Não se constrói uma sociedade justa priorizando o lucro e a ganância de uns poucos por cima do sofrimento da maioria.

Nesta semana os direitos dos povos indígenas a seus territórios voltam a ser questionados. Em 2023, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional a chamada tese do marco temporal. Ela não é só inconstitucional; é imoral e perversa, pois apaga a história de violência contra os povos indígenas. A Suprema Corte permitiu que o marco temporal prevalecesse com a Lei 14.701/2023, promulgada pelo Congresso em dezembro de 2023, possibilitando sofrimentos, violência e morte. O Supremo tem também a responsabilidade, no julgamento atual, de declarar a inconstitucionalidade da Lei.

Desta vez, não será suficiente afastar, de novo, o marco temporal. A Lei 14.701 também pretende que os territórios indígenas sejam explorados por terceiros, roubando aos povos o direito a usufruir deles de forma exclusiva, conforme seus saberes e tradições. O que está por trás dessa Lei é garantir os interesses dos grandes poderes econômicos que assolam a terra, envenenam, destroem, depredam, para produzir commodities que alimentam o mercado mundial enquanto condenam os indígenas e outros grupos humanos a um futuro sem vida, sem floresta, sem sustento. Uma destruição da Casa Comum.

Não satisfeitos com a violência contra os povos indígenas, o Senado pautou no dia 9, do corrente, a votação da Proposta de Emenda à Constituição/PEC nº 48, impondo o marco temporal na Constituição. O Senado, ignorando a história de violência e massacre de povos indígenas, deseja substituir cláusulas pétreas da Carta Maior. Povos que através dos séculos foram eliminados, justamente por reivindicarem as suas terras. Foram expulsos de suas terras, com a invasão ou com títulos de boa fé. Percebe-se falta de respeito e dignidade para com os primeiros habitantes. É necessário que a justiça esteja ao lado dos primeiros moradores das terras. Quando haverá justiça para os indígenas que ainda vivem no Brasil?

Os povos indígenas apontam outro horizonte de convivência com toda a realidade, de sociedade. Na posse livre de seus territórios são os que melhor conseguem conviver com seu entorno, com saberes e conhecimentos próprios, preservando a vida em toda sua complexidade e diversidade. Seu sentido coletivo da terra desafia o imaginário ocidental, mercantilista e privatista, que só consegue ver exploração e riquezas onde os povos encontram o sustento da vida, onde vivem e convivem. Enquanto o mercado conduz a um colapso ambiental de consequências irreversíveis, os povos indígenas demonstram uma convivência harmônica. Os povos tenham a sua dignidade, cultura e direitos assegurados.

Cardeal Leonardo Steiner – Arcebispo de Manaus

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