Há um crescente e urgente movimento de transformação econômica nos estados que compõem a Amazônia Legal, onde a bioeconomia emerge como protagonista de uma revolução sustentável. Em um contexto onde a preservação ambiental é tão crucial quanto o desenvolvimento econômico, essa alternativa surge como uma resposta inovadora, buscando conciliar crescimento e conservação.
As soluções disruptivas de uma economia mais sustentável conseguem transcender o impacto econômico no mercado, sendo possível gerar desenvolvimento de cerca de 750 mil famílias de comunidades tradicionais, que possuem relação de subsistência com a natureza, de acordo com estudo um estudo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Embrapa e outras instituições, a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Neste levantamento, o Embrapa conceitua a bioeconomia como em um tipo de economia que se desenvolve a partir dos princípios da sustentabilidade, objetivando a utilização de recursos da biodiversidade alinhados aos conhecimentos tecnológicos e tradicionais.
Compreender as realidades amazônicas enriquece a discussão sobre a Amazônia. A economista Denise Kassama apontou que a bioeconomia permite que exista uma maneira de respeitar os limites das florestas e adaptar as produções, para torná-las sustentáveis.
“O que as pessoas que discutem no redor do mundo sobre Amazônia é que o caboclo e o ribeirinho precisam sobreviver, mas é muito fácil falar em preservação sem levar em consideração toda uma população que precisa tirar o seu sustento. Mas sim, tem espaço para isso, acredito que se abre um mercado global sobre esses produtos sustentáveis e a bioeconomia”,
explicou.
Entretanto, Kassama destacou que um grande impasse para o estabelecimento desse modelo de economia relaciona-se às questões logísticas, devido à complexidade dos locais geográficos. A partir de políticas públicas e incentivo do poder público, a bioeconomia pode abrir oportunidade para setores de agricultura familiar, cooperativas de extração e manejo de itens amazônicos, como algumas espécies de peixes, artesanato, biocombustível e outras formas.
A inclusão neste cenário é fundamental para o êxito do desenvolvimento alinhado a diretrizes sustentáveis. O gerente de inovação e Bioeconomia do Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas (IDESAM) com foco na política pública Programa Prioritário de Bioeconomia (PPBio), Paulo Simonetti, a bioeconomia abre espaço para que comunidades responsáveis por manter a floresta em pé.
“À medida que essas comunidades, dentro do território, conseguem ter essa inclusão produtiva, por meio de suas associações ou cooperativas, conseguem gerar renda maior e ter seu trabalho reconhecido. Essa cadeia também gera oportunidades no entorno do território como transporte, circulação de dinheiro nos municípios a partir do acesso a bens e serviços que esses trabalhadores passam a ter”,
esclareceu.
O Idesam recebeu o reconhecimento com o prêmio de melhor Organização Não Governamental (ONG) do segmento de Meio Ambiente de 2023. A instituição possui iniciativas para contribuir e promover o desenvolvimento da bioeconomia local, a partir de projetos voltados para a captação das comunidades, estruturação do processo produtivo, assim como realiza a articulação política de maneira com que o desenvolvimento siga as diretrizes governamentais.
Com o olhar atento para as potencialidades locais, empreendedores, pesquisadores e organizações não governamentais unem forças para explorar alternativas que não apenas impulsionam a economia regional, mas também preservem os tesouros naturais únicos da região.
Os microempreendedores encontram no uso sustentável de recursos um mecanismo que interliga o respeito ao meio ambiente à fonte de renda. Em alguns casos esse cuidado é passado de geração em geração, como é o caso do professor de história e artesão paraense, Marcos Camargo, fundador do Ateliê Camargo. Filho, sobrinho e neto de artistas, ele cresceu em meio a arte.
“A minha família é composta por artistas, pintores, músicos e escritores na cidade de Santarém, uma das características fortes da família é a pintura nas cuias, que, inclusive, por conta desse trabalho que as cuias pintadas de Santarém, em 2009, foram elevadas à categoria de patrimônio cultural de natureza imaterial do Estado do Pará”,
contou.
Natural de Santarém, no Pará, o artesão participou do edital Microprojetos da Amazônia Legal, quando foi premiado com o projeto Ararinhas de Santarém, ao realizar o fomento da pintura de cuias, camisas e telas para jovens de baixa renda. A ênfase na cultura amazônica também fez parte do catálogo internacional Manaus Feito à Mão, com pinturas e artesanato.
O Ateliê Camargo foi fundado em 2020, nomeado em homenagem ao pai de Marcos, o professor Benjamim Camargo. Com o passar dos anos, a iniciativa segue com a tradição familiar ao integrar familiares na equipe de artesãos.
“Hoje vendemos para todos os estados e nossa produção é 100% artesanal, própria e familiar, e que visa tratar a preservação da floresta e natureza, de fazer o fomento da bioeconomia na Amazônia mais sustentável”,
ressaltou.
Para o microempreendedor, a bioeconomia não-industrial com ênfase na economia criativa e familiar é uma opção para contribuir com a preservação da floresta, reverberando o cuidado para o ecossistema, incluindo a fauna, flora e também os moradores, que estão ativamente cuidando do meio ambiente. Apesar do seu papel fundamental, essas pessoas ficam invisíveis para a mídia e para as políticas públicas.
Entre os desafios encontrados para continuar nesse segmento, Marcos Camargo define que além do artesanato também são necessárias adaptações em multifunções, como gerenciar as redes sociais e capacitar para as vendas. Além disso, há décadas, a venda dos produtos possibilitava a compra de alimentos, mas, atualmente, com um mundo cada vez mais globalização e digital, houve a urgência de também transformar o modo de produção.
“Com a expansão dos meios de comunicação e a globalização, conseguimos expandir o nosso trabalho, e, hoje, podemos enviar para fora do país, então precisamos nos adequar. Ainda é um desafio porque nossa produção é toda familiar, não temos indústria”,
disse.
A valorização da arte por parte do poder público também se configura como um desafio. “Não estamos vendendo um produto, e sim, uma história. É algo feito por artistas da nossa região”, declarou.
O material utilizado pelo Ateliê prioriza a maneira em que ocorre a captação da matéria-prima. Marcos explica que busca adquirir os itens em associações que possuem autorização dos órgãos de controle, em comunidades originárias e ribeirinhas, propondo o fortalecimento da economia local. Além de haver o alerta para o período de defeso, em que algumas espécies de peixes não podem ser vendidas.
O equilíbrio entre a demanda por crescimento econômico e a preservação da biodiversidade amazônica exige abordagens cuidadosamente planejadas. Questões socioambientais, direitos das comunidades locais e a busca por tecnologias sustentáveis são parte integrante dessa narrativa em constante evolução.
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