“A relação começou com consentimento, mas, durante o ato, ele me virou de bruços, segurou meus braços por trás e, enquanto eu implorava para ele parar, me estuprou”. O relato é de Rute*, uma das 12 mulheres que, segundo apuração do site Metrópoles, registraram boletim de ocorrência indicando Gabriel Ferreira Mesquita, dono do bar Bambambã — localizado na 408 Norte, em Brasília — como suposto autor de abuso sexual.
De acordo com Rute, ela e Gabriel conheceram-se por meio de amigos em comum. Com o tempo, passaram a se ver com mais frequência até que o empresário a convidou para visitar a casa dele. “Ele era amigo dos meus amigos. Conhecia todo o meu ciclo. No momento em que tudo aconteceu, e me vi em uma situação que não conseguia sair, entrei em choque. Não sabia o que fazer. Quando ele terminou, levantou e foi ao banheiro como se nada tivesse acontecido”, declarou Rute. “Foi tudo tão violento, que até hoje sofro com as sequelas físicas e psicológicas do que ele fez comigo”, completou.
Assim como os de Rute, relatos de outras dezenas de mulheres vieram à tona após publicação feita por Laura*, em janeiro de 2020, repercutir nas redes sociais. No texto, a jovem narra que era frequentadora assídua do estabelecimento do homem, que também atua como bartender no local. Certo dia, porém, depois de conversar com o acusado e beber drinks dados por ele, a jovem adormeceu e acordou “sem memórias” e com a “horrível sensação de que violaram” o corpo dela.
“Desde esse dia meu corpo nunca mais foi o meu corpo. Precisei tomar mil remédios a fim de me prevenir doenças. Infelizmente, nenhum deles foi capaz de evitar o estrago psicológico”, declarou à época.
O relato foi compartilhado dezenas de vezes nas redes e recebeu centenas de interações. Devido à repercussão e ao alcance, mulheres que não se conheciam de diferentes partes do Brasil e até mesmo do exterior entraram em contato com Laura alegando terem enfrentado situações semelhantes à dela com o empresário. Nesse momento, a jovem resolveu marcar um encontro para que as vítimas pudessem contar suas histórias.
“Se procurarem a imprensa, arquivarei o inquérito”
Doze das dezenas de vítimas decidiram, então, procurar a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam) a fim de fazer uma denúncia coletiva contra o homem. Chegando lá, segundo elas, foram convencidas pela então delegada da Deam Sandra Gomes a não tornarem o assunto público sob pena de terem “o inquérito arquivado”.
Diante do medo, permaneceram caladas durante todo o período de instrução do processo, que, após ter sido apresentado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) à Justiça, aguarda, agora, sentença judicial.
Nesse meio tempo, as mulheres também passaram por dificuldades com as advogadas que contrataram inicialmente. De acordo com elas, as profissionais teriam dado informações desencontradas e perdido prazos, chegando até mesmo a afirmar que o processo havia sido arquivado.
Após o afastamento das especialistas, a advogada Manuela Paes Landim decidiu ajudá-las “pro bono” assumindo, dessa forma, como assistente de acusação.
Suspeita de dopagem
À reportagem Olívia* contou que conheceu o acusado há alguns anos por meio de um aplicativo de relacionamento. Após trocas de mensagens, interessou-se por Gabriel e, juntos, resolveram marcar um encontro em um famoso barzinho de Brasília. No local, conversaram, beberam e, de repente, Olívia começou a sentir-se tonta. Segundo a vítima, o homem teria dito que morava próximo ao estabelecimento e que poderiam ir até a casa dele para a mulher se recuperar.
“Lembro que tinha um colchonete no chão, onde eu sentei enquanto ele me servia água. Depois disso, apaguei. Quando acordei estava deitada na barriga dele, com ele forçando minha cabeça para sexo oral. Eu despertei na hora, e o vômito veio em seguida. Naquele momento, fiquei muito envergonhada e cheguei a pedir desculpas por ter vomitado”, disse Olívia, que também alega ter tido a meia calça rasgada enquanto estava com o homem.
