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DIFICULDADES FINANCEIRAS

Famílias enfrentam desafios financeiros na criação de filhos no AM

Os custos para criar um filho até os 23 anos podem chegar a R$ 2 milhões

Foto: divulgação

As famílias brasileiras vivem à mercê da vulnerabilidade do ponto de vista político e econômico, marcado pela alta da inflação e custo de vida elevado. A criação de um filho no Brasil pode custar mais de R$ 600 mil em famílias de classe média, mas nas grandes capitais esse custo pode ser ainda maior. Para reduzir os custos com a criação dos filhos, os pais geralmente abrem mão de serviços, como pessoas que auxiliam no cuidado com as crianças, e reduzem ou substituem atividades extracurriculares. No Amazonas, a situação não foge da realidade do país.

Os custos para criar um filho até os 23 anos podem chegar a R$ 2 milhões. Os dados são do Instituto Nacional de Vendas e Trade Marketing (Invent).

Levando em consideração a elevação do custo vida, em especial nas grandes cidades, o número de casais sem filhos e de pessoas vivendo sozinhas vem crescendo. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 20% dos casais optam por não gerar frutos. O levantamento aponta que na década de 60 a taxa de fecundidade das famílias brasileiras era superior a 6, e desde então vem caindo, com a marca de 2,8 até o início do século 21.

O preço do leite e seus derivados apresentou alta na ordem de 3,45% em média, chegando a 5% em muitos estabelecimentos locais. O aumento ocorre devido ao aumento dos custos de produção, e essa alta já impacta o bolso do consumidor brasileiro e principalmente de quem depende do produto. O custo da produção foi encarecido por vários fatores externos e internos, como seca, aumento da demanda externa, alta no preço da energia elétrica e do petróleo, guerra na Ucrânia e aumento das commodities.

Embora o processo inflacionário tenha tido uma leve queda, o acumulado 8,06% dos últimos 12 meses continua impactando muito no bolso dos brasileiros e, em especial, dos amazonenses. Para a economista Denise Kassama, criar filhos dentro desse cenário requer equilíbrio financeiro e planejamento. Além disso, atribui a alta nos produtos ao aumento no valor dos combustíveis, aos impactos da pandemia e da guerra.

“A redução dos pastos no período entressafra, onerou o custo (menos pasto significa mais investimento em rações) operacional e reduziu a oferta do produto no mercado, pressionando os preços para cima. Muitos itens importados como fraldas, lenços umedecidos, dentre outros, tiveram seus preços aumentados em função da crescente alta do dólar. Além de tudo isso, há que se considerar o custo logístico para envio destes produtos para o Amazonas. O aumento dos combustíveis impacta diretamente nesta cadeia, pressionando o aumento dos preços. Não há expectativa para mudança neste cenário. Enquanto o mundo se recupera das perdas da pandemia e os mercados buscam alternativas para minimizar os impactos da guerra, estamos nós, buscando sobreviver”

, destacou.
Foto: Monkey Business Images / Shutterstock

Mãe de primeira viagem, Renata Queiroz, destaca que criar um filho é uma das maiores dificuldades da atualidade e pontua que, apesar do filho Ravi, de 2 meses, ser uma benção, não foi planejado. Quando a gestação foi descoberta, Renata e seu marido trabalhavam. Atualmente de licença e com o companheiro desempregado, ambos tentam viver com o salário mínimo da licença.

Renata ressalta ainda que antes da gestação, ambos já enfrentavam dificuldades em decorrência da pandemia e com o filho recém-nascido, as coisas se complicaram ainda mais. Além dos gastos provenientes do bebê, a família também se depara com os aumentos constantes no valor das necessidades básicas como água, luz, Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), internet, alimentação e também paga o plano de saúde por conta da precariedade presente no Sistema Único de Saúde (SUS).

“Na época em que descobri a minha gestação, eu e o pai dele trabalhávamos. Hoje em dia estou de licença e o pai dele está desempregado pois o contrato não foi renovado. Enquanto o contrato dele durou, focamos em comprar as coisas para o bebê porque já sabíamos que tinha essa possibilidade do desemprego. Agora vivemos com um salário mínimo no qual estou ganhando durante a licença. Moramos na casa dos meus pais para não pagar aluguel e usamos o dinheiro para pagar água, luz, IPTU, internet, comida e de quebra ainda pagamos um plano de saúde para o bebê por conta das complicações que enfrentamos no SUS”

, destacou.

