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Dia do Professor

“Minha missão é educar”: professores da zona rural do Amazonas relatam os desafios para ensinar

Data é celebrada para valorizar o trabalho e dedicação dos professores, que enfrentam desafios, diariamente, para formar alunos nas mais variadas esferas sociais

Foto: Arquivo pessoal

Manaus (AM) – Dia 15 de outubro, neste sábado, é comemorado o Dia do Professor. A data que foi referência a Dom Pedro I por decretar, em 1827, a instalação de escolas em todas as cidades do Brasil, hoje é celebrada para valorizar o trabalho e dedicação dos professores, que enfrentam desafios, diariamente, para formar alunos nas mais variadas esferas sociais. Em alusão à data reservada para a classe, o EM TEMPO foi conhecer a história de dois professores que, em comunidades ribeirinhas, buscam melhorias para a educação e inspiram novas gerações.

Jomhara Rodrigues é professora na zona rural de Manaus e conta que leciona, em 5 escolas, para alunos do ensino fundamental (3° ao 5° ano). Cada turma é preenchida por cerca de 15 alunos. A professora relata que o horário de ensino para os alunos da zona rural é diferente da zona urbana, pois devido à cheia dos rios, o ano letivo para eles começa e termina mais cedo. As aulas iniciam em janeiro e terminam no mês de outubro, especificamente por causa da seca, onde o acesso por embarcações fica difícil.

“Nós trabalhamos em um programa de correção de fluxo e reforço escolar para alunos do 3° ao 5° ano. Em todas as escolas onde eu leciono, proporcionam o acolhimento de uma sala para reforço. A grande maioria das salas de aula são equipadas com ar-condicionado e os alunos chegam até a escola por ônibus e lancha escolar, juntamente com as monitoras”,

afirma a professora.

A escola da zona rural onde Jomhara lecionona, já conta com tecnologias para fornecer um ambiente confortável oara os discentes como, ar-condicionado e internet. Foto: Arquivo pessoal

Rodrigues menciona que na zona ribeirinha e na zona rodoviária existem duas escolas que funcionam em tempo integral. Além das unidades, as escolas desenvolvem projetos de incentivo à leitura com recursos didáticos que variam de professor para professor.

“O método de ensino não tem um padrão. Nós percebemos os perfis dos professores e ele têm a sua própria técnica, dinamismo, favorecendo a educação, que é o conjunto de práticas para o sucesso dos alunos, o aprendizado”,

afirma.

Jomhara enfatiza que a realidade nas escolas das zonas rural e ribeirinha já foram bem diferentes do que são agora. Hoje, de acordo com a professora, as escolas oferecem uma melhor infraestrutura. Atualmente, o Governo do Estado tem priorizado a educação desde o transporte até o conforto das salas de aula para os alunos, diz a professora.

“Eu sou uma prova viva da questão desse progresso. Eu estou na secretaria estadual de educação há 17 anos e em algumas comunidades rurais a gente não tinha como voltar. Precisávamos dormir próximo à escola, em casa de comunitários. Tem os ônibus escolares que levam os alunos e professores até os ramais, tanto da AM-010 quanto da BR-174, assim como as lanchas fornecidas para todas as escolas [da zona rural], que pegam os professores da cidade até à escola”,

detalha Jomhara Rodrigues.

Na Terra do Guaraná

Maués é a terra do guaraná e o fruto tem sido usado como didática para preservação e conservação ensinando as crianças a protegerem a natureza. Foto: Arquivo pessoal

Essa realidade também é parecida com a que o professor Cleuto Cardoso vive na zona rural de Maués, no polo I (com mais de 100 professores). Cleuto leciona na Escola Municipal Manuel de Matos para o ensino fundamental (6° ao 9° ano) e na Escola Estadual Francisco das Chagas para jovens e adultos voltados ao ensino médio.

Cleuto relata que um dos maiores desafios dos alunos é chegar até à escola em tempos de vazante, pois na comunidade Monte Gerezim Rio Camarão Grande, zona rural de Maués, a estrada fica alagada e parte do percurso até à escola se enche de lama.

“Os alunos que usam o transporte escolar vem andando até onde o transporte deixa. Quando eles descem, já vêm com a sandalinha na mão e fica o “atoleiro”. Inclusive, hoje eu peguei uma queda no atoleiro porque desliza e é difícil. Depois, com o verão, vai secando e fica mais fácil caminhar”

relata o professor.

