Com quase três décadas dedicadas à atuação pública e à defesa dos direitos da população amazonense, a procuradora-geral de Justiça do Ministério Público do Estado do Amazonas (MPAM), Leda Mara Nascimento Albuquerque, assume pela segunda vez o comando da instituição, após já ter exercido o cargo entre 2018 e 2020. Primeira mulher a ocupar o posto, Leda Mara traz uma trajetória marcada por pioneirismo, compromisso social e amplas contribuições no campo jurídico e acadêmico.
Nesta edição do Com a Palavra, Leda Mara fala sobre os desafios do Ministério Público diante das novas formas de criminalidade, os avanços na atuação institucional no interior do estado, a importância do uso responsável dos recursos públicos, a proteção de grupos vulneráveis e as prioridades para sua nova gestão.

Em Tempo – Ao longo de sua trajetória, a senhora ocupou diversos cargos no Ministério Público do Amazonas, incluindo uma passagem anterior como Procuradora-Geral de Justiça entre 2018 e 2020. Quais foram os principais desafios e aprendizados dessa experiência que traz para o seu atual mandato?
Procuradora-Geral Leda Mara – Minha primeira gestão foi extremamente emblemática do ponto de vista dos desafios, porque foi a gestão que lidou com a pandemia da Covid-19. Então, com certeza, isso acabou nos fortalecendo, a despeito daquele ter sido momento em que todos nós lutavamos para sobreviver, mas tudo isso acabou nos fortalecendo para enfrentar esse novo mandato, compreendendo a nossa instituição como a instituição que enfrenta não só os desafios de outrora, como a defesa da saúde, a defesa da educação, a defesa do meio ambiente, a salvaguarda dos direitos da população, dos direitos humanos, de parcelas ainda muito invisíveis para o Estado brasileiro, como a criança, o idoso, as pessoas em situação de rua, os deficientes e a mulher.
Além disso, hoje a nossa instituição lida com demandas que até então não se imaginava. Hoje, nós lidamos com demandas relativas à proteção de dados, a crimes cibernéticos, a proteção da comunidade LGBTQIAPN+, enfim, nós temos hoje desafios que impõem um Ministério Público cada vez mais fortalecido, consolidado do ponto de vista das suas atribuições das suas prerrogativas. Um MP em promotor de Justiça tem essa nítida noção da importância do nosso trabalho na defesa dessa parcela da população, ainda muito excluída. Eu quero sair desses dois anos não só concluindo o que pensei para a primeira gestão e que em razão da pandemia não foi possível realizar, mas quero sair dessa com a certeza de que nós atendemos esse múnus constitucional, que nos foi deferido pelo constituinte de 88 e que vem sendo acrescentado, vem sendo melhor assimilado e incorporado a tantas outras demandas pelo legislador ordinário.
ET – Considerando o avanço tecnológico e as novas formas de criminalidade, como o Ministério Público do Amazonas tem atualizado seus processos de investigação e apuração de denúncias para enfrentar esses desafios contemporâneos?
Procuradora-Geral Leda Mara – Sem dúvida, a tecnologia e os seus avanços acabaram impondo ao Ministério Público novos desafios, novas demandas. Hoje, nós não somos só o Ministério Público que precisa propiciar aos seus membros e servidores condições de trabalho, do ponto de vista tecnológico, que atenda, por exemplo, a compra, a aquisição de um computador. Hoje, o Ministério Público precisa ter inteligência artificial, precisa ter ferramentas de tecnologia capazes de aparelhar o GAECO, por exemplo, de modo a responder de forma satisfatória às demandas do combate à criminalidade organizada.
Hoje, o MP precisa propiciar aos seus membros e aos servidores inovação no sentido de buscarmos sistemas, ferramentas como softwares, programas e plataformas de tecnologia para otimizarmos a nossa atuação. Na área criminal, civil e de família, por exemplo, você tem hoje demandas relacionadas à elaboração de laudos, de perícias técnicas que devem ser, necessariamente, realizadas de modo a embasar promover um lastro probatório mínimo, para que o promotor consiga atuar e embasar os seus posicionamentos. Mas isso só é possível se nós tivermos esse aparato tecnológico.
