A Defensoria Pública do Amazonas (DPE-AM) solicitou ao presidente Lula o perdão da pena de uma indígena da etnia Kokama, por meio de um pedido de indulto humanitário. A mulher, condenada por participação em um homicídio em Manaus em 2018, foi vítima de estupros cometidos por policiais militares e um guarda municipal enquanto estava presa na delegacia de Santo Antônio do Içá (AM).
Atualmente, ela cumpre medida em regime de semiliberdade, autorizada pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM). A decisão permite que a indígena permaneça em um abrigo para mulheres vítimas de violência sexual, com saídas supervisionadas para cuidados médicos, psicológicos e outras necessidades básicas.
Durante mais de nove meses de prisão na delegacia, ela sofreu tortura, estupros e foi forçada a trabalhar em condições degradantes. Na cela mista onde ficou com o filho recém-nascido, ela esteve exposta a violência constante.
Segundo a Defensoria, os abusos provocaram danos físicos e psicológicos graves, incluindo transtorno de estresse pós-traumático e a necessidade de cirurgia por complicações de saúde.
O pedido de indulto se baseia na violação dos direitos básicos de pessoas privadas de liberdade. O documento foi assinado pelo Defensor Público Geral, Rafael Barbosa, e pelo defensor Theo Costa, coordenador do Núcleo de Atendimento Prisional (NAP).
“Os crimes hediondos cometidos pelo Estado contra essa mulher indígena anularam não apenas o poder moral de punir, mas também o legal. Nem mil anos de prisão causariam tanto sofrimento quanto os nove meses que ela passou naquela delegacia”, afirmam os defensores.
A indígena já cumpriu mais de cinco anos de pena. A Defensoria argumenta que os abusos superaram em muito a condenação original. O Ministério dos Povos Indígenas acompanha o caso e deve emitir parecer.
Investigações confirmam os abusos
O Ministério Público do Amazonas denunciou cinco policiais militares e um guarda municipal pelos crimes. Laudos periciais confirmaram os relatos de violência sexual e agressões físicas. A Justiça também reconheceu que a delegacia não tinha estrutura adequada para mulheres. A transferência da indígena para Manaus só ocorreu quase dez meses após a prisão, mesmo após reiterados pedidos da Defensoria.
A prisão aconteceu em 11 de novembro de 2022, quando a mulher procurou a delegacia para denunciar o companheiro por violência doméstica. No local, os policiais identificaram um mandado de prisão em aberto pela condenação de 2018. Ela foi presa sem audiência de custódia e sem comunicação à Defensoria, em violação a garantias legais.
Sem cela feminina disponível, os agentes a colocaram junto a homens presos. A partir daí, os abusos começaram. Ela foi estuprada repetidamente, mesmo com o bebê ao lado, em diversos espaços da delegacia — como a cela, a cozinha e a sala de armas.
A denúncia só foi formalizada em 27 de agosto de 2023, após a transferência da vítima para a unidade prisional feminina de Manaus. Desde então, a Defensoria acompanha o caso e pleiteia prisão domiciliar.
Agentes são investigados
Cinco policiais militares estão presos, e um guarda municipal permanece foragido. Veja os envolvidos:
- Tabatinga: Soldado Nestor Martin Ruiz Reátegui e Luiz Castro Rodrigues Júnior
- Manaus: 1º Sargento Osiel Freitas da Silva
- Santo Antônio do Içá: Cabo Claudemberg Lofiego Cacau e o Guarda Municipal Maurício Faba Nunes
Eles respondem por crimes como estupro de vulnerável, estupro qualificado e tortura, praticados durante o período em que a indígena esteve detida em condições sub-humanas.
Leia mais
MP denuncia à Justiça PMs por estupro coletivo de indígena em delegacia no AM
