O mais recente aumento decretado pelo Governo Federal vem causando mais preocupações para os brasileiros e para os amazonenses, pesando diretamente no bolso da população. Após 99 dias com preços congelados para a gasolina e um mês do último aumento do diesel, a Petrobras anunciou os reajustes de 5,18% na gasolina e 14,26% no diesel.
Em 2022, a empresa estatal já anunciou por três vezes o aumento da gasolina e outras quatro do diesel, frustrando motoristas e caminhoneiros que já vivem à mercê da inflação e crise econômica no país.
O preço médio do diesel superou o da gasolina após o reajuste feito pela Petrobras no último dia 17. Segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP), o preço do diesel foi de R$ 6,90 para R$ 7,56. A gasolina passou de R$ 7,23 para R$ 7,39. Conforme a ANP, o valor máximo do diesel chegou a R$ 8,95, ultrapassando o preço máximo da gasolina de R$ 8,89.
Segundo o presidente do Conselho Regional de Economia do Amazonas (Corecon-AM), Marcus Evangelista, o problema do aumento de combustível não é só na questão de abastecer o carro, mas acomete outras esferas da sociedade.
“Quando temos o aumento no diesel, isso afeta diretamente no valor do frete, ou seja, da nossa alimentação, pois praticamente tudo que nós consumimos no Amazonas vem de fora. Meu conselho é economizar o máximo de carona compartilhada, procurar percursos mais curtos, evitar aqueles horários de ‘pico’, enfim, fazer manobras para tentar fazer o seu combustível render ao máximo”, disse Marcus.
Para Marcus Evangelista, uma alternativa para economizar no gasto com os combustíveis é tentar máximo usar carona compartilhada ou procurar caminhos mais curtos, buscando evitar os horários com os maiores fluxos de trânsito. Recomendou ainda que, quem possui veículo próprio, busque fazer uma revisão no carro para que seja viável o transporte com o menor consumo.
“Infelizmente nós não temos um transporte público de qualidade então dificilmente a pessoa que tem um carro vai deixar o seu carro na garagem para andar de ônibus. Meu conselho é economizar o máximo de carona compartilhada, procurar percursos mais curtos, evitar aqueles horários de “pico”, enfim, fazer manobras para tentar fazer o seu combustível render ao máximo. É o momento de fazer uma revisão do carro, calibrar os pneus que são técnicas que as pessoas utilizam para fazer o carro andar mais consumindo menos”, aconselhou Marcus Evangelista.
Setor da alimentação sofre com reajuste
Como a logística do comércio brasileiro é fortemente ligada ao transporte rodoviário e praticamente tudo consumido pela população brasileira é derivado dos fretes de caminhões, o reajuste dos valores do combustível gera um efeito cascata, influenciando nos mais variados setores da economia, impactando o bolso dos consumidores, em especial na alimentação.
O posicionamento também é defendido pela economista Denise Kossama, que alega que quando há o aumento nos combustíveis outros fatores de suma importância para a sociedade como o transporte e a alimentação também sofrem com a interferência.
“Quando a gasolina sobe muita coisa pode subir na mesma escala já que a gente precisa de ter o custo de frete. Há uma preocupação muito grande que, com o aumento do preço dos combustíveis, aumente escala de bens e serviços produzidos dentro do Amazonas ou fora. Uma vez que o aumento de combustíveis impacta no aumento do frete, ou seja, do custo logístico. A produção rural comercializada em Manaus e alimentos que vem de outros Estados encarecem. Ou o produtor, no repasse, reduz a sua margem de lucro ou realmente repassar sob o risco de redução do consumo de bens. A preocupação maior realmente é com os alimentos e demais itens da cesta básica dos amazonenses, que já configura entre as mais caras do país”
, destacou a economista.
Com isso, o carrinho de compras fica cada vez mais vazio e o poder de compra da população vem reduzindo constantemente, visto que, muitas famílias passam a priorizar apenas o básico. Para quem atua no setor o cenário é ainda mais frustrante.
Gerente comercial da Distribuidora Durães, Victor Durães, destacou que, conforme o preço dos produtos aumenta, o poder de compra da população diminui. Representante de inúmeras indústrias de Manaus, a distribuidora, que atua no setor de alimentos, tem sofrido impacto no valor do frete dos produtos comprados da indústria. Pressionado pela alta nos combustíveis, o representante da empresa alega que o frete oferecido pela empresa teve que aumentar.
“Nós representamos várias indústrias aqui em Manaus e realizamos todo processo desde a venda até a entrega da mercadoria. O aumento dos combustíveis tem nos impactado o nosso trabalho de todas as formas possíveis, principalmente no frete dos produtos que compramos da indústria e o próprio frete do nosso caminhão que leva os produtos até o lojista ou varejista. Tivemos que aumentar a gasolina dos vendedores, com o valor que era antes não é mais possível circular hoje. Basicamente, toda essa nossa operação é afetada pelo aumento nos combustíveis. O nosso último aumento em relação ao frete foi de 13% e constantemente recebemos reclamações, pois em uma semana está um preço e na semana seguinte o preço já está maior”
, pontuou.