De acordo com Cardoso, uma dessas escolas foi iniciativa de uma comunidade evangélica, devido à falta de uma instituição de ensino na localidade. O prédio do colégio é metade alvenaria e metade madeira, por enquanto. Nas duas escolas, o professor leciona para cerca de 10 alunos em cada uma, uma vez que o número de alunos da zona rural é de, no máximo, 20 por turma. O colégio estadual também já usa internet disponibilizada pelo poder público e o ambiente oferece ar-condicionado.

Mérito pelo salário

Quanto ao salário de professor, Cleuto defende que, na profissão, o professor tem que “fazer por merecer”. Segundo o pedagogo, o profissional deve cursar uma graduação e não ficar parado no tempo. De acordo com Cleuto, o profissional deve buscar melhorias fazendo pós-graduação, se especializando e assim receber o justo pela profissão.

“Às vezes tem colega que não busca uma faculdade, uma especialização e quer ganhar mais. Pelo que eu ganho hoje, vejo que devo procurar me especializar. Estava conversando com um colega do Pará, que me contou que ele passa de três a quatro meses sem receber e, até aqui, graças a Deus, eu recebo em dia. [O governo] tem esse compromisso com o nosso salário. Eu queria que fosse mais, mas eu tenho essa questão da meritocracia e eu estou na zona rural porque eu gosto”,

conta Cleuto Cardoso.

“É isso que a gente tem que olhar primeiro. O que a gente deve fazer primeiro e depois observar o salário que a gente recebe. Se o indivíduo for pensar no quanto ele quer ganhar, ele deixa de ser professor e vai buscar outra profissão”,

completa o professor.

Incentivo com projetos

Cleuton relata que desenvolve projetos de incentivo à leitura, à cultura, ao reaproveitamento para reutilização de objetos. Um desses projetos e didáticas de ensino é o projeto “Folclore”, que tem como objetivo, mostrar aos discente a realidade e cultura de outras comunidades.

Foto: Arquivo pessoal

Outro ponto importante e, às vezes, até preconceituoso, é o fato de que alunos ribeirinhos deixam a escola mais cedo e não buscam melhorias por se considerarem incapazes de estudar. De acordo com Cardoso, muitas vezes esse pensamento vem da própria família, o que torna um obstáculo para o aluno que almeja melhoria de vida por meio dos estudos.

“Se eu chego em uma comunidade e vejo essa situação do aluno, eu, como professor, tenho que buscar formas, meios, didática, de adequar o aluno ao objetivo que deve conter no histórico escolar dele. Então, isso é uma responsabilidade do professor. Não é porque nós estamos no fim da cabeceira que vamos deixar de lado os nossos alunos. Graças a Deus que, em nossa comunidade, temos professores que tem, no mínimo, uma graduação e buscam se especializar de alguma forma e priorizando sempre o aluno”,

afirma.

Recompensa

Cleuto diz que sua principal missão é educar, ensinar e levar os discentes a níveis altos na educação. O professor garante que sem o conhecimento é impossível chegar tão longe. Ele afirma ainda que ter o retorno de seus alunos ao receber mensagens de agradecimento pelo que lhes foi ensinado é gratificante.

Eu fico muito feliz quando recebo mensagens de alunos dizendo que hoje estão trabalhando como professores, que foram inspirados pela gente. Isso é muito bacana, é gratificante demais saber que você lutou para mudar aquele pensamento de que o aluno não era capaz de estudar e hoje ele se tornar um colega de profissão”,

conta.

Segundo o professor, alguns alunos adolescentes almejam sair da realidade em que vivem e migrar para a capital em busca de emprego e melhores condições de vida. É neste momento em que ele os incentiva a estudar.

“Tem meninos que querem mudar de vida e eu já explico que não é fácil, pois só com o ensino médio você não vive bem. É preciso estudar além disso para poder sobreviver. Assim como tem pai que incentiva a estudar, tem aquele que incentiva a desistir e não é isso que queremos. Queremos que eles vençam”,

afirma.

O educador compartilha casos de que já viu acontecer na comunidade, onde o aluno saiu da zona rural para estudar, fazer graduação e voltar para a comunidade para incentivar os pais a estudarem também.

Uma das alegrias de Cleuto foi ver que o filho seguiu o mesmo caminho e quer ser professor, assim como o pai. O homem conta que essa é uma das melhores formas de ver que o seu trabalho está sendo recompensado.

“Eu agradeço à minha mãe por me incentivar a ser professor, coisa que eu não queria. Mas hoje, eu não me enxergo sem ser professor. E meu filho, que tem 14 anos, já me falou quer ser professor. Eu disse a ele que, para isso, é necessário estudar bastante e não desistir, não parar nunca. Porque professor não para de estudar. Essa é a nossa missão”,

conclui.

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