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Políticos

Projetos de Lei apresentados na Aleam ameaçam direitos da comunidade LGBTQIA+

Projetos aprovados pelos parlamentares tendem a prejudicar amazonenses da comunidade nas áreas da educação, saúde e no esporte

Manaus (AM) — Cresce o número de Projetos de Leis (PLs) apresentados na Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) que ameaçam direitos da comunidade LGBTQIA+. Entre 2023 e este ano, pelo menos seis propostas apresentadas na Casa contêm discursos preconceituosos que podem prejudicar membros da comunidade, principalmente, pessoas transsexuais.

Quatro desses projetos foram apresentados pela deputada Débora Menezes (PL) e outros dois pelos deputados Ednailson Rozenha (PMB) e Delegado Péricles (PL). Entre os projetos, dois foram aprovados e enfrentam ações no Supremo Tribunal Federal (STF); um aguarda a sanção do Governo do Estado, enquanto os outros estão sendo analisados pelas comissões da Aleam.

A mais recente proposta é de autoria da deputada Débora Menezes (PL-AM). O Projeto de Lei (PL) n° 372/2024 estabelece somente critérios biológicos para definição de gênero em concursos públicos no Amazonas. O PL tendem a prejudicar, principalmente, pessoas transsexuais e intersexuais.

Na justificava, a parlamentar aponta que o critério visa tornar testes físicos mais justos, levando em consideração as diferenças fisiológicas entre homens e mulheres que podem impactar o desempenho e consequentemente o resultado do certame.

A deputada estadual estabeleceu no texto que o sexo biológico é aquele que considera os cromossomos sexuais XX (feminino) e XY (masculino) presentes no material genético dos indivíduos. “Ao estabelecer essa medida, o Estado do Amazonas reforça seu compromisso com a transparência, a ética e a legalidade em seus concursos e processos seletivos, promovendo um ambiente mais justo e igualitário para seus candidatos”, propõe.

Em defesa do projeto, a parlamentar explicou que o projeto não vai interferir na prova teórica de nenhum concurso, permitindo ampla concorrência de forma isonômica. “Este projeto não proíbe trans de fazerem concurso ou dificulta sua entrada na administração pública, mas muda os critérios durante as provas físicas ou práticas, garantindo o princípio da isonomia quando as características físicas de cada gênero possam gerar desvantagens”, observou.

Comunidade LGBTQIA+

A definição presente no PL exclui outras combinações de cromossomos, hormônios e órgãos que podem levar uma pessoa a se considerada intersexual. Pessoas intersexuais nascem com características sexuais que não se encaixam nas noções binárias típicas de corpos masculinos ou femininos. Por conta disso, a comunidade LGBTQIA+ aponta que o processo de determinação e de diferenciação sexual é mais complexo do que a ideia de que o cromossomo XX define mulheres e o XY, homens.

O Brasil é o país onde mais se mata LGBTQIA+ no mundo. Em 2023, houve 155 mortes de pessoas trans, representando aumento de 10,7%, em relação a 2022. Conforme o levantamento feito pelo Observatório de Mortes e Violências LGBTI+ no Brasil, Manaus foi a cidade com maior número de homicídios de pessoas da comunidade LGBTQIA+ no país, em 2022, com 12 mortes violentas.

Outros projetos

Em março de 2023, o deputado estadual Ednailson Rozenha (PMB) apresentou o projeto de Lei 197/2023, para proibir publicidade que contenha alusão à orientação sexual, ideologia de gênero e a movimentos sobre diversidade sexual referente ou dirigida à infância e à adolescência no Amazonas. O parlamentar usou como justificativa a proteção das crianças do “autoritarismo ideológico” e da manipulação midiática e publicitária. A proposta, no entanto, foi retirada pelo próprio parlamentar após a repercussão negativa nas redes sociais.

Já o deputado estadual Delegado Péricles (PL) apresentou, em 2023, o projeto de Lei nº 6.469/2023, que proíbe  a participação de crianças e adolescentes em eventos relacionados à Parada do Orgulho LGBTQIAPN+. A proposta foi promulgada em outubro do ano passado. No entanto, ela enfrenta duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizadas no Supremo Tribunal Federal (STF).

A deputada Débora Menezes o PL n.º 609/2023, que fixa o sexo biológico como critério para competidores em partidas esportivas oficiais no Estado. Na prática, caso sancionado, o texto impede que mulheres trans participem de competições na categoria feminina. Da mesma forma, homens trans não podem participar de eventos esportivos na categoria masculina.

Ainda em 2023, a deputada do PL apresentou na Casa o projeto de Lei n.º 317/2023 que pretendia impedir o acesso de crianças e adolescentes trans a procedimentos médicos, como o uso de bloqueadores de puberdade e hormônios. Para além da rede pública de saúde, a proposta visava proibir o acesso também na rede privada. 

Débora Menezes também foi a autora da Lei n.º 6.463, que proibia o uso da chamada “Linguagem Neutra” no Amazonas. Aprovada e sancionada pelo Governo do Estado, a Lei pretendia “preservar os valores tradicionais da língua portuguesa”, mas foi suspensa pelo STF.

População LGBTQIA+

Conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2022, ao menos 60 mil pessoas adultas no Amazonas se declararam homossexuais os bissexuais. Mesmo assim, a pesquisadora Kely Guimarães aponta que algumas discussões nas Casas Legislativas no Amazonas demonstram que parlamentares nem sequer consideram a população LGBTQIA+ como cidadãos.

“Em tese, o Estado é laico, entretanto, muitas das discussões que ocorrem dentro das casas legislativas no Amazonas e pelo Brasil sequer consideram a população LGBTQIA+ como cidadãos que pagam seus impostos e, portanto, requerem o mesmo respeito e equidade que os demais. Vê-se que raramente políticos têm tal consciência e respeito, infelizmente, não conseguem separar concepções religiosas, que são suas escolhas pessoais, com condições e tipos diversos de vida e de família”, argumenta.

Para o pré-candidato a vereador de Manaus e professor da rede pública de saúde, Gabriel Mota (Rede Sustentabilidade), medidas como essas ainda ocorrem por parlamentares se utilizarem do moralismo e se associarem a grupos de igrejas para utilizar das lutas LGBT+ como inimigo.

“Isso acontece porque a grande maioria dos parlamentares eleitos nas casas legislativas são hipócritas e oportunistas, usam do moralismo e se associam a grupos de igrejas para usar nossas lutas como um inimigo que precisa ser combatido. Infelizmente, esse tipo de político usa a fé do outro e suas fragilidades para enganar quem mais precisa de ajuda do poder público e criam uma imagem da nossa comunidade distorcida para que, assim, se apresentem como combatentes do problema que criaram.”

“Então, ao invés de olhar para o preconceito que mata e exclui e pensar políticas públicas, eles colaboram com projetos de Lei que facilitam a morte e a exclusão de cidadãos e cidadãs LGBT+. Quem luta por meio ambiente, educação, saúde e segurança, por exemplo, somos nós, que devido ao preconceito somos cerceados desses direitos. Então se podemos lutar por nós, podemos lutar por todos”, completou.

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