“Tempos depois, contei a história para os meus amigos, que, em silêncio, me mostraram o post de outra vítima dele. Eu chorava tanto que fui orientada a ir para casa, mas só conseguia pensar em como eu não consegui me defender dele e por qual motivo fui confiar em um cara daquele. Precisei de acompanhamento médico e psicológico para aprender a lidar com tanta angústia, medo, raiva e vergonha”, completou.
Assim como Olívia, Alice* também conheceu o empresário pela internet há alguns anos. Entretanto, de acordo com ela, a primeira vez em que se viram foi durante um encontro com amigos em comum. Na ocasião, a mulher disse que o réu fez um drink que ela não gostou; por isso, o entregou a uma amiga, que, em seguida, adormeceu. “Na época, não nos ligamos, mas hoje entendemos que ele quis me dopar”, alegou a moça.
Tempos depois, Alice relatou que eles tornaram a se encontrar em um evento pré-carnaval, em 2015. Alcoolizada, segundo ela, aceitou manter relações sexuais com o bartender. Contudo, durante o ato, ele teria ignorado o pedido de interrupção.
“Ele me virou de bruços e forçou sexo anal, sem camisinha. Gritei tão alto que ele se assustou e olhou pela janela para ver se o grito teria chamado a atenção de alguém. Eu fiquei lá [na cama] de bruços, inerte. Em choque. Ele desceu, acho que para ver se alguém tinha escutado”, detalhou a brasiliense. “[…] Me levantei a fim de ir embora, mas, quando cheguei à porta, ele estava voltando e não me deixou ir. Falou que eu iria ficar”, completou.
Suposto perfil do réu
Ao site Metrópoles Ana* contou que conheceu Gabriel por meio de um aplicativo de relacionamento, em 2018. De acordo com a mulher, depois de muita conversa, o homem a convidou para conhecer o bar dele, na Asa Norte. Após visitar o estabelecimento, os dois encaminharam-se à casa do empresário, onde teriam iniciado uma conversa e ingerido drinks preparados por ele.
Segundo Ana, após as bebidas, começou a se sentir “entorpecida” e percebeu o “corpo pesar a ponto de a visão ficar turva”. Nesse momento, as carícias entre os dois começaram, e ele a levou ao quarto.
A mulher conta que, a princípio, consentiu a relação. No entanto, durante o sexo e, assim como em relatos anteriores, o acusado teria ignorado os pedidos para parar, iniciado uma relação anal sem permissão e, ainda, teria retirado a camisinha.
“Por diversas vezes, pedi para ele parar. Gritei que estava doendo, que estava me machucando, mas ele continuou. Meu corpo estava pesado, e eu não conseguia me defender. Quando ele terminou, eu estava sangrando. Olhei para o chão, e vi que ele tinha retirado a camisinha e ejaculado dentro de mim”, disse Ana, que afirma ter precisado de terapia e de remédios para depressão após a agressão.
“Quando denunciei, queria que outras mulheres fossem avisadas sobre o tipo de pessoa predadora que ele é. Você olha para ele, e não acredita que esteja de frente para um abusador, por ser bem articulado e charmoso. Eu sempre tive a ideia de que um estuprador é um cara bruto, que puxa as vítimas para o escuro, e não alguém com quem eu saí e confiei de beber drinks. Hoje, eu penso que, se tivesse denunciado antes, ele não teria feito outras vítimas. Responsabilizo-me muito por isso”, completou a jovem.
Os supostos crimes, segundo as mulheres, ocorreram entre 2014 e 2018, mas os relatos só foram encaminhados às autoridades após a história de Laura* ser publicada nas redes sociais, momento em que, segundo elas, “muitas compreenderam que foram vítimas de estupro”.
Defesa
Ao Metrópoles a defesa de Gabriel informou que, das “12 ocorrências registradas, sete foram imediatamente arquivadas judicialmente”.
“Sobre os demais casos que estão em andamento, reitero que considero a inocência de meu cliente. Todavia, por respeito ao Poder Judiciário, sendo o caso sigiloso, nossas manifestações serão técnicas e ocorrerão nos autos do processo”, disse Bernardo Fenelon, advogado do empresário.
* Nomes fictícios para resguardar a identidade e garantir a segurança das vítimas
*Com informações do ‘Metrópoles’
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