No interior
A alimentação na mesa da maioria dos brasileiros é constantemente afetada pelos altos valores que são o resultado do aumento nos combustíveis. Entre as mais afetadas, o custo de vida da população no interior do Amazonas segue pressionado e, em relação aos alimentos, os aumentos são mais notados.
Nascido em Barcelos (AM) e morador de Novo Airão (AM) há 30 anos, o jornalista Sebastian Viana não esconde a preocupação com o aumento constante nos alimentos. Ressaltou ainda que, antigamente, fazia a cesta básica com R$300, mas o valor dobrou e o salário continua o mesmo.
“O aumento dos preços tem nos deixados muito preocupados. Antigamente eu fazia minha cesta básica com R$300, mas, atualmente, o valor dobrou e o salário continua o mesmo. Para conseguir me manter, tento fazer outras coisas nas horas vagas. A forma de ovos era R$7, agora varia de R$22 a R$25. A carne do tipo alcatra era R$20 e hoje custa R$42,50. Me sinto revoltado. Pagamos muitos impostos para nada”
, disse.
A estudante de jornalismo Raely Cardoso de Carvalho também notou os altos valores nas compras feitas desde o mercadinho no bairro em que mora até os grandes supermercados. Moradora de Manacapuru (AM), a jovem declara que precisou fazer mudanças no carrinho de compras e pontua que optar pelas marcas mais em conta é o melhor caminho para driblar.
“É bem claro que o carrinho de compras mudou bastante e a gente tenta de tudo um pouco. Mas, o que tem mais dado certo aqui em casa é a substituição de marcas, optando pelas mais em conta, e substituição de alimentos, como, por exemplo, a carne, optando por outras substituições. A maior alta foi nas carnes e no óleo, feijão e verduras também. Até no ovo”
, afirmou.
Impacto nos transportes
Se já era difícil pegar um Uber quando necessário, com os aumentos a situação piora. Além das pessoas que utilizam o carro para lazer e passeio, os usuários de aplicativos de transporte privado urbano também serão afetados pelo reajuste da Petrobras. A alta nos combustíveis e outras questões está fazendo com que os motoristas de transportes por aplicativos fiquem mais seletivos às corridas que decidem fazer. A justificativa é que o trecho da viagem acaba não compensando o gasto do combustível.
Motoristas de transporte por aplicativo declaram que os reajustes anunciados pelas principais empresas do setor (Uber e 99) no valor pago por quilômetro rodado são insuficientes para cobrir a alta de custo provocada pelo aumento do combustível. De acordo com o motorista por aplicativo Gutemberg, de 25 anos, o aumento tem impactado no bolso de todo brasileiro de classe média-baixa e destaca que esse peso diz respeito às más decisões políticas e governamentais com relação aos combustíveis.
“O Brasil tem capacidade o suficiente para fabricar, produzir, extrair e refinar muito mais do que precisa e, mesmo assim, segue pagando um valor muito alto e isso prejudica também prejudica os bens de consumo. Isso funciona em cadeia. Estamos precisando de verdade que alguém olhe por nós sem um interesse por trás, mas que realmente olhe para a necessidade do povo e colocar a grande estatal do país para cumprir com a razão social dela”
, destacou Gutemberg.
O presidente da Associação de Motoristas por Aplicativo de Manaus (Ameap), Alexandre Matias, alegou que tem recebido muitas reclamações dos motoristas em decorrência do aumento dos combustíveis e destaca que, para muitos, tem sido inviável ser um profissional da área.
“Muitos reclamam da inviabilidade em ser motorista de transporte por aplicativo pagando um combustível tão alto, aluguel de carro e todas as outras coisas que aumentaram de acordo com os combustíveis. Hoje, praticamente, nós estamos trocando moedas na rua. Mais de 30% dos motoristas já desistiram da profissão nesses últimos 3 anos. Estamos com uma média de queda de 10% dos motoristas por ano. A situação está bastante difícil. Os motoristas estão sendo mais seletivos com as corridas, ou seja, escolhendo as mais rentáveis ou viáveis de acordo com o percurso do passageiro”
, ressaltou.
Alexandre Matias complementa ainda que a Associação tem buscado novos meios de viabilizar o acesso em empresas de instalação de kits de Gás Natural Veicular (GNV) e tem procurado a Agência de Fomento do Estado do Amazonas (Afeam) para que seja oferecido um financiamento para a categoria dos motoristas de transporte por aplicativo.
