O fenômeno das chamadas “terras caídas”, que consiste na erosão das margens dos rios amazônicos, deixou de ser apenas um processo natural para se tornar um dos grandes desafios socioambientais da região. A cada ano, comunidades inteiras perdem suas casas, áreas produtivas são engolidas pelos rios e ecossistemas valiosos desaparecem diante da força das águas. O problema se agrava com o desmatamento, as mudanças climáticas e a falta de políticas públicas consistentes de prevenção e contenção.
Durante minha atuação como advogada ambientalista, presenciei de perto o drama das famílias atingidas e as dificuldades técnicas e jurídicas enfrentadas por quem busca evitar o desbarrancamento das margens. Diversos processos de licenciamento ambiental para obras de contenção acabam paralisados por incertezas na análise, falta de parâmetros claros ou receio institucional em autorizar intervenções preventivas. O resultado dessa morosidade é, muitas vezes, trágico, recentemente em Manacapuru, por exemplo, houve o desabamento parcial de um porto, trazendo prejuízos ambientais, econômicos e humanos. Essa experiência reforçou em mim a convicção de que a ausência de decisões técnicas e jurídicas céleres também pode ser uma forma de omissão estatal.
O Direito Ambiental brasileiro nos oferece instrumentos eficazes para enfrentar essa realidade. A Constituição Federal de 1988 garante a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Isso significa que o Estado não pode ser omisso, cabe-lhe investir em obras de contenção, promover reassentamentos dignos das famílias atingidas e adotar planos de adaptação climática que antecipem riscos e reduzam vulnerabilidades. Mais do que respostas emergenciais, é preciso planejamento, monitoramento e gestão integrada.
Os princípios da prevenção e da precaução devem orientar essa atuação. É melhor evitar o dano do que arcar com os custos irreparáveis da destruição. E quando não há certeza científica sobre a progressão dos impactos, deve prevalecer a proteção das pessoas e do meio ambiente. Também o princípio da solidariedade intergeracional nos lembra que preservar a Amazônia é um compromisso não apenas com o presente, mas com o futuro, com as gerações que ainda dependerão desses rios, florestas e solos para sobreviver.
As terras caídas não podem ser vistas como tragédias inevitáveis, mas como alertas contundentes de que precisamos agir com urgência. É necessário fortalecer a governança ambiental, investir em pesquisas geotécnicas, ampliar o monitoramento das margens por satélite e integrar os esforços de prefeituras, órgãos ambientais, universidades e comunidades ribeirinhas. Cada área que desaba representa a perda de solo fértil, de moradias, de biodiversidade e de histórias de vida.
Proteger rios, florestas e comunidades ribeirinhas é garantir dignidade às populações amazônicas e assegurar que a maior floresta tropical do planeta continue cumprindo seu papel essencial para o equilíbrio climático global. As terras caídas são mais do que erosões, são o reflexo da falta de planejamento e de ação. A Amazônia não pode mais esperar é hora de o Direito e a gestão pública caminharem lado a lado para transformar esse alerta em oportunidade de reconstrução e esperança.

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