Sim, caros cidadãos, neste período invernoso existe sim um emocionante, ou tétrico, rally amazônico, um rally também conhecido como BR-319, a rodovia que desafia não só a engenharia, mas a paciência e a fé do cidadão brasileiro. Um percurso onde a única certeza é a incerteza e a única placa confiável é a que diz “ATENÇÃO: ATOLADO”.
No dia 5 de março de 2025, pontualmente às 17h, um grupo de intrépidos viajantes partiu de Humaitá. O destino? Um mistério. A viagem? Uma epopeia. Seis quilômetros depois, caíram na dura realidade – e num atoleiro de respeito. Ali, sob o céu estrelado e o olhar atento dos mosquitos, passaram a noite, imersos na reflexão filosófica: seria a BR-319 um conceito abstrato ou um buraco concreto?
Às 10h da manhã seguinte, com a leveza de quem já perdeu a esperança, retomaram a jornada. Mas eis que surge um novo obstáculo. Carretas atravessadas, pista escorregadia, chuva fina dando aquele toque cinematográfico ao drama rodoviário.
“Não é que a estrada esteja tão ruim”, pondera um dos sobreviventes. “É que as carretas deslizam”. A estrada é ótima, o problema são os veículos que insistem em existir sobre ela.
Esquadrão de elite
Na linha de frente do resgate, um esquadrão de elite: Eucatur, Amatur e Expresso Transamazônica, que, em uma cena digna de superprodução de Hollywood, tentam remover uma carreta para que a humanidade possa seguir viagem. O cenário lembra um episódio de “Largados e Pelados”, só que sem a parte do pelados, até segunda ordem.
Por enquanto, a vida segue parada. Carro pequeno passa, mas é preciso coragem – e um seguro de vida atualizado. Quilômetros à frente, um novo atoleiro se apresenta, como quem diz: “Sejam bem-vindos ao inferno, espero que tenham trazido um lanche”.
A Ponte do Goiabal, coitada, já viu de tudo. Desde o viajante otimista que jura que “daqui a pouco melhora” até aquele que já pensa em se estabelecer ali mesmo e começar uma nova civilização.
As pontes… Que pontes?
Mas o grande espetáculo da BR-319 não para por aí! Eis que, no meio do nada, lembramos das pontes que um dia existiram, mas que, por um ato de mágica do DNIT, desmoronaram há dois anos e nunca mais foram vistas.
O órgão, sempre atento ao bem-estar do viajante, segue na sua estratégia inovadora de “esperar que as pontes se reconstruam sozinhas
Enquanto isso, o DNIT segue firme e forte… Nas promessas. Cada novo anúncio soa como um mantra: “A licitação sai mês que vem”. Mas qual mês? Qual ano? Qual realidade? Mistérios da burocracia nacional. Quem precisa de pontes quando se pode ter a adrenalina de atravessar rios de lama?
E a vida vai cumprindo o seu curso. Entre lama, chuva e (des)esperança, seguimos nessa rodovia que não é um trajeto, mas uma experiência insólita. A BR-319 não é uma estrada, é um teste de fé. Sobrevivê-la não é apenas chegar ao destino – é alcançar a iluminação, algo budista, pois sim. Na BR-319, a vida é cruel e atropela mais que carreta atolada.

¹Articulista do Portal Em Tempo, Juscelino Taketomi, é Jornalista. Há 28 anos é servidor da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam)
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