Durante o processo de amamentação, a mãe de Ravi passou por muitas dificuldades, mas expõe que preferiu aguentar as dores do que comprar o leite mais indicado para os recém-nascidos, que custa na faixa dos R$ 50. Vítima de Mastite Infecciosa, – inflamações do tecido mamário, em geral acompanhada de infecções e afeta apenas uma das mamas e, além disso, causa muita dor na mama e desconforto na região – Renata expressa que chegou a amamentar com um pano na boca para aguentar a dor.

“Sofri muito para amamentar. Tive uma infecção no seio chamada Mastite no qual meu leite empedrou, tive febres e dores insuportáveis pelo corpo e principalmente no seio. Meu seio ficou inflamado, avermelhado e inchado. Mas eu persisti para ele mamar, exatamente para não ter gastos com leite que custa em torno de 50 reais a lata. Eu amamentava ele durante esse período mordendo um pano de tanta dor, mas colocava na cabeça que era o preço dos benefícios da amamentação e por conta do leite que seria muito gasto”

, declara.

De acordo com Renata, um dos piores pontos a se driblar diz respeito aos altos valores que vem na conta de luz. A jovem ressalta que, com o calor manauara, não existe a possibilidade de abrir mão dos aparelhos refrigeradores – considerados os itens que mais gastam energia nas residências.

A mestra em sociedade e cultura (PPGSCA-UFAM), e membra da Coletiva Banzeiro Feminista, Aline Ribeiro, classifica que, no Amazonas, essas famílias vivem um desafio acirrado pela falta de estrutura pública em lidar com o exercício da maternidade, os espaços públicos, desde instituições ensino, não tem preparo físico para lidar com as demandas inerentes as crianças.

Os desafios aumentam para as famílias de crianças PCD’s

Se criar filhos no Brasil é um desafio e tanto, para as mães de crianças com deficiência a missão é ainda mais complicada. De acordo com a economista Denise Kassama, dependendo da deficiência, há a demanda de produtos e suprimentos importados e que com o aumento do dólar, são bem mais caros. Além disso, destaca ainda a necessidade de dietas balanceadas com alimentos específicos, que não dão a essa mãe a oportunidade de substituição por outros itens.

Pollyana de Souza Lima, mãe de Pedro Paulo de 10 anos – diagnosticado com transtorno do espectro autista e epilepsia – não recebe auxílio e ressalta as dificuldades em manter um padrão de vida. O filho tem a necessidade de realizar acompanhamento com inúmeros profissionais para o seu melhor desenvolvimento, mas suprir essas exigências é uma problemática diária.   

“A condição do meu filho de 10 anos aumenta as dificuldades financeiras. Toda segunda-feira eu pago o acompanhamento com fonoaudiólogo, ele passa mal de ônibus e também não gosta de estar em locais com muita gente pois desencadeia uma crise de ansiedade nele. Não é tudo que ele come, ele adora frutas e está a cada dia mais difícil. Fora os exames, tem uns que ele está na fila de espera há mais de um ano. É muito complicado e quase impossível uma consulta com um neurologista ou pediatra. Deixei de viver minha vida para viver totalmente para ele”

, pontuou.

Complementou ainda: Em todos esses anos já estive em vários momentos de desespero com a condição do meu filho. Os apagões, as crises epiléticas – que, por várias vezes, o levou ao hospital –, as várias cicatrizes pelo queixo, cabeça, costa… meu filho já chegou a ser levado até mesmo para a sala de reanimação, mas sempre com fé, Deus me devolvia ele. Muitas vezes tive a ponto de perdê-lo por falta de remédio que só o neurologista podia dar e eu não conseguia a consulta. Muitas madrugadas saí gritando na rua para alguém me ajudar que ele estava tendo crise e eu não tinha dinheiro para um Uber, os vizinhos me levavam para o hospital e me deixavam lá sem eira e nem beira. É difícil”, disse.

Sempre se reinventando para ter melhores condições financeiras, Pollyana, que é mãe de outros dois filhos, atualmente está sem emprego fixo. Por não poder deixar Pedro sem acompanhamento, vem enfrentando as dificuldades seguindo o conhecido “jeitinho brasileiro”.

“Passei a vender churrascos quando eles eram pequenos. Depois vi que não podia sair de casa e passei a pedir lavagens de roupa. Com o tempo comecei a trabalhar com os artesanatos, inclusive gosto de trabalhar com emborrachados e sandálias, e passei a ornamentar Havaianas para vender. Em seguida veio a culinária novamente, vi que trabalhar com bolos de pote estava dando retorno financeiro e então comecei a produzi-los, sempre buscando me reinventar para ganhar dinheiro de um jeitinho que possa estar ao lado dele sempre”

, comenta.

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