Superar a insegurança alimentar exige não apenas retomar políticas públicas do passado, mas revisá-las diante do atual cenário do país, adaptando-as para responder aos desafios atuais. Outro ponto se refere a necessidade de enfrentar as necessárias mudanças estruturais como a realização da reforma agrária. A análise, publicada na revista “Cadernos de Saúde Pública”, é de pesquisadores da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), ligados a diversas universidades brasileiras.
O texto analisa a evolução da insegurança alimentar a partir de dados publicados pelos Inquéritos da Rede Penssan (I e II VIGISAN), lançados em 2020 e 2022, e a partir de estudos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, comparáveis por utilizarem a mesma metodologia. De 2013 a 2022, a taxa de brasileiros nesta situação mais que dobrou.
Estima-se que, atualmente, 33,1 milhões de brasileiros passam fome, ou seja, estão em situação de insegurança alimentar grave. De 2020 a 2021, houve um aumento de 72% na taxa de insegurança alimentar, que vai da insegurança alimentar leve, ou seja, a preocupação dos chefes da família de não conseguir obter alimentos até a insegurança alimentar grave, quando há ausência de alimentos no domicílio.
Os autores apontam que, para erradicar a fome, é preciso investir em políticas públicas de apoio à agricultura familiar, além de promover a reforma agrária, fortalecer as práticas agroecológicas e restringir o uso de agrotóxicos. De acordo com o último Censo Agropecuário do IBGE, a agricultura familiar é responsável por produzir 70% dos alimentos consumidos pela população brasileira.
“O Brasil é outro, não é o mesmo de 2013, quando saiu do chamado mapa da fome da FAO. Antes de alimentar o mundo, temos que alimentar bem os nossos”,
explica Veruska Prado, pesquisadora na Universidade Federal do Goiás (UFG) e da Rede PENSSAN e uma das autoras do artigo.
O artigo chama atenção para a velocidade com que os números de insegurança alimentar subiram ao longo dos anos, o que, segundo Prado, pode ser explicado pela sobreposição da negligência da última gestão do governo federal diante o direito humano a alimentação e a pandemia da Covid-19, com as crises política e econômica intensificadas no país a partir de 2016.
Desde 2016, políticas públicas de promoção à SAN foram enfraquecidas ou eliminadas, por meio de perda de orçamento. Um dos exemplos citados é o fechamento do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) em 2019.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), uma das únicas políticas de SAN que se mantiveram, não é reajustado desde 2017, levando a perda da qualidade da alimentação escolar dado o aumento dos custos dos alimentos. O valor repassado pelos programas de transferência de renda durante a pandemia desde julho de 2020 também foi insuficiente para evitar que a insegurança alimentar se agravasse no país, avaliam os cientistas.
*Com informações de assessoria
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