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Juíza encoraja criança de 11 anos a desistir de aborto após estupro

"Em vez de a gente tirar da tua barriga e ver ele morrendo e agonizando", disse a juíza para a criança, que é mantida sob custódia

Florianópolis (SC) – Uma juíza de Santa Catarina negou o direito ao aborto a uma criança de 11 anos vítima de estupro. O caso foi apurado pelo portal Catarinasem parceria com o Intercept Brasil. 

Segundo o processo, a mãe da menina descobriu a gravidez dias antes do aniversário da criança após enjoos e crescimento anormal na região do abdômen. 

Após procurar o Conselho Tutelar da cidade de Tijucas, a 50 quilômetros da capital Florianópolis, mãe e filha foram encaminhadas ao hospital de referência no serviço de aborto legal, o HU da Universidade Federal de Santa Catarina.

A equipe médica responsável, contudo, se recusou a realizar a interrupção da gravidez, sob a alegação de que normas internas do hospital apenas autorizavam o procedimento até a 20ª semana. À época, a menina encontrava-se na 22ª semana de gestação. 

Devido à recusa médica, a família da menor buscou a Justiça para a realização do aborto. 

Dois dias após a mãe e a menina informarem ao hospital que não queriam manter a gravidez, o Ministério Público catarinense pediu o acolhimento institucional da menina, sob pretexto de protegê-la do agressor.

A medida foi autorizada pela juíza Joana Ribeiro Zimmer, que ao apreciar o pedido, comparou a proteção da saúde da menor com à proteção do feto. 

Agora, o acolhimento da menor tinha outro motivo: “O risco é que a mãe efetue algum procedimento para operar a morte do bebê”, anotou a magistrada.

A criança tem sido mantida em um abrigo há mais de um mês para evitar que faça um aborto legal. 

Durante uma audiência judicial relacionada ao caso, realizada em 9 de maio, a juíza Zimmer defendeu a manutenção da gravidez e a possibilidade de um parto antecipado. 

Na gravação da audiência foi obtida pela reportagem, a juíza propõe à criança que mantenha a gravidez por mais “uma ou duas semanas, para aumentar a chance de sobrevida do feto. 

“Você suportaria ficar mais um pouquinho?”, questiona a juíza para a criança.  

A promotora do caso, Mirela Dutra Alberton, também tentou convencer a menina a manter a gravidez. 

“A gente mantinha mais uma ou duas semanas apenas a tua barriga, porque, para ele ter a chance de sobreviver mais, ele precisa tomar os medicamentos para o pulmão se formar completamente”. 

Ela continua: “Em vez de deixar ele morrer – porque já é um bebê, já é uma criança –, em vez de a gente tirar da tua barriga e ver ele morrendo e agonizando, é isso que acontece, porque o Brasil não concorda com a eutanásia, o Brasil não tem, não vai dar medicamento para ele… Ele vai nascer chorando, não [inaudível] medicamento para ele morrer”.

A juíza ainda afirma que o aborto não poderia ser realizado, alegando que o Ministério da Saúde estipula um período máximo de gestação para a interrupção de 22 semanas. 

“A questão jurídica do que é aborto pelo Ministério da Saúde é até as 22 semanas. Passado esse prazo, não seria mais aborto, pois haveria viabilidade à vida”,

diz a juíza.

Para a juíza, o aborto após esse prazo “seria uma autorização para homicídio, como bem a dra. Mirela lembrou. Porque, no Código Penal, está tudo muito especificadamente o tipo penal”, disse durante a audiência. 

No entanto, a legislação brasileira autoriza o procedimento em casos de violência sexual, sem restrições quanto ao tempo de gestação ou necessidade de autorização judicial. 

A orientação a que se refere a magistrada é uma nota técnica do Ministério da Saúde sobre agravos resultantes de violência sexual, que tem apenas caracter de orientação, e não normativo. 

Além da não observância de legislação brasileira, o vídeo ainda mostra uma insistência para que o bebê seja entregue à adoção, sem que haja respeito pela manifestação de vontade da menor. 

Em outro momento, a juíza pergunta se o pai do bebê concordaria na entrega da criança pela adoção, ignorando o fato de que estava se referindo ao agressor sexual desta criança. 

A situação vivida pela menina configura estupro de vulnerável, crime previsto no artigo 217 do Código Penal, já que uma criança não pode consentir verdadeiramente com um ato sexual.

Procurada pelo Catarinas e pelo Intercept Brasil, a magistrada não quis comentar sobre o caso. 

Já a promotora, alegou que, no caso em questão, não havia “uma situação concreta de risco” para a menor e afirmou que, na época, não tinha conhecimento de como eram feitos os procedimento de aborto. 

Segundo laudos juntados pelo hospital que atendeu a menor, há a recomendação para a interrupção da gestação da menina alegando riscos como anemia grave, pré-eclâmpsia, maior chance de hemorragias e até histerectomia – a retirada do útero, consequência irreversível.

Uma decisão de segundo grau, concedida pela desembargadora Cláudia Lambert de Faria também negou a realização do procedimento, dado que a menina não se encontrava em “risco imediato”. 

A família inconformada buscou ao Tribunal de Justiça para pedir o retorno da criança para casa. 

O promotor Paulo Ricardo da Silva concordou com o pedido, “a fim de que, de forma imediata e urgente, seja revogada a medida de proteção de acolhimento”.

Na manifestação, o procurador afirma que a promotora Mirela Dutra Alberton e a juíza Joana Ribeiro teriam cometido uma série de irregularidades. 

“Não é demais afirmar que o desenvolver processual se torna um ‘show de horrores’, desvirtuando-se da sua finalidade e se tornando, explícita e sistematicamente, cenário de violação de direitos da infante interessada”, alegou. 

*Com informações do Carta Capital

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