Neste sábado, 9 de agosto, das 12h às 17h, o Parque Linear Bruno Covas, em São Paulo, recebe a exposição Águas Abertas. Com entrada gratuita, a mostra ficará em cartaz até 9 de novembro de 2025.
Além disso, o projeto ocupa 8 km da margem oeste do Rio Pinheiros com intervenções artísticas criadas especialmente para o local. A iniciativa conta com patrocínio da Sabesp, por meio da Lei Rouanet, e realização do Ministério da Cultura em parceria com o Governo Federal.
Ritual afroindígena
Entre os destaques da mostra, a obra Confluência dos Olhos D’Água, da artista manauara Keila-Sankofa, se destaca por propor um ritual afroindígena em forma de performance, fotografia e cinema.
Criada em colaboração com o povo Pankararu, que vive há mais de 80 anos nas imediações do Rio Pinheiros, a obra conecta saberes indígenas e afrodiaspóricos por meio da cuia (ou cabaça), elemento simbólico comum a ambas as culturas.
“Com esta obra, não busco apenas analisar o mundo e transformá-lo. Estou projetando uma nova terra para os meus. E, desta vez, essa realização só foi possível graças ao povo Pankararu que resiste há tantas décadas”, afirma Keila.
“Quando não há diálogo, é porque falta conhecimento. Por isso, fui atrás de quem conhece esse rio há muito tempo: os Pankararu”, completa.
A performance Cabeça de Cabaças leva o público a uma imersão sensorial com sons, imagens e movimentos. A cabaça surge como símbolo central, evocando útero, tambor e recipiente de sementes.
Desse modo, o objeto ganha novo significado ao ser usado como ponte entre culturas.
“A cabaça conecta povos diferentes entre si. Ela está presente em instrumentos musicais, em utensílios domésticos e nos rituais. É uma forma de manter viva a diversidade dos povos indígenas e das culturas negras”, explica Keila.
Para ela, o respeito é fundamental em todo o processo criativo:
“Meus movimentos são sempre feitos com muito respeito. O processo, para mim, é tão importante quanto o resultado”.
Segundo Keila, seu trabalho questiona a forma como cidades como São Paulo tentam controlar a natureza e padronizar a cultura. Por isso, suas obras buscam romper com essa lógica.
“São Paulo sonha em modular a natureza e descaracterizar a cultura para transformá-la em padrão lucrativo. Meu processo desconfigura essa lógica”, explica.
Além disso, ela chama atenção para a complexidade do próprio Rio Pinheiros:
“O que atualmente chamamos de Rio Pinheiros é apenas uma parte dessas águas. O rio está como lençol e como nascente, o rio é as águas vivas que estão sob nossos pés”.
A curadoria da exposição valoriza principalmente o trabalho de mulheres artistas. Assim, rompe com a tradição da arte pública monumental, marcada por produções masculinas.
A obra de Keila tem curadoria da arquiteta Gabriela de Matos e do pesquisador Raphael Bento, que propõem um olhar descolonizador sobre território, espiritualidade e natureza.
Caminho da artista
Natural de Manaus, Keila-Sankofa é artista visual e cineasta. Sua produção busca reconstruir narrativas silenciadas de populações afroindígenas. Para isso, ela utiliza fotografia, videoperformance e cinema como instrumentos de resistência.

Além disso, Keila já foi indicada ao Prêmio PIPA em 2021, 2023 e 2024. Participou também do programa A Diáspora Africana Lá e Aqui, realizado pela Universidade de Stanford (EUA) e o Instituto Sacatar (BA).
Ela integrou ainda diversas exposições e festivais nacionais e internacionais, como:
- 40º Arte Pará
- Um Século de Agora (Itaú Cultural)
- MUTEK (Argentina e Montreal)
- International Film Festival Rotterdam (Holanda)
- Festival Solar (Suíça)
- CCSP – Centro Cultural São Paulo
“Reconheço as encruzilhadas das cidades, das telas e dos espaços expositivos como territórios aptos para receberem narrativas para novos mundos”, afirma.
Além de Keila-Sankofa, a exposição apresenta obras dos Coletivos Coletores, Day Rodrigues e Lúcio Ventania. Eles criaram uma barricada com blocos cerâmicos no parque, que pode ser desmontada e reaproveitada por moradores do Jardim Panorama, comunidade vizinha a um condomínio de luxo.
Por fim, essa ação propõe um gesto simbólico e prático de reconexão entre arte, território e necessidades sociais reais.
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