Em meio à crescente crise alimentar na Faixa de Gaza, o governo de Israel autorizou o lançamento aéreo de alimentos por parte de diversos países. Na última segunda-feira (4), aeronaves dos Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Egito, Alemanha, Bélgica e Canadá lançaram 120 fardos de suprimentos sobre o território palestino, conforme informado pelas Forças de Defesa de Israel (FDI).
Na sequência, Israel anunciou a autorização parcial da entrada de mercadorias comerciais em Gaza, por meio de fornecedores locais, numa tentativa de reduzir a dependência de ajuda internacional.
Apesar disso, moradores e organizações humanitárias alertam que a quantidade de alimentos que chega ao enclave – seja por via aérea ou terrestre – não é suficiente para conter a fome generalizada e não alcança toda a população de maneira justa.
Segundo Philippe Lazzarini, comissário-geral da Agência da ONU para Refugiados Palestinos (UNRWA), os lançamentos aéreos são muito menos eficientes que os caminhões terrestres: “Lançamentos aéreos custam pelo menos 100 vezes mais. Um caminhão carrega o dobro do que um avião”.
População enfrenta dificuldades para acessar os suprimentos
Autoridades palestinas e da ONU estimam que Gaza necessita de cerca de 600 caminhões de ajuda diariamente para atender às demandas humanitárias básicas.
Contudo, segundo relatos de moradores, como Diaa al-Asaad, pai de seis filhos, a distribuição da ajuda se tornou uma questão de sobrevivência e força: “O que cai do céu só chega a quem consegue brigar com os outros”. Al-Asaad destaca que muitos pacotes são lançados em áreas controladas militarmente por Israel, conhecidas como “zonas vermelhas”, de difícil acesso.
Para Majed Ziad, morador do campo de refugiados de Nuseirat, a solução não é jogar comida do ar. Ele critica: “As pessoas precisam de acesso digno à alimentação — não como animais correndo atrás de presa na selva”.
Na última semana, o Exército israelense anunciou pausas táticas e a abertura de corredores humanitários em três áreas do território para permitir a passagem de ajuda por terra.
Ajuda terrestre enfrenta obstáculos
De acordo com o Escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), os comboios terrestres sofrem com longas demoras e situações perigosas. Em um caso recente, um comboio levou 18 horas para percorrer apenas 24 km dentro de Gaza.
Além disso, muitos caminhões não chegam ao destino final, devido a saques realizados por civis desesperados ou por grupos que atuam no mercado ilegal. Israel responsabiliza o grupo Hamas pelos desvios e justificou a suspensão temporária da ajuda em março com base nessas ocorrências.
Preços de alimentos disparam e população segue sem acesso
A escassez agravou ainda mais os preços. Dalia al-Affifi, mãe de dois filhos, afirma que os valores de itens básicos, como farinha, chegaram a R$ 170 o quilo, fora do alcance da maioria das famílias. “Não consegui farinha. Só algumas latas de feijão e grão-de-bico. Eu só preciso de comida”, relatou.
Ela também diz ter medo de enviar familiares em busca dos caminhões, por conta da disputa violenta que se forma em torno da distribuição.
Situação alimentar se aproxima da catástrofe
Mais de 2 milhões de pessoas vivem atualmente em Gaza, onde a produção agrícola e de alimentos foi quase totalmente destruída pelos bombardeios israelenses. A Classificação Integrada de Fases da Segurança Alimentar (IPC), ligada à ONU, alerta que o pior cenário de fome está se tornando realidade no território.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) também relatou um aumento alarmante nas mortes de crianças por desnutrição no mês passado.
Israel nega responsabilidade, mas sofre pressão internacional
Após bloqueios impostos em março, Israel retomou parcialmente o envio de ajuda em maio, transferindo a responsabilidade da distribuição para pontos coordenados pela Fundação Humanitária de Gaza (GHF), apoiada por Estados Unidos e Israel. No entanto, essas entregas têm sido marcadas por tumultos e episódios de violência, com centenas de mortes registradas, segundo autoridades de Gaza ligadas ao Hamas.
Apesar das denúncias e imagens que circulam, o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu nega a existência de fome generalizada em Gaza e rejeita as acusações de que o governo esteja provocando intencionalmente a crise.
Ajuda por terra é considerada a única solução viável
Organizações humanitárias alertam que os lançamentos aéreos devem ser usados apenas em situações extremas, por serem ineficientes e de alto custo.
Durante visita recente à região, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Johann Wadephul, defendeu a abertura de novas rotas terrestres para a entrada de ajuda: “O governo israelense tem o dever de permitir rapidamente a passagem segura de ajuda humanitária e médica em quantidade suficiente, para evitar mortes em massa por fome”.
Desde o início da guerra, em outubro de 2023, autoridades de saúde controladas pelo Hamas relatam mais de 60 mil mortos em Gaza — a maioria mulheres e crianças —, com muitos corpos ainda soterrados nos escombros.
(*) Com informações do Metrópoles
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