Então, sem dúvida, é, sim, um enorme desafio. Percebemos, hoje, que o crime organizado, e quando eu me refiro ao crime organizado, eu não falo apenas do tráfico de drogas, refiro-me, também, aos criminosos que atuam na área de mineração, que atuam nas invasões de terras etc.. Isto nos impõe essa necessidade de nós buscarmos esse aparato tecnológico para nos mostrarmos, também, modernos, eficientes, resolutivos em nossa atuação.
ET – Nos últimos anos, observa-se uma crescente conscientização das gestões públicas em relação ao uso responsável dos recursos públicos. Na sua percepção, quais fatores têm contribuído para essa mudança e qual o papel do Ministério Público nesse contexto?
Procuradora-Geral Leda Mara – O MP foi nos últimos anos, a partir da Constituição de 88, foi a instituição que mais trabalhou no sentido de promover essa conscientização relativa à gestão pública e ao uso responsável dos recursos públicos. O Ministério Público faz um trabalho, não só na seara punitiva, por meio da atuação dos nossos promotores de Justiça que trabalham nas promotorias de patrimônio público, nas promotorias criminais, no próprio GAECO, mas é, também, um Ministério Público que trabalha para orientar e promover essa conscientização do gestor público acerca do uso dos recursos nas áreas afetas aos interesses, às expectativas da população amazonense.
Então, eu penso que essa nova forma de atuação do Ministério Público nos leva, muitas vezes, a nos reunirmos com gestores, como já aconteceu nesses nossos cinco meses de gestão. Nós já fizemos uma reunião por ocasião da vinda do corregedor nacional do MP para uma correção temática. Na ocasião, reunimos representantes, dentre prefeitos, vice-prefeitos, representantes das prefeituras de 53 municípios, onde nós fizemos esse trabalho de orientação, uma vez que muitos deles estava no primeiro mandato.
Muitas vezes, a gente se depara com demandas relativas ao uso indevido dos recursos públicos, mas isso nem sempre se dá por dolo, se dá, muitas vezes, por falta de consciência, por falta de orientação do gestor público. Então, o MP cumpre esse papel de orientador, atuando de forma preventiva em muitas dessas demandas.
ET – O interior do Amazonas possui particularidades que demandam atenção especial. Quais iniciativas têm sido implementadas para aprimorar a atuação do Ministério Público nas regiões mais remotas do Estado?
Procuradora-Geral Leda Mara – Falar do Amazonas enquanto área de atuação do Ministério Público é falar de uma região extremamente difícil. Não à toa, nós temos as comarcas de difícil acesso, temos comarcas onde até bem pouco tempo nós não tínhamos internet, exatamente porque lá a internet não chegava, por questões técnicas, unicamente técnicas. Havia uma boa vontade por parte do Ministério Público de levar esses serviços. E, lamentavelmente, por questões técnicas, isso não era possível.
Hoje, nós conseguimos levar a todos os municípios onde o Ministério Público está, no interior do Amazonas, uma internet de qualidade, que nos permite acessar os sistemas com os quais nós trabalhamos. Esse também ainda é um problema: Nós trabalhamos com três, quatro sistemas no interior para possamos, com isso, atuar na área eleitoral, atuar na execução penal, atuar nos processos judiciais e atuar nos processos administrativos e extrajudiciais.
Então, não é fácil conjugar todas essas demandas com os interesses e as expectativas da classe, da sociedade, com a questão financeira, orçamentária e financeira da instituição, porque nós estamos falando de tecnologia, e toda e qualquer ferramenta tecnológica, via de regra, tem um custo muito alto, mas nós estamos conseguindo vencer todas essas dificuldades, estamos trabalhando, também, para otimizar os nossos sistemas no interior, tentando, ao máximo, buscar uma uniformização desses sistemas para que possamos trabalhar todas as nossas demandas através de uma única ferramenta. Isso também se dá em relação a Manaus.
