Manaus (AM) – De janeiro a maio deste ano, mais de 26 mil pessoas foram registradas como em situação de rua no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) – que visa identificar as famílias de baixa renda no país para incluí-las em programas de assistência social e redistribuição de renda. Atualmente, mais de 180 mil pessoas se encontram nessa situação.
É com o intuito de oferecer amor e solidariedade a essa parcela da população que o projeto “Amor na Rua” tem mobilizado voluntários para levar esperança para as pessoas em situação de rua que se encontram em Manaus. Criado e idealizado pela jornalista e apresentadora de TV, Rhayssa Couto, o projeto foi criado em abril de 2019, a partir de um momento que nutriu esse sentimento de prestar apoio a essas pessoas em vulnerabilidade social.
Aos 16 anos, enquanto ainda estudava, Rhayssa vendia brigadeiro nas ruas, no colégio, nas paradas e nos terminais de ônibus, até que, em determinado momento, se deparou com a realidade de uma pessoa em situação de rua. Com esse encontro, a jovem se sentiu movida pelo desejo de ajudar o próximo. Um pouco mais tarde, conseguiu dar início à iniciativa com a ajuda de um colega que já trabalhava no meio.
“Teve um dia em que eu não tinha almoçado, estava terminando umas vendas, fui até o Centro para comprar materiais para o brigadeiro e fiquei na parada de ônibus do Plaza. Assim eu encontrei o César, ele fazia artes em azulejo e era a coisa mais linda do mundo. Vi ele pedindo uma feijoada ali, uma água com outra pessoa e eu estava encostada na escada. Peguei a única comida que tinha para comer o dia inteiro, que era uma tangerina, fui lá do lado dele, sentei no chão e perguntei se ele queria um pouco. Dividi na metade e aí ele me contou a história dele. Foi naquele momento que percebi que queria trabalhar com as pessoas, ajudar da forma que podia no momento, tentar fazer algum tipo de ação”,
explicou.
Distribuindo marmitas de alimentos uma vez por mês para pessoas em condições de rua em inúmeros pontos do Centro de Manaus, o “Amor na Rua” alcança cerca de 400 pessoas. Além disso, o projeto também promove a integração social dessas pessoas por meio de brechós comunitários – no qual podem escolher algumas vestimentas –, ações de corte de cabelo, limpeza de unhas e outros. Apesar de todas as iniciativas serem de suma importância, Rhayssa pontua a escuta como a que faz mais diferença na vida dessa população.
“A integração social que eles têm entre eles, muitas vezes é um convívio meio agressivo, direto e com pouco afeto. Sempre falo para os meus voluntários que ali não é só entregar uma marmita, é para a gente também alugar nosso ouvido para eles desabafarem e isso é muito importante, faz toda a diferença. Muitas vezes já conseguimos, através da conversa, tirar pessoas da rua. Acho que às vezes a gente pode tocar em um lado que eles ainda não viram. Eles se sentem muito menosprezados e impossibilitados de sair daquela condição. Às vezes eles até tem como sair com a ajuda dos familiares. Tem diversos motivos para uma pessoa ir para a rua que a gente nem imagina e que foge um pouco da nossa realidade. Tem muita gente que é professor, engenheiro, tem de tudo na rua, e é muito triste”, pontuou.
Apoio na pandemia
A pandemia da Covid-19 elevou ainda mais a vulnerabilidade das pessoas que vivem em situação de rua. No Brasil, pelo menos 26.447 pessoas foram morar nas ruas em 2022. Essa população saltou de 158.191 em dezembro de 2021, para 184.638 no mês passado. O levantamento foi feito por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais e aponta que a população de rua cresceu no Brasil, em 2022. Para Rhayssa, o período pandêmico foi o mais difícil a ser vivido, mas uniu todos em prol da solidariedade.
Sempre com o chamado para ajudar o próximo, na pandemia não foi diferente. Além de prestar apoio, auxílio e, claro, doar amor para as pessoas em situação de rua, o grupo se mobilizou para amparar quem mais precisava durante os períodos mais críticos da pandemia da Covid-19 em Manaus, que resultou na instalação do caos no sistema de saúde da capital, quando faltou oxigênio nos hospitais. Na época, as unidades estavam superlotadas após recordes de internações por Covid.
“Fizemos plantões, fazíamos comida de madrugada para levar para aos hospitais e para as pessoas em situação de rua. Fizemos ações para arrecadar itens de higiene e doar para a galera da rua. Em uma época muito fria e chuvosa, também fizemos entrega de cobertores. Doamos máscaras de proteção, uma costureira parceira fez várias de tecido para que pudéssemos distribuir para eles. Foi muito pesado ver pessoas nos hospitais chegando toda hora, pessoas morrendo na nossa frente. Também fizemos doações de insumos, medicamentos, compramos oxímetro, investimos em tudo isso para ajudar os hospitais e UBSs (Unidade Básica de Saúde). Fizemos transporte de oxigênio, a gente levava na casa das pessoas. Foi bem intenso, foram semanas muito difíceis. Até hoje, se eu falar muito, eu fico emocionada porque realmente não foi fácil”,
compartilhou.
Ação de Dia das Crianças
Prestes a realizar uma ação voltada ao Dia das Crianças, no domingo (16), Rhayssa pontua que uma das maiores dificuldades envolvem as doações e o apoio. Na ação, serão feitas gincanas, doação de brinquedos e palestras educativas para crianças no Lar da Dona Wal, que fica localizado no bairro Lírio do Vale, Zona Oeste de Manaus. O lar é uma iniciativa da Dona Valdiza, que transformou a sua residência em um abrigo para crianças abandonadas pelos pais.
“A gente tem enfrentado dificuldades para realizar ações, está muito mais difícil. A gente tem que se juntar entre os voluntários para conseguir dinheiro, mas nem todos tem as condições. Eu mesma não tenho tanto assim e já teve algumas vezes que eu tive que tirar do meu próprio bolso para tentar fazer uma ação e juntar com os outros voluntários. Por exemplo, agora a gente vai fazer essa ação de Dia das Crianças e até o momento não conseguimos nenhuma doação de brinquedos”, disse.
Rhayssa também ressalta que sentia uma certa “facilidade” de mobilização das pessoas para as ações durante a pandemia.
“Percebemos que na época da pandemia era muito mais fácil para uma pessoa se propor a ajudar. Fizemos algumas ações nesse período, a gente esteve presente na época dos respiradores. Ficamos uma semana com a galera acampando na minha casa, juntamos várias camas lá e todo mundo dormiu junto. Enfim, nessa época era muito mais fácil das pessoas fazerem doações. Hoje em dia a gente tem uma maior dificuldade. Então, que uma pessoa possa doar um brinquedo que a criança não usa mais, de um primo não está mais usando brinquedo”,
relatou Rhayssa.
Para quem desejar participar de alguma ação organizada pelo projeto “Amor na Rua”, ou quiser doar alguma quantia, ou os itens necessários (como doação de brinquedos), pode entrar em contato pelo número (92) 98546-2427 ou via pix: [email protected].
Leia mais:
Em Manaus, Casa Vhida apoia e cuida de crianças portadoras do HIV em risco social
Grupo promove o acolhimento de pacientes diagnosticados com HIV em Manaus
Em Manaus, Anjos de Rua oferece castração de baixo custo para cães e gatos
Para ficar por dentro de outras notícias e receber conteúdo exclusivo do portal EM TEMPO, acesse nosso canal no WhatsApp. Clique aqui e junte-se a nós! 🚀📱