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Dia Mundial da Água

Gastronomia amazônica e a preservação dos rios: um ciclo de sustentabilidade

No Dia Mundial da Água, entenda como os ciclos das águas moldam a pesca, a agricultura e a gastronomia na Amazônia

Foto: Divulgação/ADS

A Amazônia é um ecossistema profundamente marcado pelo ciclo das águas, com os períodos de cheia e vazante determinando a disponibilidade de ingredientes essenciais da culinária local, como o tambaqui, o pirarucu e frutos como o açaí e o buriti. No Dia Mundial da Água, celebrado neste 22 de março, é essencial destacar como a relação entre os rios e a gastronomia amazônica reflete a necessidade de preservação dos recursos hídricos.

O impacto do ciclo das águas na pesca e na culinária

Açaí – Foto: Divulgação/Emater

Segundo o pesquisador e engenheiro de pesca do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), doutor Rogério Souza de Jesus, espécies como tambaqui e pirarucu são historicamente as mais capturadas devido à sua relevância comercial. No entanto, sua disponibilidade varia conforme o nível das águas.

“Na época da cheia, quando o rio está muito alto, há uma grande área para mobilização das espécies, tornando a captura mais difícil. Já na vazante, os peixes ficam reduzidos aos lagos e ao leito dos rios, facilitando a pesca”, explica o pesquisador.

A qualidade da água também desempenha um papel crucial na reprodução e crescimento dos peixes amazônicos. A poluição causada por metais pesados do garimpo e o despejo de resíduos urbanos afetam diretamente esses processos.

“Hoje, as capturas estão sendo feitas cada vez mais longe das grandes cidades. Isso acontece porque a poluição e os metais pesados impactam o desenvolvimento das espécies, tornando fundamental garantir a qualidade da água para manter a pesca sustentável”, ressalta o doutor Rogério.

Peixes amazônicos e suas adaptações ao ciclo das águas

Foto: Divulgação/ADS

O pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Roger Crescêncio, destaca que os peixes amazônicos desenvolveram mecanismos de adaptação às variações sazonais dos rios.

“Eles desenvolveram vários sistemas para sobreviver. Por exemplo, quando a água sobe, os predadores passam necessidades, enquanto os herbívoros encontram sementes e frutos para se alimentar. Quando o nível dos rios desce, a água pode ficar com pouco oxigênio, então espécies como o pirarucu desenvolveram a respiração aérea para sobreviver”, explica.

As mudanças nos padrões dos rios podem afetar a reprodução das espécies. Segundo Crescêncio, um atraso no período chuvoso pode ter consequências diretas na reposição dos estoques de peixes. “Se o período chuvoso atrasa cinco meses, a reprodução do pirarucu também será adiada por cinco meses, o que afeta todo o ecossistema”, alerta.

A agricultura nos ciclos de cheia e vazante

O engenheiro agrônomo da Secretaria de Estado da Produção Rural (Sepror), Heitor Liberato, explica como as variações do ciclo das águas afetam a produção de frutos amazônicos.

“Atualmente, as alterações climáticas estão ocorrendo de forma mais constante. Nos últimos anos, passamos por um período de cheias e estiagens mais intensos. Essas variações no nível das águas influenciam diretamente a agricultura, afetando a produtividade das lavouras”, explica.

A agricultura na Amazônia depende de diferentes condições climáticas ao longo do ciclo das águas. Durante o período da vazante, quando a várzea fica exposta, é possível cultivar frutos e hortaliças de ciclo curto, como maracujá, mamão e banana. Já na época da cheia, os agricultores se voltam para a agricultura de terra firme, plantando culturas de ciclo mais longo.

O papel dos rios na culinária amazônica

Chef Cláudio Procópio – Foto: Reprodução

Para os chefs de cozinha que trabalham com a culinária amazônica, a saúde dos rios e os ciclos das águas são fatores determinantes na escolha dos ingredientes e na criação dos pratos. O chef Cláudio Procópio, que comanda um restaurante em Manaus, destaca que a degradação ambiental tem afetado diretamente a oferta de insumos essenciais para a gastronomia local.

“A saúde do Rio Amazonas e dos nossos rios em geral está piorando a cada dia. Um simples descarte inadequado de uma garrafa PET em um igarapé pode parecer insignificante, mas leva mais de 100 anos para se decompor e, ao longo desse tempo, afeta diretamente a qualidade da água e a vida aquática”, alerta.

A época do defeso, período de proibição da pesca para garantir a reprodução das espécies, representa um grande desafio para os restaurantes. “Nessas épocas, a oferta de peixes como o tambaqui e o pirarucu diminui drasticamente. Isso também impacta os preços, tornando o acesso a esses ingredientes mais difícil”, explica o chef.

Diante dessas variações, a adaptação se torna parte do dia a dia na cozinha. “Adaptar receitas por conta da escassez de insumos é um processo diário. Para mim, qualidade é essencial. Se um jaraqui está pequeno demais, prefiro não usar”, afirma.

Para ele, o respeito pelo ambiente é essencial para preservar a culinária amazônica. “Ser um bom chef na Amazônia significa aprender com os povos da região, entender os ciclos das águas e respeitar os produtos que a natureza nos dá”, conclui.

Neste Dia Mundial da Água, a gastronomia da Amazônia reforça o alerta: preservar os rios é garantir a sobrevivência de um dos patrimônios culturais mais ricos do Brasil.

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