Brasília (DF) – O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, recebeu as primeiras informações de que os protestos bolsonaristas marcados para 8 de janeiro representavam risco de atos de violência logo após tomar posse no cargo, em 2 de janeiro.
Apenas na véspera da depredação nas sedes dos três Poderes, no entanto, Rodrigues informou à Secretaria de Segurança do Distrito Federal que a área de inteligência da corporação havia identificado a possibilidade de a manifestação tentar invadir prédios públicos e impedir o funcionamento das instituições.
Os relatos estão em depoimento de Rodrigues, obtido pela Folha, no procedimento administrativo disciplinar em curso na PF que apura a atuação de Anderson Torres, ex-ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (PL), no episódio.
A comunicação ao governo distrital ocorreu em uma reunião presencial e, depois, foi formalizada em um ofício, em 7 de janeiro, mesma data que o então secretário de Segurança, Anderson Torres, viajou para os Estados Unidos —ele não chegou a participar do encontro.
Rodrigues afirmou em seu depoimento que não encaminhou nenhum relatório com detalhes dos riscos identificados e que fez apenas a comunicação verbal na reunião.
No início do depoimento, na condição de testemunha, o chefe da PF confirmou ter recebido informações, entre os dias 2 e 5 de janeiro, sobre o perigo que as manifestações marcadas para 8 daquele mês representavam.
“Tomei conhecimento por fontes abertas, acho que era recorrente em redes sociais todo o movimento que havia naquele período, e também por diálogos e despachos diários com a área de inteligência interna nossa”,
disse.
O diretor-geral afirmou que pediu a reunião do dia 7 de janeiro com a Secretaria de Segurança para “entender o que estava sendo planejado e organizado e levar a preocupação em razão de todos os fatos que notadamente iriam acontecer e aconteceram”.
“Eu tomei conhecimento, reitero aqui, por parte da nossa inteligência, onde por mais de uma oportunidade foi alertado, [que] o movimento era notadamente com esse viés de violência, de ‘vamos tomar o poder’ —acho que era expressão muito usada naquele período—, onde nas redes sociais era notório e se poderia facilmente identificar que havia sim movimento violento sendo planejado para o dia 8 como aconteceu”,
disse.
A reunião, segundo ele, foi com o então número dois da pasta distrital, Fernando Oliveira.
“Nosso pleito era levar à Secretaria de Segurança essa preocupação, uma vez que houve reuniões anteriores que a Polícia Federal não havia sido chamada. Então, eu provoquei essa reunião para também colocar nossa preocupação em relação a esse evento.”
Rodrigues disse que ficou com a impressão de que os integrantes da secretaria estavam com “percepções diferentes” à da PF sobre a gravidade da manifestação marcada para o dia seguinte.
Segundo ele, a inteligência da PF e ele mesmo tinham “muito claro que era de extrema gravidade” a mobilização para o protesto e que não “pareceu ser o entendimento dos representantes da secretaria“. No mesmo dia da reunião, Rodrigues encaminhou a seu superior, o ministro Flávio Dino, um ofício com as informações coletadas pela inteligência da corporação.
“Ressaltando aqui que já naquele momento, eu trazendo insistentemente esse alerta, foi pelo menos falado ali, ‘não, de fato a gente vai ter preocupação maior’, alguma coisa nesse sentido, mas a preocupação que houvesse a formalização e ele levaria então ao governador essa preocupação”,
disse.
O diretor da PF afirmou, porém, não ter apresentado um relatório mais detalhado à secretaria de segurança no dia da reunião, mas que recebia “despachos diários com a área de inteligência desde o primeiro momento” e que a questão do dia 8 de janeiro foi tratada “nos despachos diários verbais”. “Eu não recebi documento escrito formal em relação a isso.”
“Não apresentei nenhum documento. Estava acompanhado do que hoje é o diretor de inteligência substituto, doutor [Thiago] Severo, mas não entreguei nenhum documento naquela reunião, apenas verbalizei aquilo que a inteligência havia me comentado e que era notório, fontes abertas, do que estaria por vir”,
afirmou.
Sobre a ausência do então secretário de Segurança, Anderson Torres, Rodrigues disse não se recordar de como ficou sabendo que ele estava fora do Brasil.
Foi o próprio Rodrigues o responsável pelo pedido de prisão do ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e ex-secretário de Segurança do DF que, mais tarde, foi deferido pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O pedido foi feito com base em um relatório do próprio Thiago Severo, que o acompanha na reunião na secretaria de Segurança do DF e levanta a possibilidade de omissão por parte das autoridades locais “diante das informações que alertavam para os fatos vindouros”.
A Folha questionou a Rodrigues o que foi feito entre os dias 2 e 7, após os primeiros informes sobre o perigo que se avizinhava, e por que a PF só solicitou reunião com a secretaria na véspera da manifestação. Também perguntou se foi feita alguma comunicação sobre esse risco ao Congresso e ao STF, mas não obteve resposta em relação a esse ponto específico.
A assessoria da PF disse que a corporação “não tem em seu rol de atribuições o policiamento de ordem pública” e que essa função é da Polícia Militar do DF.
“Entre os dias 2 e 7, a PF aguardou as informações da SSP-DF sobre as ações planejadas, como de praxe. Como não obteve, foi solicitada a reunião do dia 7/1 para conhecimento do planejamento de segurança”,
disse.
A PF também afirmou que “cabe lembrar que os preparativos para as ações violentas do dia 8/1 já eram de conhecimento da sociedade, inclusive por conta da ampla divulgação em redes sociais e fontes abertas, que são monitoradas por unidades de inteligência dos órgãos de segurança pública”.
*Com informações da Folha de S.Paulo
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