Aqui na capital nós estamos buscando, por exemplo, um sistema de automação judiciária, um sistema de fluxo de processos que atenda à expectativa do colega, do servidor, mas que, também, atenda às condições orçamentárias e financeiras da instituição. Não é simples, não é fácil, mas nós estamos trabalhando nesse desiderato.
ET – A realização de concursos públicos é fundamental para fortalecer as instituições. Há previsão para novos concursos no Ministério Público do Amazonas visando suprir demandas, especialmente no interior do estado? Se sim, quais áreas serão contempladas?
Procuradora-Geral Leda Mara – Nos últimos anos, o MP realizou dois concursos públicos importantes, um para membros, onde foram aprovados mais de 80 candidatos. Na verdade, nós temos hoje, já desses candidatos aprovados, nós temos já 25 nomeados e empossados. A expectativa é chamarmos mais, até dezembro, mais dez novos colegas. A ideia é, nesse primeiro semestre, nomearmos cinco novos e no outro semestre mais cinco colegas, como uma forma de atender as nossas necessidades institucionais no interior.
Em relação aos servidores, nós também tivemos um concurso, como eu já disse. Do concurso de servidores, nós temos poucos para preencher as vagas oferecidas. A ideia também é nesse primeiro semestre já nomearmos cinco novos servidores e no outro semestre mais cinco.
Não há previsão no momento para novos concursos, a ideia é que, no ano que vem, deflagremos um concurso para assessores, mas é algo que ainda está planejamento e vai depender muito, evidentemente, da nossa receita. Nós trabalhamos com duodécimo, esse duodécimo é o recurso que se tem para o atendimento de todas as demandas do Ministério Público, inclusive folha de pagamento.
ET – Com base nos dados mais recentes, houve um aumento significativo nas denúncias recebidas pelo MP? Quais são as principais áreas que concentram essas ocorrências e como a instituição tem lidado com esse volume?
Procuradora-Geral Leda Mara – O Ministério Público abarca uma série de áreas, onde ele tem uma atuação muito presente, muito evidente. Eu me refiro à área criminal, à família, a registros públicos, a patrimônio público, consumidor, idoso e deficiente, saúde, educação e meio ambiente etc.Então, em todas essas frentes, o Ministério Público tem atuação. Evidentemente que muitas dessas demandas entram judicialmente para que os colegas com atuação nessas frentes possam exercer o seu Ministério, mas há também, hoje, uma novidade no campo dessa recepção de demandas, que é a Ouvidoria.
A ouvidoria hoje é a porta de entrada do Ministério Público. Então, por esse setor, através dos canais de comunicação, há uma grande absorção de demandas. O MP recepciona demandas das mais diversas ordens, inclusive violência de gênero, violência contra a comunidade LGBTQIAPN+, além de demandas relativas também à malversação de dinheiro público, enfim, ações que atentam contra a probidade administrativa.
Mas eu diria que até pelos gargalos que a segurança pública ainda enfrenta, eu penso que hoje a área criminal abarca muita coisa. E quando eu falo em área criminal, eu estou falando de crimes de gênero, entorpecentes, crimes variados, como furto, roubo e estupro. Essa área abarca uma quantidade de demandas muito grandes.
Nós temos também infância e juventude, onde nós temos uma atuação cível, mas temos também uma atuação criminal. Cresceu muito no Estado o número de violência contra crianças e adolescentes. E evidentemente que essas são demandas que nos chegam e que merecem uma atuação mais célere, mais resolutiva, mais eficiente por parte dos colegas.
ET – Quais são os crimes mais recorrentes no Amazonas que têm sido alvo de investigações do Ministério Público? Há alguma preocupação específica com crimes ambientais, corrupção ou violência contra grupos vulneráveis?
Procuradora-Geral Leda Mara – A nossa região também, ela importa, ela remete a um número de ações delituosas contra o meio ambiente. Sem dúvida, essa demanda também é uma demanda que tem nos preocupado muito. Nós vamos iniciar aí, a partir do segundo semestre, um período de seca.