Encher o tanque de gasolina no Brasil custa mais do que em qualquer outra grande economia na América Latina. Enquanto nos Estados Unidos, uma parada no posto de gasolina custa 6% da renda mensal, o brasileiro consome por volta de 33% do salário mínimo para abastecer um tanque de 55 litros. Para o motorista Renan Paulo Ricardo, a prática de encher o tanque é vista como insustentável.
“Essa gasolina está muito cara. Enquanto não abaixarem, vai continuar dificultando a nossa vida. Tem pesado muito no bolso, quando colocamos R$ 20 não dá para absolutamente nada e, há um tempo atrás, esse valor rendia no tanque. Se for bem ali na esquina com esse valor, voltando já fico no prego. Antes enchia o meu tanque com R$ 180 e agora estou enchendo com R$ 380”
, pontuou.
Com o aumento nos valores dos combustíveis, quem acaba lidando diretamente com a situção, são os frentistas. Considerados como a linha de frente dessa crise, muitos alegam que estão sofrendo com os questionamentos e xingamentos por parte dos motoristas. Um frentista que preferiu não se identificar comentou ainda que, desde o início dos reajustes, o movimento de clientes tem diminuído.
“O cliente é pego de surpresa em relação aos preços. Nesses últimos dias já houveram dois reajustes e, por conta disso, a frequência de clientes no posto de gasolina tem sido baixa. Todos os dias temos ouvido muitas reclamações sobre o valor do combustível e descontam bastante no nosso trabalho. Temos sofrido bastante em relação a isso, às vezes o cliente acha que a culpa é do frentista. Quem está na ‘ponta da lança’ atendendo diretamente a população são os frentistas. Muitas das vezes os clientes não entendem e acabam descontando em quem só está fazendo o seu trabalho. Passamos por situações que são inacreditáveis”
, disse o frentista.
O trabalhador relembra ainda que, diariamente, também tem a necessidade de arcar com as necessidades básicas e, por mais que trabalhe em um posto de combustíveis, o aumento também pesa no seu bolso.
“É difícil para todo mundo que faz parte da classe média e baixa. Todas as pessoas que utilizam o transporte pessoal ou por aplicativo estão sendo impactadas. No geral, para a economia não é nada bom por estar pesando no bolso de todos. Essa questão dos aumentos dos combustíveis afetam o transporte que, consequentemente, afeta a alimentação e assim vai seguindo essa reação em cadeia”
, comentou.
Abastecer com etanol é uma alternativa?
Além da gasolina e do diesel, há outra alternativa para fugir das altas do produto? Essa é a pergunta feita por muitos motoristas que têm se preocupado com o constante aumento nas bombas dos postos de gasolina. Conhecido como álcool etílico, ou mesmo apenas como álcool, o etanol é um composto químico usado para muitos fins. Levando em consideração a quantidade energética, a gasolina é um combustível mais eficiente que o etanol mas, levando em conta o aumento nos valores, o etanol é visto uma alternativa de substituição.
Motoristas destacam ainda que além do valor mais barato, o etanol traz vantagens pelo ótimo rendimento e pela sustentabilidade. Segundo a Agência Internacional de Energia, a utilização de etanol produzido através da cana-de-açúcar pode reduzir em quase 90% a emissão de gases responsáveis pelo efeito estufa. Mas os pontos positivos começam ainda antes, já que durante o processo de plantio a cana-de-açúcar e o milho auxiliam na fixação de CO2.
O motorista de transporte por aplicativo Renan Paulo Ricardo considera o etanol como uma ótima alternativa para substituir a gasolina e o etanol. O motorista contraria ainda as especulações de que o uso do etanol é prejudicial ao motor, ou a outras partes do veículo.
“O álcool etílico é mais barato e não oferece nenhum impacto negativo no veículo ou em qualquer parte dele. É uma ótima alternativa de substituição aos outros combustíveis que têm pesado muito no bolso. O etanol tem ajudado os motoristas a terem esse equilíbrio e feito com que o bolso fique mais leve até certo ponto”
, disse.
Em contrapartida, o motorista por aplicativo Gutemberg defende que o etanol pode danificar o veículo. Além disso, ressaltou não é uma alternativa viável por consumir de forma mais acelerada.
“Não acho uma boa alternativa para a substituição do diesel e da gasolina. O etanol consome muito mais rápido por conta do calor, que evapora muito rápido, mas no momento em que vivemos, trocando ‘gato por lebre’ o etanol pode até ser uma alternativa. Ele danifica o veículo e a pessoa pode comprar um problema lá na frente, então não tem como fazer essa substituição. Seria interessante a existência de outras matrizes energéticas para competir com o petróleo”
, ressaltou.
Para o presidente da Corecon-AM, Marcus Evangelista, o etanol nem sempre é uma boa opção. De acordo com o economista, abastecer com o etanol propõe uma “economia ilusória”.
“O que deve ser feito é tirar 70% do valor da gasolina, se o preço do etanol ficar abaixo, abasteça com ele, mas se ficar acima, escolha a gasolina”
, explicou.
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