Manaus (AM) – A juíza Jaiza Fraxe, realizou no início do mês de março a primeira inspeção judicial nas proximidades da Aldeia Soares, uma das comunidades próximas à jazidas de potássio. Na área onde vive o povo de etnia Mura, havia sido instalada uma mina de exploração do mineral. As atividades de exploração estavam paralisadas desde 2017.
De acordo com informações disponibilizadas pelo Ministério Público Federal no Amazonas (MPF -AM), o órgão conseguiu um acordo na Justiça para garantir aos povos indígenas o direito de participar de consulta livre e informada sobre a realização de estudos para exploração de minérios.
O MPF/AM passou a acompanhar o caso depois de receber informações de que a empresa Potássio do Brasil Ltda. começou a realizar estudos e procedimentos na região sem qualquer consulta às comunidades.
Em caso de descumprimento da ordem, há a previsão de multa, com cerca de R $50 mil por situação identificada. O acordo foi assinado com o Cacique Mura, representantes do MPF/AM, da Funai, da empresa Potássio do Brasil Ltda., do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam) e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Uma das justificativas para a paralisação da área de exploração, é de que durante a apuração foi constatado que estavam sendo realizadas pesquisas de campo, autorizadas pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), sem que fossem consultadas as comunidades atingidas.
O ato, vai contra a Convenção nº 169 da Conferência Internacional do Trabalho. O documento prevê avanços no que diz respeito às condições de vida e trabalho da população indígena brasileira. Os artigos 15 e 16 estabelecem o direito de consulta e participação dos povos indígenas para uso, gestão e conservação de seus territórios.
O município de Autazes foi reconhecido pelo Ministério da Agricultura como uma área com grande potencial de produção de fertilizantes. O Governo Federal, colocou que o mineral presente na área, deve suprir cerca de 25% da necessidade do país. A ex ministra da Agricultura, Tereza Cristina chegou a declarar que
“Era o que o governo pensava que deveríamos ter para que o Brasil, uma potência agroalimentar, tivesse um plano de pelo menos 50% ou 60% de produção própria de seus fertilizantes”, afirmou.
O potássio presente na área é a matéria prima principal utilizada na produção de fertilizantes. O Brasil ocupa a 4ª posição mundial com cerca de 8% do consumo global de fertilizantes e estima-se que 85% dos insumos sejam importados do mercado exterior.
Busca pelo potássio
A busca pela produção em território nacional de fertilizantes, provenientes de minerais do território, acentuou-se durante o conflito entre Rússia e Ucrânia, tendo em vista que o país depende dos insumos provenientes da Rússia.
Na primeira semana de março, a mineradora Potássio Brasil, que é administrada pelo banco canadense Forbes & Manhattan, se encontrou com o presidente Jair Bolsonaro, a fim de buscar apoio para destravar a mina de potássio do território Amazônico. Anteriormente, a empresa teve encontro com a ex-ministra Tereza Cristina, em Ottawa (Canadá), a fim de negociar o fornecimento de mais potássio para o país.
De acordo com dados disponibilizados no site do Governo do Amazonas, as jazidas descobertas até agora pela Potássio do Brasil na Bacia do Amazonas estão situadas em profundidades que variam de 680 a 1.000 metros e apresentam teores médios de 33 a 40% de cloreto de potássio (KCl). No depósito de Autazes, as reservas geológicas já são superiores a 600 milhões de toneladas.
Segundo o órgão, a principal vantagem é o desenvolvimento e melhorias nas rotas de exportação na Região Norte, as quais irão representar custos significativamente mais baixos para aquisição e transporte do potássio para os centros consumidores da região, que devem utilizar pelo menos 50% do que está sendo previsto para o consumo nacional.
Visando dar acesso à exploração de áreas protegidas, o presidente Bolsonaro, assinou o projeto de Lei 191/20, o qual teve o seu caráter de urgência para votação aprovado pela Câmara em março deste ano. O PL estabelece condições específicas para a realização de pesquisa e lavra de recursos naturais para aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas e institui a indenização pela restrição do usufruto de terras indígenas.
O projeto de autoria do Poder Executivo foi assinado por Sérgio Moro (Podemos), enquanto era ministro de Justiça no governo de Jair Messias Bolsonaro (PL). O projeto, que foi enviado por Bolsonaro em fevereiro de 2020, voltou ao foco após o conflito entre Rússia e Ucrânia e deve ser votado ainda em abril.
O objetivo principal, seria permitir que reservas de potássio sejam exploradas em territórios originários para garantir a produção de fertilizantes para o agronegócio. Segundo um estudo feito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mostram que apenas 11% dos 13,7 milhões de hectares que possuem os minerais para fertilizantes, são de territórios indígenas.
“Com essa crise internacional, dada a guerra, o Congresso sinalizou em votar esse projeto em regime de urgência. Eu espero que seja aprovado na Câmara agora em março para que, daqui a dois ou três anos, possamos dizer que não somos mais dependentes de importação de potássio para o nosso agronegócio”, justificou Bolsonaro.
Oposição AM ao Projeto
Após a votação, o deputado federal Zé Ricardo, o único da bancada amazonense a se posicionar contra o projeto, utilizou suas redes sociais para justificar sua votação.
“Votei contra a urgência do projeto de mineração em terras indígenas. Fui o único deputado do AM a votar contra essa proposta que atinge em cheio os povos indígenas. Para garantir potássio para fertilizantes tem reservas suficientes fora de terras indígenas”, escreveu.
A votação do requerimento foi aprovada com 279 votos a favor e foram contabilizados 180 contra e 3 abstenções. No Amazonas, os deputados federais Bosco Saraiva, Capitão Alberto Neto, Delegado Pablo, Sidney Leite e Silas Câmara foram a favor da decisão.
Impactos no Amazonas
O estado do Amazonas que possui em seu território cerca de 45.232.159 terras indígenas registradas, seria uma das regiões mais afetadas pela viabilização da exploração dos recursos, como explica o ambientalista Carlos Durigan.
“Basicamente afeta a vida de todos os povos indígenas que vivem no estado, levando insegurança e impactos ambientais às terras em que habitam. Não estamos falando somente de território e patrimônio natural, mas também da vida de diversos povos indígenas que sempre têm ficado à margem das decisões quando o assunto é a implementação de atividades que afetam seus modos de vida” disse.
Segundo ele, não existe a necessidade exploratória de recursos naturais nas áreas protegidas, além disso as ações podem acarretar inúmeras consequências para a organização social de povos originários.
“A liberação deste tipo de atividade de forma indiscriminada e com baixo poder de controle de um estado que carece de estrutura para tal e ainda sem o devido consentimento dos diferentes povos indígenas que habitam esses territórios, pode levar a um aumento expressivo na degradação de nosso patrimônio natural e ainda acirrar os conflitos que já existem em alguns dos territórios já invadidos por garimpos ilegais”, disse.
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