Há uma expectativa muito grande de que será uma seca muito forte no nosso estado, um período de seca muito forte no estado, assim como a cheia também vem preocupando. Então, essas intempéries, essas eventos naturais, essas situações que decorrem das mudanças climáticas acabam também gerando demanda em um grau muito volumoso que chega ao Ministério Público e, lamentavelmente, nós estamos nos aparelhando ainda para recepcionar algumas dessas demandas que, pela sua natureza, remetem à aquisição de equipamentos, de georreferenciamento, de perícias, de acompanhamento, de monitoramento de queimadas, de devastação aqui na área urbana e na área rural do nosso estado.
Então essa ainda uma das maiores preocupações nossas que exatamente atender a essas demandas observando o caráter qualitativo do atendimento dessa demanda. Então, para isso, nós precisamos de um aparato tecnológico, de um aparato técnico, que o Ministério Público hoje tem, mas não tem na medida e na proporção necessária. Isso se dá também em relação aos problemas que alcançam os grupos vulneráveis e aí eu quero me ater mais a criança ou adolescente. Lamentavelmente hoje nós temos uma política ainda muito ineficiente voltada para essa frente.
Nós precisamos aprimorar, fortalecer a rede de proteção à criança ou adolescente, aprimorar as instituições que trabalham nessa frente, trabalhar muito essa questão da violência intrafamiliar. Uma criança que vem de um ambiente desagregado, de um ambiente onde impera a violência contra a mãe, contra as crianças, enfim, contra membros daquele núcleo familiar, ela com certeza será uma criança a reproduzir essas condutas. Isso também precisa ser trabalhado. é uma preocupação dos nossos colegas que trabalham na área da infância e juventude, que trabalham também na área da educação e na área da família.
ET – Além da atuação na área criminal, o Ministério Público desempenha um papel essencial em diversas frentes. Poderia destacar algumas das principais áreas de atuação da instituição e a relevância delas para a sociedade?
Procuradora-Geral Leda Mara – A nossa região também, remete a um número de ações delituosas contra o meio ambiente. Sem dúvida, essa demanda é uma demanda que tem nos preocupado muito. Nós vamos iniciar aí, a partir do segundo semestre, um período de seca. Há uma expectativa muito grande de que será uma seca muito forte no nosso Estado, assim como a cheia também vem preocupando.
Então, essas intempéries, essas situações que decorrem das mudanças climáticas acabam também gerando demanda em um grau muito volumoso que chega ao Ministério Público e, lamentavelmente, nós estamos nos aparelhando para recepcionar algumas dessas demandas que, pela sua natureza, remetem à aquisição de equipamentos, de georreferenciamento, de perícias, de acompanhamento, de monitoramento de queimadas, de devastação aqui na área urbana e na área rural.
Essa ainda uma das maiores preocupações nossas que exatamente atender a essas demandas, observando o caráter qualitativo do atendimento dessa demanda. Então, para isso, nós precisamos de um aparato tecnológico, de um aparato técnico, que o Ministério Público hoje tem, mas não tem na medida e na proporção necessária. Isso se dá também em relação aos problemas que alcançam os grupos vulneráveis, e aí eu quero me ater mais a criança ou adolescente. Lamentavelmente, hoje nós temos uma política ainda muito ineficiente voltada para essa frente.
Nós precisamos aprimorar, fortalecer a rede de proteção à criança ou adolescente, aprimorar as instituições que trabalham nessa frente. trabalhar muito essa questão da violência intrafamiliar. Uma criança que vem de um ambiente desagregado, de um ambiente onde impera a violência contra a mãe, contra as crianças, enfim, contra membros daquele núcleo familiar, ela com certeza será uma criança a reproduzir essas condutas. Isso também precisa ser trabalhado.
É uma preocupação dos nossos colegas que trabalham na área da infância e juventude, que trabalham também na área da educação e na área da família. O MP está evoluindo e se aperfeiçoando para servir mais e melhor a sociedade.
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